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Felizmente há luar!. Luís de Sttau Monteiro (1926-1993). Vida e obra de Sttau Monteiro. B iografia Luís Infante de Lacerda Sttau Monteiro nasceu a 3 de Abril de 1926, em Lisboa, e morreu a 23 de Julho de 1993, na mesma cidade.
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Felizmente há luar! Luís de Sttau Monteiro (1926-1993)
Vida e obra de Sttau Monteiro • Biografia • Luís Infante de Lacerda Sttau Monteiro nasceu a 3 de • Abril de 1926, em Lisboa, e morreu a 23 de Julho de 1993, • na mesma cidade. • Viveu a sua infância e adolescência em Londres, onde o seu • pai exerceu, durante as décadas de 30 e 40, as funções • de embaixador de Portugal, até ser demitido por Salazar • em 1943. • Esses anos em Inglaterra foram decisivos para a sua formação • intelectual, devido ao contacto próximo com o panorama histórico-político vivido na Europa e com a cultura e mentalidade inglesas. • De regresso a Portugal, frequentou a Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, tendo concluído o curso em 1951. • Exerceu advocacia apenas durante dois anos. Assim, e como forma de sobrevivência material, dedicou-se ao jornalismo e à atividade • publicitária, o que lhe permitiu dar largas à sua atividade literária.
- Teve um importante papel na divulgação da dramaturgia estrangeira, produzida nos anos 50/60, tanto como tradutor como encenador de peças de vários autores (como por exemplo William Shakespeare). • Em 1961, foi preso pela PIDE (depois de ter sido alvo de várias perseguições). • Nesse mesmo ano (1961) publicava-se a peça de teatro Felizmente há luar!, que a Associação Portuguesa de Escritores distinguiu com o Grande Prémio de teatro no ano seguinte, mas que a censura do regime salazarista apreendeu de imediato. • Revelou-se um forte opositor ao regime fascista, dando guarida a vários amigos perseguidos pela polícia de estado. • Entre 1962 e 1967, desiludido com Portugal, autoexilou-se em Inglaterra, onde entrou num período de forte produção literária. • Sttau Monteiro desenvolveu uma intensa atividade jornalística em revistas como Almanaque e o suplemento “A Mosca”, do Diário de Lisboa que • dirigiu até 1979. • Nos primeiros tempos da curta e ilusória “primavera marcelista”, As Mãos de Abraão Zacut, publicada em 1968, seria a primeira peça de Sttau Monteiro a representar-se, no Teatro Estúdio de Lisboa, em 1969.
- Em 1978, subiu à cena, no Teatro Nacional, a peça Felizmente há luar!, numa encenação do próprio autor, que não foi recebida de forma unânime pela crítica: uns valorizando o trabalho político do autor, outros queixando-se da fraca encenação e outros da intenção satírica. Principais obras publicadas Ficção: Um Homem Não Chora, romance,1960 Angústia para o jantar, 1961 E se For Rapariga Chama-se Custódia, novela 1966 Agarra o verão, Guida, Agarra o Verão, romance inédito que constituirá a base da telenovela Chuva na Areia, 1982 Teatro: Felizmente Há Luar!,1961 Todos os Anos pela primavera,1963 O Barão, adaptação da novela de Branquinho da Fonseca para o teatro,1965 Auto da Barca do Motor Fora de borda,1966 A Guerra Santa,1967 A Estátua,1967 As Mãos de Abraão Zacut,1968 Sua Excelência,1971
Temáticas mais comuns nas suas obras • Luís de Sttau Monteiro foi um homem que entendeu a vida como um desafio: o de conciliar uma profissão com o prazer e a liberdade de ser e estar. • Nunca abdicou dos seus ideais, nomeadamente a defesa da liberdade, a luta contra a intolerância e as injustiças sociais, o que o levou a afirmar que, para ele, “a única coisa sagrada (era) ser livre como o vento” • Em toda a sua obra revela estes três • ideais que sobretudo se exprimem • através da linguagem teatral. • Como o próprio autor diz: • “ A minha vida é uma luta pela liberdade (…) E ao lado disso o • teatro é uma literatice sem o mais pequeno interesse” As temáticas presentes na obra Felizmente há luar! são exatamente a ânsia pela liberdade e a luta contra a intolerância e as injustiças sociais.
A dualidade histórica – paralelismo do tempo da história e do tempo da escrita • Logo no início da peça, nas didascálias laterais, Sttau Monteiro apela para a necessidade de o leitor “entender, logo de entrada, que tudo o que se vai passar no palco tem um significado preciso” e “que os gestos, as palavras e o cenário são apenas elementos de uma linguagem a que tem de adaptar-se”. • Desta forma afirma que na peça Felizmente há luar! existe um paralelismo entre um passado histórico revisitado e a contemporaneidade portuguesa dos anos sessenta. • Foi esta a forma que o escritor encontrou para ludibriar a censura oficial e poder criticar a sociedade portuguesa do seu tempo. • As instituições da sociedade fascista são, assim, postas em causa pela critica da sociedade portuguesa do Antigo Regime.
O espaço - físico e social • Espaço físico • Ao longo da peça surgem referências a espaços físicos reais, contextualizadores da ação e criadores de verosimilhança: • Campo de Ourique • “ Em Campo d`Ourique – já lá vão mais de dez anos – quando eu era soldado no regimento de Gomes Freire…” (na fala do Antigo Soldado) • Cais do Sodré • “No Cais do Sodré há um café, Excelência, onde se reúnem todos os dias os defensores do sistema das cortes…” (fala de Vicente dirigindo-se a D. Miguel) • O Rato • “ Tenho uma missão para si. Quero que se torne conhecido para os lados do Rato e que veja quem entra em casa do meu primo” (Fala de D. Miguel dirigindo-se a Vicente) • “ Tenho o corpo no Rato e a alma em S. Julião da Barra (…)” • S. Julião da Barra • “ Que estará ele fazendo a esta hora, fechado numa cela em S. Julião da Barra?” (fala de Matilde interrogando-se acerca da detenção do General Gomes Freire de Andrade)
Campo de Sant`Ana • “Durante uns instantes ouve-se o latim dos padres que acompanham os presos ao Campo de Sant`Ana e veem-se os populares, sentados, a meia-luz.” • Espaço social • A articulação entre o espaço físico e o espaço social é conseguida pela utilização de objetos – símbolos e pela postura e comportamento de personagens que identificam os dois grupos socias em oposição: o grupo do poder e o do povo oprimido.
Os símbolos Titulo – Felizmente há luar ! - É uma expressão que faz parte de um documento escrito por D. Miguel e enviado ao intendente da polícia, no dia da execução do general. -No texto de Sttau Monteiro, é uma expressão proferida por duas personagens de “ mundos “ diferentes, no final do ato II: D. Miguel, símbolo do poder , e Matilde , símbolo da resistência . - Tendo em conta esta dualidade, o luar é interpretado de forma diferente por cada uma das personagens. Para D. Miguel, o luar permitirá que o clarão da fogueira seja visto por todos, atemorizados aqueles que ousem lutar pela liberdade, sendo por isso um efeito dissuasor. Para Matilde, o luar sublinha a intensidade do fogo, incitando à ousadia daqueles que acreditam na mudança e na caminhada para a “ luz da liberdade”(prenúncio da revolução liberal), constituindo-se, por isso, como um estimulo para que o povo se revolte. • Intencionalmente, Sttau Monteiro escolhe esta expressão para título da sua obra e reforça o seuobjetivo: a esperança no restabelecimento da justiça. • Lua • Por estar privada de luz própria, na dependência do Sol e por atravessar fases, mudando de forma, a Lua representa dependência, periocidade. • A luz da lua, devido aos ciclos lunares, também se associa à renovação. A luz é a força extraordinária que permite o conhecimento e a lua poderá simbolizar a passagem • da vida para a morte e vice-versa, o que , aliás, se relaciona com a crença na • vida para além da morte.
Saia verde • Encontra-se associada a momentos de felicidade vividos pelo casal. - O verde da saia simboliza a esperança de que um dia se reponha a justiça. • É sinal de um amor verdadeiro e transformador, pois Matilde, vencendo aparentemente a dor e a revolta iniciais, comunica aos outros esperança através desta simples peça de vestuário. • Fogueira • -Para D. Miguel Forjaz, a fogueira constituirá um ensinamento para o povo; para Matilde, a chama da fogueira manter-se-á viva e a liberdade triunfará. • - Se no presente a fogueira se relaciona com a tristeza e a escuridão, no futuro relacionar-se-á com a esperança e a liberdade. • Moeda de cinco réis • - Funciona como símbolo do desrespeito que os mais poderosos mantinham para com o próximo, o que contraria os mandamentos de Deus.
As personagens • Grupos de personagens • As personagens do poder – “Três conscienciosos governadores do Reino”: • - o poder político representado por D. Miguel; • - o poder religioso na figura do principal Sousa; • - o poder militar representado por Beresford. • Os delatores • - Andrade Corvo e Morais Sarmento, “ dois denunciantes que honraram a classe” • -Vicente, “um provocador em vias de promoção”. • As personagens do antipoder • - General Gomes Freire de Andrade, a presença ausente; • - Matilde de Melo, “ a companheira de todas as horas”; • - Sousa Falcão, “o inseparável amigo”; • - Frei Diogo. • O Povo • - Manuel, “ o mais consciente dos populares”. • - Rita, “ a mulher do Manuel” • - Os populares, “ o pano de fundo permanente”.
Caracterização das personagens • As personagens do poder • D. Miguel • Pequeno tirano, inseguro e prepotente, revela-se um homem contrário ao progresso e insensível à justiça a à miséria. • - O seu discurso preconceituoso e profundamente demagógico constrói-se sobre verdades e convicções falsas. Os argumentos do “ardor patriótico”, da construção de “um Portugal próspero e feliz, com um povo simples, bom e confiante, que vivia lavrando e defendendo a terra, com os olhos postos no Senhor” são o eco fiel do discurso politico Salazarista. • - D. Miguel revela falsidade e hipocrisia. • Beresford • - Personagem cínica e controversa que lidera o processo de Gomes Freire, não como um dever nacional ou militar, mas apenas motivado por interesses individuais: a manutenção do seu posto e da sua tença anual. • A sua presença contribuiu para acentuar as contradições no seio do poder. • É um homem crítico em relação a Portugal e está sempre pronto a denegrir a sua imagem. • Surge como uma voz que reprova a atuação de D. Miguel e do principal Sousa.
Principal Sousa • Além da hipocrisia e da falta de valores éticos, esta personagem deixa transparecer que os interesses particulares suplantam o bem comum – “Agora me lembro de que á anos, em Campo de Ourique, Gomes Freire prejudicou muito a meu irmão Rodrigo! “ • Simboliza, de igual modo, o arranjo entre a Igreja, enquanto instituição, e o poder e a demissão da mesma em relação à denúncia das verdadeiras injustiças. • As didascálias que acompanham esta personagem no ato I – “ O principal Sousa surge no palco imponentemente vestido.” (p.36) – e no ato II – “ Surge a meio do palco (…) Está vestido de gala e sentado na cadeira em que apareceu no 1º ato” (p. 121) – mostram tratar-se de um homem vaidoso que aprecia a riqueza e o luxo, o que entra em conflito com os princípios da Igreja. • - É um homem que não apresenta uma forte convicção relativamente aos procedimentos adotados contra o general Gomes Freire : tem dúvidas e hesitações. “Não me agrada a condenação dum inocente…”
Os delatores • Vicente • Elemento do povo • Trai os seus iguais, chegando mesmo a provocá-los, apenas lhe interessando a sua própria ascensão político-social. • A sua atuação evidencia dois momentos distintos: • • Num primeiro momento, tenta denegrir junto do povo o prestígio do general, • assumindo-se como um provocador e agitador • “ Vocês ainda não estão fartos de generais? (…) Tu, José: Tens sete filhos com • fome e frio e vais para casa com as mãos a abanar. Julgas que o Gomes • Freire os vai vestir? (…) E tu (…) Julgas que matas a fome com balas? Idiotas! • (…) O que eles querem é servir-se da gente” • • Num segundo momento, assumindo o papel específico de denunciar o general • a D. Miguel a troco da nomeação como intendente da política. • Ele é indubitavelmente todo aquele que se vende ao poder, de forma pouco escrupulosa. • “Eu, chefe de policia! Estou a ver a cara do povo… (…) o povo a vir bater-me à porta: • Meu senhor: Nós não temos pão em casa… Dê-nos uma esmolinha (…) • E lá lhes vou dando umas moedas, por caridade …”
Andrade Corvo e Morais Sarmento • - São os delatores por excelência, aqueles a quem não repugna trair ou abdicar dos ideais, para servir obscuros “propósitos patrióticos”. • As personagens do antipoder • Sousa Falcão • Sousa Falcão, “o inseparável amigo”, “ o amigo de todas as horas”, é o amigo fiel em quem se pode confiar e que está sempre pronto a exprimir a sua solidariedade e amizade. • No entanto, ele próprio tem consciência de que, muitas vezes, não atuou de forma adequada com os seus ideais, faltando-lhe coragem para passar à ação. Por isso, para ele, o general é mais do que um amigo, é alguém que ele desejaria ser. • - O processo de Gomes Freire permite a Sousa Falcão uma reflexão e consciencialização da sua própria existência- “ Há homens que obrigam todos os outros homens a reverem-se por dentro”( Diálogo final com Matilde)
Gomes Freire de Andrade • Como o próprio dramaturgo afirma, “está sempre presente, embora nunca apareça” e é a personagem central de peça. • Gomes Freire aparece-nos, então, como um homem instruído, letrado, “um estrangeirado”, um militar que sempre lutou em prol da honestidade e da justiça. • O povo vê nele o seu herói, o único que será capaz de o libertar do clima de opressão e terror em que vive, depositando nele as derradeiras esperanças de sobrevivência e de regresso a uma sociedade justa e livre do domínio dos ingleses e da tirania da regência. • É o símbolo da luta pela liberdade, da defesa intransigente dos ideais e daí que a sua presença se torne tão incómoda para os “reis do Rossio”. • A sua morte, servirá de lição a todos aqueles que ousem afrontar o poder político e também, de certa forma, económico, representado pela tença que Beresford recebe. • - O martírio de Gomes Freire, a sua lição de coragem, bem como a sua determinação em não abandonar o sonho de ver Portugal livre, constituem os principais elementos da construção do caracter épico e trágico desta personagem.
Matilde de Melo • “Companheira de todas as horas” de Gomes Freire é ela quem dá voz á injustiça sofrida pelo seu homem. • As suas falas, imbuídas de dor e revolta, constituem também uma denúncia da falsidade e da hipocrisia do Estado e da Igreja, identificando-se com a ideologia progressiva dos anos 60. • - Os monólogos desta personagem revelam tratar-se de uma mulher que foge ao paradigma das mulheres da sua época. Ex: Não estava casada com Gomes Freire, sendo, por isso, apelidada de “a amante de Gomes Freire”. • Quando dialoga com os representantes da Igreja, revela um profundo conhecimento dos seus princípios e insurge-se contra a leviandade de um Igreja que desconhece o verdadeiro significado da caridade da justiça e da igualdade entre os homens. • Quando dialoga com o povo mostra-se insatisfeita com a sua falta de solidariedade e apoio. • Matilde é uma personagem modelada, uma vez que se apresenta inicialmente como uma mulher que apenas quer salvar o seu homem mas ao tomar consciência da trama maquiavélica que envolve o general, acaba de assumir a luta de Gomes Freire, revelando-se firme e corajosa.
Acreditando num reencontro pós-morte, Matilde reafirma a crença numa outra vida para além da vida terrena, revelando-se, assim, como uma cristã autêntica. • - No entanto, a consciência da inevitabilidade do martírio do seu homem arrasta-a para um delírio final em que envergando a saia verde que o general lhe oferecera em Paris, Matilde dialoga a uma só voz , com Gomes Freire vivendo momentos de • alucinação intensa e dramática. Estes momentos finais pelo seu caracter surreal, denunciam o absurdo a que a intolerância e a violência dos homens conduzem. • Frei Diogo de Melo e Meneses • Esta personagem é o símbolo do antipoder dentro da Igreja – “ se há santos, Gomes Freire é um deles…”. • Surge por oposição ao principal Sousa, representante de uma igreja que em tudo se distância dos princípios mais autênticos da Igreja de Cristo e que, por isso, desvirtua a interpretação dos textos sagrados. • Frei Diogo é o representante de uma igreja autêntica. • É ele que fortalece Matilde quando esta parece deixar de ter fé e afirma que “A misericórdia de Deus é infinita”. Acrescentando que “Haja o que houver, não julgue a Deus pelos homens que falam em seu nome”. Este apelo de Frei Diogo denuncia a atuação contraditória dos homens da Igreja.
O Povo • Encontra-se representado pela presença de “vários populares” e não tem uma intervenção direta no conflito dramático . • - É um grupo de infelizes , de desanimados, que ninguém respeita, que não vive, mas apenas sobrevive, e cuja condição contraria os princípios da dignidade humana. • Manuel e Rita • - São símbolos de um povo oprimido e esmagado, sem vitalidade. • - Têm consciência da injustiça em que vivem, sabem que são simples joguetes nas mãos dos poderosos, mas sentem-se impotentes para alterar a situação. • - Veem em Gomes Freire uma espécie de messias e, desta forma, a sua prisão é uma espécie de traição à esperança que o povo nele depositava. • A fala de Manuel, no início do ato II, evidencia um tom irónico que acompanha o desdobramento de personalidades que a personagem ensaia: o oprimido que suplica miseravelmente uma esmola e o opressor que humilha de forma arrogante. • Reforça o panorama de injustiça social, de falta de liberdade e dignidade humana que toda a peça claramente denuncia. • Manuel e Rita acabam também por simbolizar a desesperança, a desilusão, a frustração de toda uma legião de miseráveis face á quase impossibilidade de mudança da situação opressiva em que vivem.
Personagens reais da peça • Gomes Freire de Andrade D. Miguel Pereira Forjaz • (Viena,1757-1817,S. Julião da Barra) (1769 – 1827) • - Foi acusado de liderar uma conspiração • em 1817 contra a monarquia de Dom João VI • Embora não fosse provado o seu envolvimento • foi detido, preso, condenado à morte e • enforcado junto ao Forte de São Julião da Barra • por crime de traição à Pátria. • - Após a vitória liberal, a memória do general • foi reabilitada, transformando – se num dos • mártires da liberdade. • Sttau Monteiro encontra na figura histórica do • general o exemplo do homem que sacrifica a vida • em nome do valor da liberdade. António de Sousa Falcão • Matilde de Melo • Frei Diogo de Melo e Meneses • Pedro Pinto de Morais Sarmento • Andrade Corvo de Camões • D. José António de Meneses e Sousa Coutinho – Principal Sousa Marechal Beresford (1768-1854)
A ação da peça • Resumos dos atos • Ato I • O ato inicia-se com uma cena coletiva. • Do conjunto do povo, andrajosamente vestido, destacam-se Manuel, Rita, dois populares, uma velha e Vicente. O diálogo entre as personagens incide sobre a miséria em que vivem e a impotência de a solucionar, traduzida na interrogação de Manuel ”Que posso eu fazer?”. • O Som dos tambores, que se ouve ao longe , faz com que os populares comecem a falar de Gomes Freire de Andrade - “ Um amigo do povo! Um homem às direitas !” • - Todos parecem adorar Gomes Freire, exceto Vicente que desconstrói a imagem do general como homem perfeito. O seu discurso é repleto de ironia , tentando mostrar aos que o ouvem que o general não é diferente dos outros poderosos, porque “ O que há é homens e generais”. • Entretanto, o povo dispersa com a chegada de dois polícias que vêm • recolher informações e que se aproximam de Vicente.
O diálogo entre as três personagens mostra-nos, progressivamente, que Vicente orienta a sua vida em função do dinheiro e do poder – “Só acredito em duas coisas: no dinheiro e na força”. • Por isso, não tem pudor em afirmar que vende os seus ” irmãos”, porque eles lhe fazem lembrar a fome e a miséria em que nasceu - “…sempre que olho para eles me vejo a mim próprio: sujo , esfomeado, condenado à miséria por acidente de nascimento”. • Este “acidente” foi determinante para a revolta contra a sua condição – “A única coisa que me distingue de um fidalgo é uma coisa que se passou há muitos anos e de que nem sequer tive a culpa : o meu nascimento “. • Depois, os dois polícias comunicam a Vicente que o governador do reino , D. Miguel Pereira Forjaz , lhe quer falar para, provavelmente o incumbir de “uma missão especial”. Vicente imagina-se já chefe de polícias e, face ao comentário do primeiro polícia de que , tendo sido “os portadores da boa nova”, poderiam ser recompensados, lembra a arrogância dos poderosos , mesmo quando a sua origem é humilde. “ Ah! Ah! Ah! Os degraus da vida são logo esquecidos por quem soube a escada… Pobre de quem lembre ao poderoso a sua origem… Do alto do poder, tudo o que ficou para trás é vago e nebuloso. (…) Quem sobe, amigos, larga os homens e aproxima-se de Deus! Passa a ser julgado por outras leis…”
D. Miguel dá uma missão a Vicente: vigiar a casa de seu primo, o general Gomes Freire de Andrade, para os lados do Rato. • Vicente sai e os” três reis do Rossio”, D. Miguel, o principal Sousa e o Marechal Beresford dialogam sobre o estado da nação, o perigo das novas ideias subversivas que destruirão o país e o “reino de Deus”. Chegam, então à conclusão de que é necessário encontrar um nome , alguém que possam acusar de ser o responsável pelo clima de insurreição que alastra pelo país. Andrade Corvo e Morais Sarmento, antigos companheiros do general e atuais delatores apresentam-se diante dos governantes, dando-lhes conta dos resultados das suas investigações , em troca de “algo mais substancial”. • De novo sós, os três governadores dialogam sobre o castigo a aplicar a quem ousa ser inimigo do reino, tomando forma a ironia de Beresford, que sem inibições , desprestigia os portugueses e assume sem pudor a sua sobranceria e o seu interesse meramente económico – “Pretendo uma única coisa de vós: que me pagueis - e bem!”. Pragmaticamente Beresford afirma que troca os seus serviços ( a reorganização do exército) por dinheiro. O principal Sousa confessa que a atitude do marechal lhe desagrada, mas que precisa dele para encontrar “o chefe da conjura”. • Mais tarde Andrade Corvo, Morais Sarmento e Vicente indicam o nome do opositor, era general Gomes Freire de Andrade. Agora só resta a “Morte ao traidor Gomes Freire de Andrade”.
Ato II • Inicia-se com uma cena coletiva. • Manuel revela a sua impotência perante a prisão do general e constata que a situação de miséria em que vivem é ainda mais desesperante – “E ficamos pior do que estávamos… Se tínhamos fome e esperança, ficamos só com fome …”. • Os restantes populares acompanham-no no seu desalento, até uma nova intervenção policial, que dispersa o grupo. • - Rita mostra a sua piedade relativamente a Matilde (tinha-a ouvido chorar após a prisão do seu homem) e suplica a Manuel que não se meta “nestas coisas”. • Matilde surge, proferindo um discurso solitário, em que relembra os momentos de intimidade vividos com o seu general e ironiza dizendo que, se o seu filho ainda fosse vivo, lhe ensinaria a ser cobarde e “ a cuidar mais do fato do que da consciência e da bolsa do que da alma.” • Sousa Falcão, “amigo inseparável de Matilde e de Gomes Freire”, surge diante de Matilde, confessando o seu desânimo e desencanto face ao país em que vive – “O Deus deste reino é um fidalgo responsável que trata como amigo o Pôncio • Pilatos (…) Vive num solar brasonado e dá esmolas, ao domingo, por • amor a Deus.”
Sousa Falcão despede-se de Matilde e parte em busca de notícias do amigo, deixando Matilde, chorosamente triste, mas com vontade de enfrentar o poder.- “Vou enfrentá-los. É o que ele (o general) faria se aqui estivesse”. • - Diante de Beresford, que aproveita a situação para humilhar a mulher do general, Matilde suplica-lhe a sua libertação- “Quero o meu homem! Quero o meu homem, aqui ao meu lado!” -sem qualquer fruto. • Matilde desesperada, aproxima-se dos populares, que, indiferentes à sua presença, evocam Vicente, agora feito chefe da polícia. • No entanto, Manuel e Rita, após momentos de recriminação a Matilde, de que a oferta de uma moeda como esmola é símbolo, manifestam-lhe a sua solidariedade moral- “Não a podemos ajudar, senhora. Deus não nos deu nozes e os homens tiram-nos os dentes…” • Sousa Falcão reencontra-se com Matilde e revela-lhe que ninguém pode ver o general, já encarcerado numa masmorra sombria em S. Julião da Barra, sem direito a julgamento. Matilde, inconformada, recorda, então, a saia verde que o general um dia lhe oferecera em Paris e, como que recuperada do seu desgosto, decide enfrentar uma vez mais o poder. • O seu objetivo é exigir um julgamento e, para isso dirige-se ao principal Sousa, desmontando a mensagem evangélica, para lhe mostrar quanto o seu comportamento é contrário aos ensinamentos de Cristo- “ Como governador, já perdoou a Cristo o que ele foi e o que ele ensinou?”
Sousa Falcão anuncia que a execução do general está próxima. Matilde, em desespero, pede, uma vez mais, pela vida do general e D. Miguel Forjaz informa que a execução se prolongará pela noite ,”mas felizmente á luar…” • Matilde inicia ,então, um discurso de grande intensidade dramática : dirige-se a Deus, interpelando-o e lembrando-lhe os seus ensinamentos e os resultados práticos desses ensinamentos- “Senhor: não pretendo ensinar-te a seres Deus, mas, quando chegar a hora da sentença não te esqueças de que estes sabiam o que faziam!” Os populares comentam a execução do general: recusaram-lhe o fuzilamento e vai ser queimado. • - O ato termina com Sousa Falcão e Matilde em palco: o amigo do general elogia-o; Matilde despede-se do homem que amou -“ Dá-me um beijo- o último na terra – e vai! Saberei que lá chegas-te quando ouvir os tambores!”, e lança palavras de coragem e ânimo ao povo – “Olhem bem! Limpem os olhos no clarão daquela fogueira (…) felizmente há luar!”
Conclusão… Escrita numa época de tirania, ditadura e opressão, com o objetivo de levar o publico leitor a refletir sobre as circunstancias da situação politica que se vivia no momento (1961), poder-se-á dizer que Felizmente há luar! Perdeu a sua eficácia argumentativa? O texto de Sttau Monteiro desenvolve uma serie de aspetos/temas que são universais e atemporais: - A luta por um ideal (liberdade); - A denuncia das injustiças sociais - A questão da religião: o ser e o parecer - A coragem - A lealdade - a condenação da opressão e da delação -a dimensão do verdadeiro patriotismo - A amizade - a condição feminina: a mulher com um papel ativo na sociedade - as diversas vertentes do amor: amor à pátria amor à liberdade amor - paixão
Trata-se de um texto engagé – como eu – à causa do homem, à causa da vida. Luís de Sttau Monteiro Fim…