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Gersem dos Santos Luciano Baniwa (UnB/Ex-PDPI) e Sondra Wentzel (PDPI-GTZ)

O Desafio da Auto-Gestão das Terras Indígenas como Recursos de Propriedade Comum na Amazônia Brasileira. Gersem dos Santos Luciano Baniwa (UnB/Ex-PDPI) e Sondra Wentzel (PDPI-GTZ). Estrutura da apresentação. Contexto histórico Contexto político, jurídico e administrativo atual

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Gersem dos Santos Luciano Baniwa (UnB/Ex-PDPI) e Sondra Wentzel (PDPI-GTZ)

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Presentation Transcript


  1. O Desafio da Auto-Gestão das Terras Indígenas como Recursos de Propriedade Comum na Amazônia Brasileira Gersem dos Santos Luciano Baniwa (UnB/Ex-PDPI) e Sondra Wentzel (PDPI-GTZ)

  2. Estrutura da apresentação • Contexto histórico • Contexto político, jurídico e administrativo atual • O potencial de auto-gestão das terras indígenas da amazônia brasileira - Tipologia de situações - Três situações típicas e experiências iniciais de auto-gestão • Algumas conclusões preliminares

  3. 1. Contexto histórico Os processos: • As políticas coloniais de extermínio e desrespeito aos direitos indígenas e a política governamental assimilacionista foram fatores de redução drástica da população indígena. • Além disso, os povos indígenas foram sempre vistos de forma preconceituosa. Suas formas de apropriação dos seus espaços vitais e de uso dos diferentes recursos naturais nunca foram entendidas, apreciadas e apoiadas pela sociedade nacional. • A instituição da tutela, baseada na relativa incapacidade civil dos índios, foi o fundamento jurídico para legalizar e implementar uma política integracionista. • Depois do golpe militar de 1964, o Estado, baseado numa mentalidade desenvolvimentista, priorizou a “expansão de fronteiras” na Amazônia com impactos sérios para o meio ambiente e os povos indígenas.

  4. 1. Contexto histórico (cont.) Os impactos: • O principal impacto para os dias atuais é no campo político: Os povos indígenas representam apenas 0,2% da população brasileira, e há poucas regiões com uma maioria ou pelo menos população substancial indígena. • A atuação dos órgãos indigenistas (SPI, FUNAI) era e é ambivalente: - Por um lado, o Brasil deve ter a maior extensão de Terras Indígenas oficialmente reconhecidas no mundo inteiro. - Por outro lado, durante séculos, muitos povos indígenas vem perdendo seus territórios, muitas culturas indígenas foram sistematicamente negadas, e criou-se uma forte dependência do assistencialismo governamental.

  5. 2. Contexto político, jurídico e administrativo atual Os avanços: • A partir da década de 1970, os povos indígenas da Amazônia, apoiados por parceiros, iniciam uma nova trajetória de luta através de mobilização, articulação e organização. • Em 1988 foi promulgada a atual constituição brasileira, contendo significativos avanços: - a superação da tutela (reconhecimento da capacidade civil dos índios); - o reconhecimento dos direitos originários dos índios “sobre as terras que tradicionalmente ocupam” e das formas tradicionais de organização social, política, econômica e cultural dos povos indígenas. • A partir de 1990, as demarcações de terras avançaram com a decisiva atuação do PPTAL (projeto de cooperação internacional na FUNAI), chegando a cerca de 1 milhão de km2 na Amazônia Legal (20% desta macro-região).

  6. 2. Contexto político, jurídico e administrativo atual (cont.) Os desafios gerais da política indigenista: • Falta a ratificação do Estatuto dos Povos Indígenas, que tramita no Congresso desde 1991, para substituir o defasado Estatuto do Índio de 1973 e regulamentar a atual Constituição Federal. • Falta a definição de uma nova política indigenista com estabelecimento de instituições e mecanismos adequados para superar o modelo caduco da tutela, que ainda hoje orienta a prática indigenista. • Falta a garantia de participação indígena na tomada de decisões relevantes que afetem suas vidas. Não existe um fórum ou mecanismo de abrangência em nível nacional para assegurar essa participação. • Tanto na política ambiental quanto na indigenista, a descentralização da administração pública brasileira é ainda bastante tímida, confusa e fragmentária.

  7. Os desafios da auto-gestão das Terras Indígenas (TI): Condições estruturais: • As terras indígenas (TI) permanecem “bens da União”, ou seja, não são de fato propriedade dos povos indígenas. Porém, o reconhecimento pelo Estado da posse permanente das terras indígenas, de seu usufruto exclusivo, e das normas e regras dos povos indígenas a situação das TI no Brasil é equivalente à vigência de um “regime de recursos de propriedade comum”. • A atual política ambiental do país criou consideráveis limitações às atividades tradicionais de caça, pesca e coleta de produtos silvestres nas TI. • Os direitos indígenas sobre o aproveitamento “não tradicional” (comercial) dos recursos naturais ainda não estão regulamentados (caso dos recursos minerais) ou regulamentados de uma forma que quase inviabiliza a extração dos recursos (caso madeira). • Na administração pública, as TI não são consideradas como unidades de planejamento e gestão. A menor unidade da administração pública continua sendo o município.

  8. Os desafios da auto-gestão das Terras Indígenas (cont.) Perguntas chaves para o movimento indígena nesta fase “pós-demarcatória”: • Como defender estes vastos territórios contra invasões? • Como aproveitar a diversidade de recursos naturais em benefício dos povos indígenas, segundo suas necessidades e seus padrões culturais, e de forma ecologica, social e institucionalmente sustentável? • Como coordenar as ações de instituições governamentais dos três níveis (federal, estadual e municipal) e não-governamentais que atuam nas terras indígenas? • Como incorporar o conceito de propriedade comum e seus potenciais benefícios ao arcabouço jurídico e administrativo do Estado Brasileiro e aproveitá-lo como instrumento analítico e político no movimento indígena?

  9. 3. O potencial de auto-gestão das TI da amazônia brasileira O status jurídico das atuais mais de 600 TI do Brasil e os direitos dos seus habitantes são iguais para todas. Porém, para analisar o potencial de auto-gestão de uma TI, as características mais relevantes nos parecem as seguintes: • O tamanho da TI: na Amazônia Brasileira, existem TI de até 9,7 milhões de hectares, mas também TI pequenas com menos de mil hectares. • O número e a composição dos seus habitantes: existem TI habitadas por parte de um povo indígena, por um povo inteiro ou por – partes de - vários povos indígenas. Nestes últimos casos, as relações históricas e atuais entre eles são um fator importante para a gestão da TI. • A “história de contato” do(s) povo(s) indígena(s) da TI, o grau de sua integração atual na economia regional e sobretudo o grau de consolidação das organizações indígenas. • A localização da TI em um o mais estados federais e em um ou mais municípios. • Sua sobreposição ou não com unidades de conservação de diferentes tipos. • Sua localização com respeito às fronteiras nacionais, e a existência ou não de membros do mesmo povo indígena no pais vizinho. • Invasões e outras ameaças à integridade da TI. • Formas próprias de organização dos povos indígenas, sobretudo com vista à proteção e vigilância e à auto-gestão do território.

  10. Classificação de algumas terras indígenas (TI)

  11. Caso 1: TI Raposa/Serra do Sol Povos Macuxi, Wapichana e outrosEstado de Roraima A Situação: • Território: mais de1,7 milhão de hectares • População: 15.700 índios em 152 aldeias • Há mais de 30 anos, as comunidades indígenas da região lutam pela regularização fundiária da TI Raposa/Serra do Sol. • Para isso, criaram o Conselho Indígena de Roraima (CIR). • A TI foi identificada em 1992 e demarcada em 1999, mas ainda falta sua homologação pelo Presidente da República. • O impasse é resultante dos interesses e da pressão da bancada parlamentar e do Governo do Estado de Roraima. • Foram criados na TI dois municípios, o Parque Nacional Monte Roraima e o 6º Pelotão Especial de Fronteiras do Exército Brasileiro. • Arrozeiros comerciais, cujas atividades na TI causam impactos sociais e ambientais, são apoiados pela política regional. • Lideranças indígenas estão sendo cooptados, intimidados e vários deles mortos e várias organizações indígenas foram criadas para provocar um clima de insegurança, conflitos e divisão entre as comunidades indígenas.

  12. Caso 1: TI Raposa/Serra do Sol Povos Macuxi, Wapichana e outrosEstado de Roraima (cont.) Conclusões: • O exemplo mostra claramente a luta entre modelos de desenvolvimento coexistentes no cenário sócio-político brasileiro: - A TI como propriedade comum é considerada um empecilho pelo Governo do Estado e pelos arrozeiros e pecuaristas, que baseam suas visões e práticas na noção de propriedade privada, produção capitalista e economia predatória. - A TI Raposa/Serra do Sol virou o símbolo da luta política e jurídica dos povos indígenas e aliados, demonstrando a necessidade da regularização fundiária. • Depois da regularização fundiária desta TI, o potencial de recursos naturais e humanos (pessoas qualificadas, capacidade de organização), indicam a possibilidade de estabelecimento de um modelo de gestão e desenvolvimento econômico sustentável, baseado principalmente na exploração racional e sustentável dos recursos naturais comuns (pastos naturais, recursos minerais, entre outros).

  13. Caso 2: TI SororóPovo Suruí (Aikewara)Estado do Pará A Situação: • Território: 26.000 hectares • População: pequeno povo indígena de menos de 250 pessoas, numa só terra indígena • Situado num só município => potencialmente relações interétnicas e interinstitucionais mais simples. • Porém: os Suruí tem apenas 60 anos de “contato” com a sociedade regional e ainda poucas experiências de organização própria, independente da FUNAI. • Vantagem: pressão externa relativamente baixa depois da demarcação e homologação da TI. • No contexto do Estado do Pará com suas altas taxas de desmatamento, esta TI virou uma “ilha de floresta” num “mar de pasto”.

  14. Caso 2: TI SororóPovo Suruí (Aikewara)Estado do Pará (cont.) Conclusões: • Representa um outro extremo dos desafios dos povos indígenas da Amazônia brasileira:- Pequenos povos sobreviventes de processos violentos de “contato”, com pouca experiência com a sociedade nacional e falta de massa crítica.- Forte dependência da FUNAI.- Processos de organização indígena ainda frágeis e incipientes. • Desafio: a necessidade de fortalecimento institucional e de capacitação em gestão territorial e de articulação política maior (processos de longo prazo). • Potencial: o tamanho do território e da população poderia facilitar uma auto-gestão da TI, facilitada por diagnósticos e processos de planejamento e implementação participativos.

  15. Caso 3: TI Alto e Médio Rio Negro etc.22 povos indígenasEstado do Amazonas A Situação: • Territorio: cinco terras indígenas contíguas (TI Alto Rio Negro, TI Médio Rio Negro I, TI Médio Rio Negro II, TI Apapóris, TI Tea) - 11 milhões de hectares. • População: 22 povos, 3 famílias linguísticas: Tucano Oriental, Arawak e Maku; 750 povoados, somando mais de 30 mil pessoas (90% indígenas). • A área envolve três municípios, com destacada presença de militares (área de fronteiras internacionais). • Área territorial regularizada esem muitas ameaças no curto prazo: a ausência de estradas e de potencial econômico limitado evita extração madeireira e expansão da fronteira agropecuária. • A população indígena é majoritária mesmo nos centros urbanos mais próximos e influentes. Porém: ainda não se deu a presença de um indígena nos cargos políticos relevantes (prefeito, deputado). • Forte articulação indígena através da Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro (FOIRN), que hoje congrega 40 organizações indígenas. • Desde muito tempo, apoio de ONGs.

  16. Caso 3: TI Alto e Médio Rio Negro etc. 22 povos indígenas Estado do Amazonas (cont.) Conclusões: • Parcerias com diferentes instituições públicas e privadas, possibilitaram a implantação de projetos-piloto voltados à proteção e sustentabilidade das terras, segurança alimentar, geração de renda, educação, saúde, fortalecimento organizacional e expressão e afirmação cultural. • Construção de um novo processo de planejamento territorial e desenvolvimento sustentável a partir de um “Programa regional de desenvolvimento indígena sustentável do Rio Negro”. • A noção de recursos comuns (propriedade coletiva) está guiando toda a reorganização social, política e econômica da região, com todas as contradições e limitações. • Situação que permite pensar numa auto-gestão territorial em base a programas regionais na perspectiva de uma unidade administrativa própria nos marcos do Estado Nacional.

  17. 4. Algumas Conclusões Preliminares No Brasil, chegou o momento para estimular uma discussão sistemática no movimento indígena sobre os “desafios pós-demarcatórios”, trazendo exemplos interessantes de outros paises. Alguns insumos para esta discussão: • A diversidade grande de situações relevantes e dos modelos próprios de organização dos povos indígenas. • A proposta de “programas regionais” nas grandes TI no curto prazo parece bastante realista, considerando as experiências que já existem. • A criação de “municípios indígenas” em casos com condições territoriais, demográficas e organizativas favoráveis no médio ou longo prazo parece ao mesmo tempo interessante e ambiciosa. • O conceito de “regime de recursos de propriedade comum” pode servir como um argumento adicional para insistir na necessidade e na possibilidade de uma auto-gestão de terras indígenas no Brasil.

  18. 4. Algumas Conclusões Preliminares (cont.) Alguns fatores favoráveis para a discussão e possíveis esforços de planejamento de auto-gestão de terras indígenas no Brasil: • Novos instrumentos jurídicos internacionais como a Convenção 169 da OIT, que reforçam o direito dos povos indígenas sobre seus territórios tradicionais e reconhecem as suas formas próprias de organização social, política e econômica. • A emergência e consolidação do movimento indígena organizado iniciado no final da década de 1980, e de uma nova geração de lideranças indígenas mais consciente e preparada politica e tecnicamente para os grandes desafios que ainda existem.

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