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- Feridas Abertas -. Josué de Castro nasceu no Recife, no ano de 1908. Formado em Medicina, dedicou todas as suas energias em prol da construção de um mundo livre da mais cruel e aviltante calamidade social:. a Fome. Condenou com veemência
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Josué de Castro nasceu no Recife, no ano de 1908.
Formado em Medicina, dedicou todas as suas energias em prol da construção de um mundo livre da mais cruel e aviltante calamidade social: a Fome.
Condenou com veemência a conspiração de silêncio que, na mídia, nas academias, e nos parlamentos, teimava em não abordar a questão da fome no país.
A inserção da temática da fome no panorama político, científico e moral no Brasil deve-se aos seus incansáveis esforços.
A seu respeito, afirmou Darcy Ribeiro: “Josué é uma das pessoas que eu mais admiro. Eu digo mesmo que Josué é o homem mais inteligente e mais brilhante que eu conheci..."
Travou a sua batalha pela erradicação da fome desde o começo dos anos 30 até a década de 70, vindo a falecer em 1973.
Entregou sua existência efêmera de sessenta e cinco anos de vida a uma das causas mais nobres, - a promoção da dignidade humana.
Pela enorme consideração e cuidado que sempre manifestou pelos pobres, o médico pernambucano é lembrado hoje como o profeta dos excluídos.
Em setembro de 2008 comemorou-se o centenário de nascimento de Josué de Castro.
Josué Apolônio de Castro 05.09.1908 – 24.09.1973 Influente médico, professor, sociólogo, escritor, intelectual, humanista, ativista brasileiro, nordestino, humano.
Para marcar o centenário de seu nascimento, o “Jornal do Commercio”, do Recife, veiculou um caderno especial chamado “Feridas Abertas da Fome.”
A reportagem seguiu os caminhos da fome baseando-se em estudos e mapas elaborados, há cinqüenta anos, pelo médico e geógrafo Josué de Castro.
Uma equipe formada pelo fotógrafo Arnaldo Carvalho, pela repórter Ciara Carvalho, e pelo motorista Reginaldo Araújo rodou quase dez mil quilômetros, em 15 dias, pelos nove estados do Nordeste do Brasil.
Uma equipe formada pelo fotógrafo Arnaldo Carvalho, pela repórter Ciara Carvalho, e pelo motorista Reginaldo Araújo rodou quase dez mil quilômetros, em 15 dias, pelos nove estados do Nordeste do Brasil.
O que eles testemunharam, - o seu contato com as pessoas “invisíveis” aos olhos da nossa sociedade -, demonstra que ainda temos um longo caminho a percorrer até a realização dos ideais de Josué de Castro.
O fotógrafo Arnaldo Carvalho relata: “Não foi fácil fazer esse material. Foi muito cansativo tanto psicologicamente quanto fisicamente...” “Cada localidade visitada era um soco no estômago, atrás do outro...”
Veja a seguir um resumo da reportagem que a equipe realizou. Sertão nordestino Setembro de 2008
Marta, jovem mãe, moradora da Vila dos Costas, distrito de Natura, Paraíba, recebe a equipe do jornal na desolação de seu lar.
A fome de seus filhos, somada à sua própria fome. Fome de comida, de esperança, de dignidade...
No seu povoado, Vila dos Costas, as famílias vivem como refugiados. As terras onde moravam foram inundadas pela barragem de Acauã.
O governo levantou as casas no endereço novo, mas se esqueceu de levar dignidade para a nova morada.
Quando a reportagem pede para conhecer a cozinha de sua humilde casa, descobre que no armário de duas portas tudo o que tem é resto.
Restos de fuba, de sal e um pacote aberto de açúcar. O arroz e o feijão acabaram há uma semana.
A mulher forte, com um jeito discreto, quase cabreiro, que cria sozinha os filhos e ainda cuida de dois sobrinhos, já ao final da visita da equipe de reportagem, desaba num choro incontido que a todos impressiona.
O choro de Marta, nos relata o fotógrafo, não é um choro de humilhação, de resignação, de tristeza por não ter o que comer. De quem aceita o destino porque assim Deus quis.
O seu choro não é senão um choro-explosão, um choro-revolta, um choro de indignação e de vergonha porque assim o homem quis.
Marta Maria da Silva, 28 anos, é analfabeta e parece ter a exata consciência de que o flagelo da fome, imposto a ela e aos seus três filhos, não é obra divina. E sim humana.
Coisa do homem contra o homem. E isso ela se recusa a aceitar; daí o seu choro incontido.
Não há maneira de enxugar lágrimas como estas. Lágrimas que brotam de um coração vitimado pela injustiça.
Marta abraça o filho de dois anos. Pequeninas mãos enxugam as suas lágrimas.
Quem consola, e quem é consolado?
Qual o limite de dor e desalento que um coração humano consegue suportar?...
“Ninguém merece passar por isso. Ninguém”, repete Marta...
...antes de esconder-se no quarto, para chorar mais alto e sozinha.
A equipe de reportagem precisa partir. Deixa para trás Marta, seus três filhos, e o mar de lágrimas provocadas pela insensatez humana.
Rafael, 2 anos, morador de Ipubi, PE, perdeu a visão do olho direito devido a forte desnutrição.
Quando chegou ao hospital, Rafael era só pele, osso e feridas. E a nata que lhe cobria os olhos, - a remela da fome.
Os cuidados médicos infelizmente puderam salvar o olhar de um dos olhos apenas.
Ana Vitória, 1 ano e 2 meses, que mora num município vizinho, teve menos sorte ainda, perdendo a visão dos dois olhos devido a forte desnutrição.
Existe uma cegueira moral e social, anterior à cegueira que se apodera dos pequeninos olhos de Rafael, de Ana Vitória, e de outras tantas crianças.
Algumas crianças, na loteria biológica, não são contempladas com uma família abastada materialmente. Ninguém escolhe a família em que nasce.
É por isso que o exercício da caridade se faz tão importante.