190 likes | 674 Views
A CRÍTICA COMUNITARISTA DE CHARLES TAYLOR. Professor: Roberto José Lube Teles (PUCPR). O propósito deste trabalho está em enunciar a crítica comunitarista de Taylor ao liberalismo dito “procedimental”.
E N D
A CRÍTICA COMUNITARISTA DE CHARLES TAYLOR Professor: Roberto José Lube Teles (PUCPR)
O propósito deste trabalho está em enunciar a crítica comunitarista de Taylor ao liberalismo dito “procedimental”. • A peculiaridade da crítica está no fato de que Taylor não relega alguns ideais do liberalismo, e mais, o autor aposta na possibilidade de se conjugar liberalismo com comunitarismo.
Taylor (1931) é um filósofo canadense influente na filosofia contemporânea. O autor versa em inúmeros campos do pensamento, psicologia, ciências sociais, religião, e principalmente ética e política. • Suas principais obras são:Hegel (1975), Sources of the Self (1989), Le Malaise de la Modernité (1991), Multiculturalism (1994), além de outros ensaios contidos em coleções como Philosophical Papers vol 1,2 (1985) e Philosophical Arguments (1995).
O primeiro desafio enfrentado pelo autor para a composição de sua crítica ao liberalismo e ao seu projeto de filosofia política, que intercala liberalismo com comunitarismo, está numa identificação dos planos estruturantes que podem ser separados em ambas as doutrinas.
Taylor afirma que liberalismo e comunitarismo se dividem em meio a questões de defesa e ontológicas. • “As questões de defesa referem-se à posição moral ou à política que se adota. Há aqui uma ampla gama de posições que, numa extremidade, dá primazia aos direitos individuais e à liberdade e, na outra, dá maior prioridade à vida comunitária ou ao bem das coletividades.” (2000, p.198). • As questões ontológicas separam monistas (a) de holistas (b). • “Eles acreditam que em (a), a ordem da explicação, você pode e deve explicar ações, estruturas e condições em termos das propriedades dos constituintes individuais; e em (b) a ordem da deliberação, você pode e deve explicar os bens sociais em termos de concatenações de bens individuais.” (TAYLOR, 2000, p.197).
Taylor aponta que a justificação das questões ontológicas não determina as questões de defesa, e vice-versa. Isso significa que a teoria não fica enrijecida a uma única lógica – monista/individualista e holista/coletivista. • A crítica comunitarista do autor estará centrada numa forma monista/individualista de compreender o liberalismo. Já a possibilidade de se ampliar os horizontes do liberalismo está na conjugação do holismo com o individualismo. O resultado é o sujeito conscientemente inserido na sociedade (ontológica) aliado à defesa social de valores como a liberdade e individualidade.
O principal problema identificado pelo autor, sobretudo, nas teorias liberais está na defesa do atomismo. O pressuposto dessa visão de sujeito é proveniente da tradição epistemológica moderna oriunda de Descartes. O dualismo cartesiano trouxe o desprendimento do sujeito com o mundo dos objetos (o que se inclui o próprio corpo). Esta tradição representou alterações não só na epistemologia como no campo da política. Nesse sentido, o sujeito antecede à própria sociedade, que passa a ser fruto das vontades individuais (direitos).
Uma primeira contraposição a essa visão está na afirmação grega e, sobretudo, aristotélica de animal político, isto é, engajado intrinsecamente na comunidade. • No entanto, podemos recorrer à modernidade e, principalmente, à contemporaneidade, para a afirmação de um sujeito engajado pela linguagem (Herder, Wittgenstein), corpo (Merleau-Ponty) e encarnado no mundo (Merleau-Ponty, Heidegger). • São a esses autores que Taylor irá recorrer para a afirmação de um sujeito engajado na sociedade.
No que se refere às questões de defesa, Taylor identifica um liberalismo, dito “procedimental”, que tem as seguintes características: • “(...) vê a sociedade como uma associação de indivíduos, cada um dos quais tem uma concepção de uma vida boa ou válida e, correspondentemente, um plano de vida. A função da sociedade deve ser facilitar esse plano de vida o máximo possível e seguir algum princípio de igualdade.“ (TAYLOR, 2000, p.202). • Neste propósito, os direitos que visam salvaguardar as liberdades e, sobretudo, a liberdade de seguir um fim, têm uma primazia em relação ao bem, isto é, a um projeto comum pautado em ideais políticos a serem maximizados a toda a sociedade por parte do Estado.
Seguindo a meta de não favorecer nenhum grupo ou indivíduo numa sociedade, o liberalismo propõe, sob o que o autor chama de uma política da dignidade, uma igual identidade pública. • No entanto, ao mesmo tempo em que a modernidade promoveu uma equidade do status jurídico aos cidadãos, a cultura do período buscou também destacar, sob o que Taylor chama de política da diferença, uma identidade individualizada, no sentido de que cada um possui sua maneira própria (autêntica) de ser.
Ocorre que entre a política da igual dignidade e a política da diferença há um conflito, ressalta TAYLOR: • “Para uma delas, o princípio do respeito igual requer que tratemos as pessoas de uma maneira cega às diferenças. A intuição fundamental de que os seres humanos merecem esse respeito concentra-se naquilo que é o mesmo em todos. Para a outra, temos de reconhecer e mesmo promover a particularidade. A reprovação que a primeira faz à segunda é simplesmente que ela viola o princípio da não discriminação. A reprovação que a segunda faz à primeira é a de que ela nega a identidade ao impor às pessoas uma forma homogênea que é infiel a elas. (2000, p.254).”
O liberalismo, como expõe o filósofo, preconizou uma política da dignidade em detrimento da política da diferença, de modo que universalizou um modo hegemônico de identidade, sob preceitos procedimentais, que no fundo é o reflexo de uma cultura particular, com localização específica – mais precisamente o ocidente –, e com um representante autêntico – os Estados Unidos. “Assim, a sociedade supostamente justa e cega às diferenças é não só inumana (porque suprime identidades) mas também, de modo sutil e inconsciente, altamente discriminatória.” (TAYLOR, 2000, p.254).
Taylor faz uma reflexão também no que concerne à liberdade individual promovida pelo liberalismo. A doutrina afirma um igual direito dos indivíduos de perseguir um fim. A igualdade formal da liberdade não indica qual fim possui um valor forte na sociedade. Mesmo porque, uma sociedade “neutra” aos propósitos dos indivíduos deve privilegiar mais a condição formal (Justo) de identidade (liberdade e igualdade) do que um projeto comum (Bem), o qual serviria de horizonte para a avaliação dos fins optados pelos indivíduos.
Numa sociedade liberal “procedimental” não há espaço, então, para a liberdade idealizada pelo Republicanismo. Neste propósito, a participação no autogoverno corresponde à essência da liberdade, isto é, aquilo que deve não só ser assegurado como promovido. Isto implicaria para o liberalismo neutro a defesa de um projeto particular, logo discriminatório. Ora, afirmar a participação política (liberdade política) como sendo o mais forte valor de uma sociedade significa estabelecer reduções na liberdade de um indivíduo de seguir um fim, pois o liberalismo permite que o indivíduo possa não optar por esse plano de participação política.
De que modo pode-se pensar, então, uma possibilidade de conjugar liberalismo com comunitarismo? • Para esta resposta, Taylor opta por uma saída comunitarista, no entanto, sem negar os valores do liberalismo (liberdade e igualdade). Ao partir da idéia de que a condição do sujeito é a de estar inserido numa comunidade (holismo), isto é, numa cultura ou forma de vida, os ideais do liberalismo podem ser pensados como correspondendo a uma cultura e um povo específico. Isso representa uma contraposição à pretensão de universalidade do liberalismo “procedimental”.
O filósofo afirma, então, em relação à defesa do ideal de sociedade, seja individualista, com a promoção da liberdade individual, ou coletivista, com a prioridade à liberdade de autogoverno, que “Tem-se de particularizar a questão em termos da tradição e da cultura de cada sociedade.” (TAYLOR, 2000, p.218)
Taylor vê no Quebec um exemplo de sociedade que possui uma forte meta coletiva relativa à defesa da cultura francesa e que, nem por isso, representa valores contrários ao liberalismo. • “(...) uma sociedade com fortes metas coletivas pode ser liberal desde que também seja capaz de respeitar a diversidade, especialmente em suas relações com aqueles que não partilham suas metas comuns, e desde que possa oferecer salvaguardas adequadas dos direitos fundamentais. (2000, p.265)” • Sob a ótica comunitarista de Taylor, o reconhecimento das diferenças e a defesa da cultura representam metas que estão além das satisfações individuais.
Bibliografia • DE ARAÚJO, Paulo Roberto M. Charles Taylor: para uma ética do reconhecimento. São Paulo: Edições Loyola, 2004. • TAYLOR, Charles. Argumentos Filosóficos. Tradução de Adail Ubirajara Sobral. São Paulo: Edições Loyola, 2000. • _______As Fontes do Self: a construção da identidade moderna. Tradução de Adail Ubirajara Sobral e Dinah de Abreu Azevedo. São Paulo: Edições Loyola,1997. • _______ Human Agency and Language. Philosophical Pappers vol1. United Kingdom: Cambridge, 1985. • _______ Le Malaise de la modernité. Traduit de l`anglais par Charlotte Melançon. Paris : Les Éditions du Cerf, 1999. • _______ Multiculturalismo: examinando a política de reconhecimento. Tradução de Marta Machado. Lisboa: 1994. • _______ Philosophy and the human sciences. Philosophical Papers vol 2. United Kingdom: Cambridge, 1985.