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Constitucionalismo monárquico português Rupturas e continuidades. A historiografia da Revolução tem-na glorificado como um acto de ruptura. Ficando, nesse sentido, prisioneira da imagem que a maior parte dos revolucionários faziam da própria revolução.
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Constitucionalismo monárquico portuguêsRupturas e continuidades • A historiografia da Revolução tem-na glorificado como um acto de ruptura. Ficando, nesse sentido, prisioneira da imagem que a maior parte dos revolucionários faziam da própria revolução. • Para uma discussão, em geral, do assunto, há bibliografia geral: v.g. Spang, Rebecca L. Paradigms and Paranoia: How modern is the French Revolution? in: The American Historical Review, 108 (2003), S. 119-147 • No domínio da história constitucional, tende a encarar-se o novo constitucionalismo como algo de inaugural, sem raízes no Antigo Regime nem continuidades de Antigo Regime na leitura das novas ideias. • A crítica mais original à historiografia constitucional comum foi feita por Fernando Martinez Perez, "Ley expresa, clara y terminante". Orden normativo y paradigma jurisdiccional en el primer constitucionalismo español", Historia constitucional. Revista electronica de historia constitucional, 3(Junho 2002), http://hc.rediris.es/tres/indice.html (20.11.2004)).
Continuidades no constitucionalismo ibérico • Supervivência do conceito anterior de soberania como poder supremo, mas não exclusivo (a fórmula preambular da Constituição de 1822); • Supervivência da ideia de auto-regulação dos corpos políticos (como a Igreja, ou a família, cada qual absoluto nos limites das suas atribuições [jurisdição]), que a ordem constitucional devia incorporar; • Concepção da legislação, não como um acto de vontade arbitrária, mas como a revelação de uma ordem anterior e indisponível, como uma deliberação de tipo "judiciário" (englobando um "conhecimento de causa" e um "contraditório“) Assimilação das cortes a um "grande conselho" de Antigo Regime, decidindo segundo o mesmo processo de confronto de "votos“; • Supervivência da ideia de que a tradição (não a natureza) gera situações jurídicas (algumas delas constitucionais, que as novas constituições devem reconhecer ou com as quais se devem acomodar) (ex.: continuação da dinastia);
Continuidades no constitucionalismo ibérico • Entendimento das atribuições dos poderes, não como resultado de uma definição apriorística, baseada na natureza do Estado - como grande sujeito que "quer", "executa" e "delibera" -, mas como resultado de uma distribuição histórico-concreta de competências; • Supervivência da ideia de que a manutenção da constituição está, sobretudo, na reserva das jurisdições, quer das pré-constitucionais, quer das dos novos "poderes” (monarquia limitada), garantida por um sistema de contrapesos e de controlos (checks and balances, como na Constituição inglesa); • Supervivência da ideia de que qualquer acto do poder pressupõe o acertamento prévio dos direitos envolvidos, pelo que a administração não se pode fazer sem um momento jurisdicional; • Identificação dos direitos particulares (não necessariamente individuais) com direitos historicamente radicados (adquiridos por uso, por concessão, geral ou particular), e não abstractamente naturais Daí que os direitos não sejam absolutamente invioláveis, mas violáveis desde que se observasse o processo juridicamente devido (de acordo com a natureza da sua génese e, por isso, não necessariamente jurisdicional).
História da Revolução de 1820 e da Constituição de 1822 • 24 de Agosto de 1824. • Um movimento militar proclama a Junta de Governo do Porto, encarregada de convocar Cortes para se fazer uma constituição que, mantendo a religião e a dinastia, remediasse os males do Reino. • O governo acede (Instruções de 31.10), sendo obrigado por um pronunciamento militar a adoptar um sistema directo de sufrágio, igual ao da Constituição de Cadiz (arts. 27 a 103; Instruções de 22.11). • As eleições tiveram lugar em Dezembro de 1820 (no ultramar, prolongaram-se até inícios de 1822). • O Projecto de Bases da Constituição (1821) é apresentado como resultado da reflexão sobre o antigo direito público português, mais do que sobre teorias políticas modernas. • A nova Constituição como “regeneração" da memória da constituição tradicional.
A Nação aparece como a entidade titular exclusiva da soberania • A Nação como "a união de todos os portugueses" (art. 20). • “Nação” e “Povo”. • A oposição entre liberdade dos antigos, caracterizada pela "participação política" dos "cidadãos activos", e a liberdade dos modernos, caracterizada pela garantia de não intromissão do Estado na esfera dos direitos individuais (Benjamin Constant, 1819) • desvaloriza a participação política universal. • Excluem-se do voto: • (i) os menores de 25 anos (ou, se casados, de 2 anos; • (ii) as mulheres; • (iii) os sujeitos ao pátrio poder, como as filhos-família, independentemente da idade, a menos que exercessem ofícios públicos; • (iv) os criados de servir que não vivam em casa separada dos patrões (art. 33, II e III); • (v) os submetidos à autoridade religiosa regular, i.e., os que vivam em comunidades monásticas; • (vi) os socialmente inúteis, que nada aportavam à república, como os vadios (art. 33, IV); aos quais se acrescentariam, no futuro, os analfabetos adultos (art. 33, VI).
Fontes da Constituição de 1822 • Carta constitucional francesa de 1814 • Constituição espanhola de 1812 (Constituição de Cadiz). • Bases da Constituição (1821)
A Nação aparece como a entidade titular exclusiva da soberania • Do lado dos que podiam ser eleitos, as restrições ainda eram maiores. • Exige-se renda suficiente, • excluem-se aqueles cujas inclinações naturais (falta de senso, irresponsabilidade) ou vinculações sociais podem importar diminuição da liberdade de opinião: os falidos, os que servem empregos da Casa Real, os libertos. • Excluem-se os estrangeiros, ainda que naturalizados, pela presumível falta daquele amor à pátria, como coisa orgânica, que só os naturais de origem podem ter.
Liberdade • Como dependência exclusiva da lei (liberdade republicana); • Como resistência (liberdade "liberal" ou "dos modernos"); • Como participação (liberdade "dos antigos") • Repercussão sobre a relação entre “lei” e “direitos”;
Soberania • Consiste no facto de: • a Nação não ser património de ninguém, • em só poder ser representada politicamente pelos seus representantes eleitos • e em ter o exclusivo do poder constituinte e legislativo (cf. arts. 26 e 27) A soberania manifesta-se, antes de tudo, no primado da lei, como expressão da autodeterminação da Nação (cf. art. 104: "Lei é a vontade dos cidadãos declarada pela unanimidade ou pluralidade dos votos dos seus representantes juntos em Cortes, precedendo discussão pública").
Lei e direito • Os representantes eleitos da Nação têm o exclusivo da legislação (arts. 27, 102, 105, 110). Embora não de fixar o direito. De facto, a Constituição não definia as fontes de direito, deixando esta atribuição livre nas mãos dos juizes. • Em Portugal, o conglomerado de ordens normativas que constituíam o direito estava definido na Lei da Boa Razão, de 18.8.1769. • Porém, como esta era imprecisa na identificação concreta das fontes direito, a definição destas era feita quase livremente pela doutrina ou, caso a caso, pelos julgadores.
Manifestações do primado da lei • Vinculação de todos os poderes, agentes e actividades do Estado em relação à lei: • o poder executivo tem como finalidade "fazer executar as leis" (art. 122); • os impostos não são obrigatórios se não tiverem sido votados em cortes (arts. 224, 234); • os funcionários não são proprietários dos seus ofícios (art. 13), respondendo pelas violações da constituição e das leis (art. 14); • as câmaras estão devem obediência às leis nas matérias de governo administrativo e económico (arts. 216, 218); • os direitos individuais são reconhecidos, “nos limites da lei”.
Igualdade perante a lei (art. 9) • Por ora, ainda não se declaram contrários à Constituição outros aspectos da desigualdade própria da sociedade de ordens: • como os direitos senhoriais; • a desigualdade dos sexos; • a relevância legal da religião; • os títulos nobiliárquicos, a escravatura).
Divisão de poderes • Carácter funcional à defesa da liberdade. • Consistindo a liberdade na "exacta observância das leis" (art. 2), a questão da divisão de poderes - que a doutrina constitucional com origem em Montesquieu e na experiência constitucional inglesa considerara como pedra de toque do constitucionalismo moderno - passa necessariamente para um segundo plano.
Poder legislativo • Uma única câmara, eleita de acordo com o sistema eleitoral já descrito (arts. 32 ss.). • As legislaturas duravam dois anos (art. 41), com sessões anuais de três meses (art. 83). • Cada deputado representava toda a Nação (art. 94). • As atribuições essenciais das Cortes eram as legislativas (a iniciativa, discussão e votação das leis, sua interpretação e revogação; o controlo da observância da Constituição e das leis) • Mas também de governo: a promoção do bem geral da Nação; a fixação anual dos efectivos militares; a fixação anual dos impostos e as despesas públicas; a criação e supressão de empregos públicos, bem como a fixação dos respectivos ordenados; a avaliação da responsabilidade (política, criminal e cível) dos secretários de Estado e demais funcionários (arts. 102 e 103 e ss.).
Poder executivo • O poder executivo (residual ...) residia no rei e tinha como atribuições gerais "fazer executar as leis; expedir os decretos, instruções e regulamentos adequados a esse fim e prover tudo o que for concernente à segurança interna a externa do Estado, na forma da Constituição" (art. 122). • Esta fórmula genérica concedia ao executivo um âmbito muito vasto de atribuições, em parte concorrente com algumas das atribuições confiadas ao Legislativo; • Os resíduos da royal prerogative ou do princípio monárquico.
Poder judicial • A Constituição revela, nesta matéria, uma tensão entre dois pólos. • Por um lado, o de garantir a independência dos tribunais, que corresponde à ideia do seu papel central na defesa do sistema constitucional e na defesa pública, imparcial e neutra dos direitos dos cidadãos. • Mas, por outro lado, a Constituição coloca os juizes e oficiais de justiça sob estrita vigilância, quanto a abusos e prevaricações, o que corresponde à imagem popular de uma justiça arbitrária, corrupta e corporativa. • Medidas suplementares visavam aumentar a confiança popular na justiça. Uma delas era o júri eleito (cf. art. 178), julgando sobre a matéria de facto, previsto, tanto para as causas criminais - expressa e especialmente referida é a sua intervenção no julgamento dos delitos de abuso da liberdade de imprensa -, como para as cíveis.
Carta Constitucional (1826). História da Carta • A Carta constitucional esteve em vigor durante 84 anos, até ao fim da monarquia, embora com lapsos: • insurreição miguelista (13.03.1828-26.05.1834); • reposição em vigor da Constituição de 1822, depois da Revolução de Setembro (10.9.1836-4.4.1838 • vigência da Constituição de 1838 (4.4.1838-27.1.1842). • e modificações, que resultaram das várias revisões constitucionais que originaram outros tantos actos adicionais • 05-07-1852, • 24-07-1885, • 03-04-1896, • 23-12-1907.
Fontes da Carta Constituconal • A Carta constitucional é promulgada sob o impacto filosofia política liberal-aristocrática de Benjamin Constant e de François Guizot. • Nela se mantém a generalização da cidadania a todos os nacionais (agora entendidos como todos os nascidos em território português, do Reino ou dos seus domínios (arts. 1 e 7) (o que incluiria, nomeadamente, as populações não europeias das colónias). • No entanto, esta generalização corresponde apenas à generalização da capacidade de gozo dos direitos civis, cuja base a Carta define como sendo "a liberdade, a segurança individual e a propriedade" e que garante a todos os cidadãos (art. 145).
A cidadania • Porém, já ao tratar dos direitos de participação política, a Carta - assume implicitamente a distinção de B. Constant entre cidadãos activos e cidadãos passivos. • Apenas reconhece direitos políticos (pelo menos na sua vertente de direitos eleitorais, cf. artº 63) - a alguns: • nomeadamente em função da sua renda (Cf. arts. 65 a 68 (de 100$00 para ser eleitor a 400$00 para ser elegível como deputado). • O sufrágio indirecto, consagrado nestes artigos da Carta (só substituído pelo sufrágio directo pelo Acto adicional de 1852) era outro meio de "filtrar" a vontade dos menos capazes pela mediação dos mais capazes.
Os direitos e a Constituição. • No seu último artigo, a Carta garante os direitos civis e políticos: • "Art. 145 - A inviolabilidade dos Direitos Civis e Políticos dos Cidadãos Portugueses, que têm por base a liberdade, a segurança individual e a propriedade, é garantida pela Constituição do Reino, pela maneira seguinte". • Concepção de direitos próxima do modelo liberal da Europa continental • Os direitos são garantidos, e não criados pela Constituição ("têm por base a liberdade, a segurança individual e a propriedade". • São os direitos da sociedade natural, fundados na própria natureza do homem, mas tutelados, agora, pela sociedade civil. • Esta tutela legal é dada, ao mesmo tempo, pela Constituição e pelas leis ordinárias, designadamente pelas leis civis e pelas leis penais. "Art. 145 - A inviolabilidade dos Direitos Civis e Políticos dos Cidadãos Portugueses, que tem por base a liberdade, a segurança individual e a propriedade,é garantida pela Constituição do Reino, pela maneira seguinte: [...]".
A garantia de direitos • O primeiro dos meios de garantia de direitos era - na continuação do direito de Antigo Regime - a garantia, em relação ao Estado, das esferas jurídicas dos particulares protegidas pelo direito (pelas leis), assegurando a sua intangibilidade ou, pelo menos, o dever de indemnizar por parte dos poderes públicos que as ofendam. • Quanto ao âmbito (aos actos administrativos recorríveis e ao fundamento e resultado do recurso), o recurso contencioso contra actos da administração era, apenas, um contencioso "de legalidade", escapando-lhe o domínio dos actos do poder que, ofendendo direitos, não pudessem ser arguidos de ilegalidade, ou seja, que se situassem no domínio das opções politicas ("poder discricionário da administração"). • E, por outro lado, o recurso produziria apenas a anulação do acto administrativo recorrido, e nunca a sua substituição por um outro correspondente à legalidade (ou seja, tratava-se de um recurso de mera anulação).
A garantia da legalidade • Numa primeira fase (Decreto nº 23, 1832), a possibilidade de apelo reduzia-se aos actos administrativos lesivos de direitos patrimoniais. • Em 1835 (CL 35.4), as questões contenciosas (relativas, portanto a ofensas de direitos pela administração) são devolvidas aos tribunais comuns, solução que se mantém com o Código Administrativo de 1836. • O Código Administrativo cabralista de 1842 organizou de novo tribunais administrativos para conhecer dos recursos dos actos da administração; embora agora com fundamento em qualquer tipo de ilegalidade, mesmo que não se ofendessem direitos patrimoniais. • Em 1870, o Conselho de Estado político separou-se do administrativo, dando-se a este o nome de Supremo Tribunal Administrativo. • Esta tibieza no reconhecimento de direitos dos cidadãos contra o Estado e na institucionalização de meios de os tornar efectivos era o produto de uma longa tradição. • Não tanto a tradição do direito comum do Antigo Regime. Mas, sobretudo, a tradição combinada do absolutismo monárquico setecentista (e, mesmo, oitocentista) e do jacobinismo revolucionário. Perante o interesse público - fosse ele representado pelo rei ou pelo parlamento - o indivíduo poucos direitos teria.
A garantia da constitucionalidade. Fundamentos • O princípio mais comumente aceite era o de que o poder estava limitado pela Constituição: • A Carta tinha sido outorgada pelo rei, como representante da Nação (cf. art. 12), nele residindo o poder constituinte originário e o dever primeiro de "observar e fazer observar a Constituição" (art. 76). • Daí que: • (i) as cortes não pudessem alterar a constituição sem o acordo do rei, que devia sempre sancionar as reformas constitucionais, • (ii) que a necessidade de sanção real das leis constituísse a primeira defesa em relação à omnipotência do legislativo.
A garantia da constitucionalidade. Argumentos literais. • (i) o art. 140, ao estabelecer um processo legislativo especial para alterar as matérias constitucionais da Carta, implicitamente separava o poder constituinte do poder legislativo ordinário, retirando a este último a faculdade de emitir leis anti-constitucionais; • (ii) o art. 139 dispunha que "as cortes gerais no princípio das suas sessões examinarão se a Constituição do Reino tem sido exactamente observada, para prover como for justo"; • (iii) as autoridades e titulares de cargos públicos tinham que jurar "cumprir e fazer cumprir a Constituição"; • (iv) todo o Cidadão podia "apresentar por escrito ao Poder Legislativo, e ao Executivo reclamações, queixas ou petições, e até expor qualquer infracção da Constituição, requerendo perante a autoridade a efectiva responsabilidade dos infractores" (art. 145, § 28)
A questão especial da inconstitucionalidade das leis • Podia dizer-se que uma decisão das cortes que obtivesse maioria parlamentar e sanção real tinha passado por dois crivos de apreciação da sua constitucionalidade, ambos eles revestidos da dignidade de representantes da Nação (as cortes e o rei). • Como o rei detinha também o poder moderador, "chave de toda a organização política", a quem competia velar "incessantemente sobre a manutenção da independência, equilíbrio e harmonia dos mais poderes políticos", e que a sanção das leis era uma atribuição deste poder (e não do executivo, cf. art. 74, § 3), a firmeza das leis aprovadas pelo rei ainda ficava mais reforçada. • Percebe-se, portanto, que se manifestasse uma resistência séria em admitir que outro órgão de soberania - nomeadamente, os tribunais - pudessem invalidar ou desaplicar por inconstitucional um acto legislativo O único controlo do legislativo seria, portanto, político.
As garantias institucionais da constitucionalidade • Desde os anos '30 que alguma jurisprudência e alguma doutrina propunham um controle judicial difuso da constitucionalidade. • Isto não representava nenhuma inovação em relação aos sistema de controlo da legitimidade das leis e dos actos de poder em vigor no Antigo Regime. • Os argumentos doutrinais: • Os juízes, como todas as autoridades públicas, tinham jurado - no acto de posse "cumprir, e fazer cumprir" a Carta e, por isso, não deviam poder aplicar legislação que a contrariasse, do ponto de vista material, orgânico ou formal. • A jurisprudência variou, sendo difícil avaliar a orientação dominante na prática judicial quotidiana: se (i) o acatamento da lei inconstitucional, se (ii) a sua desaplicação, por contrariar a constituição (desde logo a constituição formal, mas também a constituição material).
A divisão de poderes A Carta foi uma das poucas constituições oitocentistas que se afastou da clássica tripartição de poderes. Partindo do princípio de que "a divisão e harmonia dos Poderes Políticos é o princípio conservador dos Direitos dos Cidadãos, e o mais seguro meio de fazer efectivas as garantias" (art. 10), • a Carta estabelece quatro poderes (o legislativo, o moderador, o executivo e o judicial), • dos quais um (o moderador) é definido como "a chave de toda a organização política" (art. 71) • todos menos um (o judicial) estão nas mãos dos "representantes da Nação portuguesa" ("o rei e as cortes gerais", art. 12).
O poder moderador. Competências • No sistema da Carta (art. 74), as atribuições do poder moderador são: • a nomeação de pares sem número fixo; • a convocação extraordinária das cortes "quando assim o pede o Bem do Reino", • a sua prorrogação, adiamento ou dissolução; • a sanção dos decretos das cortes, para que tenham força de Lei; • a livre nomeação e demissão dos ministros; • o perdão de penas e a amnistia.
Poder moderador. Críticas • No entanto, esta hegemonia do poder moderador supunha o prestígio da instituição real. • Na sua falta, surgem críticas de natureza teórica, questionando a hierarquização dos poderes do Estado sob a hegemonia do rei. • Uns pronunciam-se, • ou pela supremacia do legislativo, de acordo com a lógica representativa, • ou do judicial, como poder naturalmente especializado na resolução de diferendos. • Outros críticam a confusão entre funções do Executivo e funções do Moderador que, na prática, significavam a rentabilização pelo executivo das prerrogativas do poder moderador. • De facto, depois do estabelecimento do rotativismo parlamentar (maxime nos anos 1851-1865; mas sobretudo 1878-1890), a existência de um poder moderador, mal se justificava, até porque o Acto Adicional de 1896 sujeitou os actos do poder moderador à referenda ministerial.
O poder legislativo. A Câmara dos Deputados. • O poder legislativo residia nas cortes e no rei ("[…] compete às Cortes, com a sanção do rei", art. 13). As cortes compunham-se de duas câmaras - a Câmara dos Pares e a Câmara dos Deputados. • A Câmara dos Deputados era constituída por um número de deputados - originalmente nomeados por eleição indirecta (art. 63) e censitária - proporcional à população das circunscrições eleitorais. • A eleição indirecta era apresentada como uma forma de compatibilizar um certo alargamento do direito de sufrágio com a fiabilidade das escolhas: o povo participava, mas apenas confiando a pessoas mais capazes a designação definitiva dos seus representantes. • A Carta (bem como a Const. de 1838) estabelecia um sufrágio restrito, em que o direito de voto apenas era concedido aos maiores de 25 anos que tivessem um rendimento mínimo de 100 000$00. Para dar uma ideia do que isto podia significar, um elemento de referência: uma jorna diária, pelos meados do séc., era de c. 650 rs... Em termos europeus, não se tratava de um valor muito elevado. • O Acto Adicional de 1852 inaugurou um outro modelo, em que o rendimento mínimo podia ser suprido por habilitações literárias mínimas ou, mais tarde (1878), também pela qualidade de chefe de família. Em qualquer caso, o universo dos votantes ficava muito aquém de abranger toda a população.
O poder executivo • O poder executivo residia no rei, que o exercia pelos seus ministros (ou "secretários") de Estado (art. 75). • Todas estas atribuições eram da responsabilidade do rei. • No entanto, sendo este inviolável e sagrado (art. 72), era necessário que alguém assumisse a responsabilidade política e até criminal dos seus actos. Era esta a finalidade do instituto da referenda ministerial (art. 102), que obrigava os ministros a referendar e assinar "todos os actos do poder executivo, sem o que não poderão ter execução". Esta assinatura responsabilizava o ministro pelo acto praticado, em termos de este nem sequer se poder eximir invocando a ordem real (art. 105). • Embora isto não transpareça da ordem de enumeração do art. 75 da Carta, o núcleo mais permanente das atribuições do executivo é o "governo" e, dentro deste, a "administração".
O poder legislativo. A Câmara dos Pares. • A Câmara dos Pares era, originariamente, constituída por pares vitalícios e hereditários, nomeados pelo rei, sem número fixo (art. 39). • Embora correspondesse a um modelo muito comum nos Estados europeus, a sua justificação era problemática. • Alguns autores - como o monárquico conservador Royer Collard - justificavam-na como "auxiliar do rei, para as ondas democráticas não abalarem constantemente o trono". • Outros - como François Guizot - relacionavam a sua existência com o facto de, na sociedade, alguns cidadãos terem sempre "uma maior autoridade do que os outros, pela riqueza, pelo esplendor de nascimento, pelos merecimentos ou pela reputação […] estes cidadãos formam uma ordem social distinta, e por isso deve-se-Ihes dar na constituição lugar que ocupam na sociedade".
O poder executivo. O poder executivo residia no rei, que o exercia pelos seus ministros (ou "secretários") de Estado (art. 75). Todas as suas atribuições eram da responsabilidade do rei. No entanto, sendo este inviolável e sagrado (art. 72), era necessário que alguém assumisse a responsabilidade política e até criminal dos seus actos. Era esta a finalidade do instituto da referenda ministerial (art. 102), que obrigava os ministros a referendar e assinar "todos os actos do poder executivo, sem o que não poderão ter execução". Esta assinatura responsabilizava o ministro pelo acto praticado, em termos de este nem sequer se poder eximir invocando a ordem real (art. 105); mas limitava o poder do rei, ao exigir a cooperação de um ministro. Embora isto não transpareça da ordem de enumeração do art. 75 da Carta, o núcleo mais permanente das atribuições do executivo é o "governo" e, dentro deste, a "administração".
Poder executivo ou poder governamental ? • As atribuições do governo vêm referidas nos §§ 3 e 4 (nomeação de magistrados e funcionários), 12 (expedição “de decretos, instruções e regulamentos adequados à boa execução das Leis” e 13 (“prover a tudo que for concernente à segurança interna [e externa] do Estado, na forma da Constituição”). • De facto, quem ler desatentamente a enumeração de funções do art. 75, ficará com a ideia de que o executivo se limitava a assegurar passivamente as clássicas funções de execução das leis e de defesa. Isto estava, porém, bem longe de ser verdade.
Poder executivo ou poder governamental ? • As outras atribuições do executivo eram: • Convocar as novas Cortes Gerais ordinárias; teoricamente, esta atribuição devia competir ao poder moderador] (§ 1.°); • Nomear ou prover dignidades eclesiásticas e nomear magistrados e demais empregos civis, políticos, militares e diplomáticos (§§ 2, 3, 4, 5 e 6); • Dirigir a política externa (§§ 7, 8 e 9); • Conceder Cartas de naturalização e distinções (§§ 10 e 11); • § 13.° - Decretar a aplicação dos rendimentos destinados pelas Cortes nos vários ramos da Pública Administração; • § 14.° - Conceder ou negar o beneplácito aos documentos eclesiásticos […] que se não opuserem à Constituição, e precedendo aprovação das Cortes, se contiverem disposição geral.
Poder executivo ou poder governamental ? • Uma vez passada a onda fisiocrática – que era, sobretudo, uma reclamação de liberdade cidadã perante a organização corporativa e, depois, perante o Estado de polícia, o Estado liberal continental – cujo protótipo (e não a excepção) é o Estado administrativo e empreendedor do I Império francês – encarregou-se da função de estabelecer a ordem e de garantir a estabilidade, o que não excluía um pronunciado dirigismo económico, social e político. • Neste sentido, a função dita “executiva” transformou-se progressivamente numa função autonomamente “activa” e politicamente dominante: quase todos os actos do Estado eram, na verdade, actos executivos, descontados os comparativamente raros actos legislativos e os – dispersos e de impacto essencialmente inter partes - actos judiciais. • Isto já era assim no momento em que a Carta surgiu. Mas, durante a sua longa vigência, sê-lo-á cada vez mais, nomeadamente quando o Estado se passa a ocupar de tarefas de fomento metropolitano e colonial, da educação e, até, de assistência e de regulação industrial. • Também na constituição inglesa haveria que distinguir uma “constituição teórica”, dominada pelo princípio dos checks and balances e uma “constituição prática”, em que ao governo vinham a caber atribuições materialmente legislativas.
Governo e parlamento • Segundo a lógica do parlamentarismo, vigorava o princípio da responsabilidade do governo perante as câmaras e a consequente necessidade de que ele reflectisse o equilíbrio das forças políticas no parlamento. • Este relevo do parlamento era, porém, mitigada pelo princípio monárquico ou “prerrogativa régia”, correspondente à existência do poder moderador, que dava uma certa margem de imposição de um executivo sobre o legislativo (governos sem apoio parlamentar, nomeação de pares para que o governo tivesse maioria na câmara alta, adiamento ou dissolução da Câmara dos Deputados). • O governo praticava actos normativos que cabiam, em teoria, ao poder legislativo: decretos “com força de lei” (ou decretos ditatoriais), a que as cortes raramente negavam a ratificação e que os tribunais costumavam aceitar como válidos; decretos emitidos pelo governo por delegação legislativa das cortes; regulamentos inovadores (a distinção entre “lei” e “regulamento” era difícil). • Para além dos actos normativos, o executivo tomava decisões casuístas, ao abrigo da lei ou no âmbito dos seus poderes discricionários. Desde cedo, que parte destes actos (os actos políticos) foram qualificados como insindicáveis quanto á sua legalidade. Isto queria dizer era que, doravante, também o governo podia propor finalidades ao Estado com aquela liberdade que, até então, fora privativa do legislador. O que constituía uma evolução político-constitucional notável.
A governamentalização do poder • O que agora se verifica, porém, é que nem o parlamento tem a possibilidade de fiscalizar toda a frenética actividade governativa, nem pode escapar aos poderes de condicionamento de que o governo dispõe, nomeando funcionários, gerindo a atribuição de benesses, lançando melhoramentos, apoiando empresas, concedendo serviços. • “O nosso governo parlamentar enferma de três vícios: Oexcessivo predomínio do poder executivo; a má constituição do parlamento; a defeituosa organização dos partidos políticos. O excessivo predomínio do poder executivo determina a subordinação do parlamento e tira-lhe toda a independência para fiscalizar os actos deste poder. Desse excessivo predomínio do poder executivo na nossa vida politica, é que resultam as frequentes ditaduras e delegações das funções legislativas no governo. É necessário reforçar o poder legislativo e para isso encontramos suficientes três disposições da proposta de 14 de marco de 1900:a reunião das cortes por direito próprio, a restrição da faculdade da sua dissolução e a não aplicação pelo poder judicial dos decretos, regulamentos ou ordens do governo que não sejam conformes às leis […] É certo que alguns escritores, como Poinsard, mostram-se favoráveis à aplicação entre nós do regímen simplesmente representativo, não atendendo afinal a que o mal de toda a nossa vida constitucional tem sido o excessivo predomínio do poder executivo, que aquele regímen ainda viria a fortificar […] (Marnoco e Sousa, Direito político […], cit.,, 386).
“A encarnação institucional do Estado” • Embora a Carta não estabelecesse o número de secretarias de Estado (ao contrário do que acontecia na Constituição de 1822 [Negócios do Reino, Justiça, Fazenda, Guerra, Marinha e Negócios Estrangeiros]), logo em 1834, D. Pedro II provê as seis secretarias de Estado tradicionais. Em 1852 (30.8), cria-se a Secretaria de Estado das Obras Públicas, Comércio e Indústria, correspondendo ao novo ênfase posto nas políticas de “fomento” do fontismo. Em 1870 (22.6), Saldanha cria, em ditadura, o Ministério da Instrução Pública (que é efémero). • Crescimento do aparelho de Estado, em termos financeiros e humanos.
Os partidos e a gestão dos funcionários funcionários • “A regeneração quando subiu ao poder em 1871 [… foi …] renovando o pessoal das secretarias, promovendo reformas, criando lugares, determinando aposentações, concedendo benefícios. O partido progressista entrando para o poder encontrou este estado de coisas que devia respeitar, e respeitaria do certo, se os beneficiados da regeneração cumprissem o seu dever, que era completa abstenção no acto eleitoral. Este dever foi-lhes recomendado expressamente com a devida cominação de penas. Como o dever não foi cumprido, os efeitos fizeram-se sentir. Nada mais natural; nada mais justo”, António Cândido Ribeiro da Costa, Discurso proferido na Câmara dos Senhores Deputados nas sessões de 17 e 18 de Fevereiro de 1880, Lisboa, 1880(p. 31). • O mecanismo está bem descrito. O fundo de postos burocráticos era utilizado pelos governos para distribuir benesses e para suscitar o empenhamento partidário dos beneficiados. O crescimento dos efectivos burocráticos potenciava ainda a importância política desta troca
Dependência dos funcionários • Quanto ao carácter dependente e precário das classes médias e inferiores do funcionalismo, estes funcionários seriam mal pagos, crivados de deduções (que atingiam, em média, 40 % dos proventos), apenas podendo sobreviver com base em benesses distribuídas superiormente (comissões, gratificações, horas extraordinárias, «serões» e abonos vários). Os próprios funcionários administrativos superiores (directores-gerais e chefes de repartição) estariam dependentes, pelos mesmos mecanismos, dos titulares das pastas (ibid.). Para além de que o ingresso e progresso na carreira se faziam, em geral, por mecanismos de escolha, garantindo novas fidelidades. • O funcionário nem sequer estava garantido contra um despedimento arbitrário ou «punitivo», pois se entendia que o funcionário não tinha direito ao lugar, podendo ser despedido por necessidades do serviço. • “Para se obter a melhor execução da lei, é necessário que os executores dela sejam responsáveis pelos seus actos: as garantias da sociedade e do individuo dependem mais da fiel execução da lei, do que da sua bondade absoluta. A boa execução da lei depende igualmente da competência, saber, zelo e honradez dos seus executores; e para que estes requisitos sejam uma realidade é indispensável que o ministro possa livremente escolher os subalternos, e demiti-los sem prévio julgamento; para que o chefe de cada ramo da administração seja responsável é necessário que ele possa tornar efetiva a responsabilidade dos seus subordinados” (António Pereira Jardim, Princípios de finanças [...], Coimbra, 1873).
Centro e periferia: pluralismo e descentralização. Em geral, estabelece-se como axioma que os poderes dos vários órgãos e agentes do Estado não são originários, como consequências naturais das suas funções ou estatuto, mas antes provenientes de um acto de delegação dos órgãos de soberania. A ideia de delegação constitui, doravante, facto, um princípio essencialmente contemporâneo de construção do aparelho de Estado. Esta nova ideia é visível quando confrontado com o discurso da descentralização, pois por aí se vê de forma particularmente clara a distinção entre o sistema pluralista do Antigo Regime, recusado, e o sistema monista descentralizado, agora proposto. • «O Estado, que tinha por base os municípios, era um corpo formado de membros desconexos, a que faltava a vida de relação, a unidade e a harmonia, que só podem provir da aplicação de princípios gerais estribados na justiça e no direito, e inspirados pelo interesse comum [...]. O municipalismo multi-forme, incoerente, individualista, privilegiado e bárbaro da idade media não era a descentralização administrativa, era o fraccionamento do Pais em circunscrições isoladas e às vezes hostis [...] era a negação de todos os princípios gerais de direito politico, civil e criminal, a condenação de toda a economia publica, a supressão de todo o viver nacional, o menosprezo de todos os interesses gerais, e o impedimento de todo o progresso e civilização da sociedade.» (Joaquim Thomaz Lobo d’Ávila, põe em destaque, nos seus importantes Estudos de Administração , 1874, p. 19). No entanto, a questão da centralização / descentralização não tinha uma única leitura. Foi antes uma questão polémica que percorreu todo o séc. XIX
Sociologismo, institucionalismo e descentralização • O institucionalismo dos finais do séc. XIX reforça as ideias descentralizadoras. Era por meio dela que se produziria uma repartição das funções da administração pública entre: 1. órgão da administração do Estado, centrais e locais; 2. autarquias territoriais; 3. autarquias institucionais; 4. particulares, por concessão. • São estas as influências que se fazem já sentir na obra de José Frederico Laranjo, quando afirma que, para que haja descentralização administrativa, é preciso que haja o exercício livre das atribuições dos corpos locais por eles mesmos, sem ingerência do governo, além da inspecção, para submeter os seus actos ao poder judicial, quando eles contrariem as leis. • De qualquer modo, e apesar de uma contínua corrente doutrinal anti-centralizadora – por vezes com alguma expressão legislativa, como nas reformas de 1836 e no Código administrativo de 1878 -, a estadualização da vida política não cessou de se acentuar. • A nova organização do poder governativo encontrava-se muito mais apta, apesar da debilidade das suas extensões periféricas, a desempenhar as funções de uma administração activa, pelo progresso das suas estruturas e organização no sentido de uma administração deste tipo
A redução dos poderes periféricos – os senhores de terras • Os senhorios não constituíam já, do ponto de vista político, o mais importante concorrente da coroa. Na verdade, no sistema político português do Antigo Regime, os senhores apenas gozavam da jurisdição intermédia. • Em 1792, extingue-se a jurisdição dos donatários - no sentido em que estes a tinham no Antigo Regime, isto é, como jurisdição intermédia -, embora saiam reforçados os seus poderes de nomear ou confirmar justiças locais, agora atribuídos genericamente, com o que se abole um anterior princípio de que a eleição das justiças era, em geral, dos povos. O poder senhorial perde em relação à coroa, mas ganha algo em relação ao poder municipal. • Finalmente, as constituições (Const. 1822, tit. V; Carta, tit. VI) e a reforma judiciária (Dec. nº 24, de 16 de Maio de 1832) acabam de vez com as jurisdições dos donatários.
A redução dos poderes periféricos – a Igreja • No Antigo Regime, a jurisdição eclesiástica incluía a sua autonomia de governo e a existência de um foro espiritual (que abarcava causas de natureza temporal). • Quanto à nomeação de bispos: os bispos estavam sujeitos à inspecção do governo gozando, em contrapartida, de honras, prerrogativas (v.g., eram conselheiros, pares, grandes do Reino, vogais natos, órgãos administrativos) e remuneração civil. • Quanto aos párocos, eles eram considerados, durante o regime constitucional monárquico, como empregados espirituais e civis, pelo que a sua nomeação resultava da apresentação régia. As suas funções espirituais são • o governo interno da sua comunidade paroquial; • vastas funções civis, abrangendo campos como as operações eleitorais, o recrutamento militar, a colaboração na administração civil das freguesisa • Quanto ao foro eclesiástico. Em 1821, foi abolido o Conselho-Geral do Santo Ofício e as devassas do ordinário. Em 1832, a Reforma Judiciária (Decreto n.º 24, de 16 de Maio) extingue o foro eclesiástico nas causas temporais ou de foro misto (artigo 117); mesmo nas espirituais, a competência punitiva dos bispos é limitada a penas espirituais, pelo Decreto de 19 de Julho de 1833.
A redução dos poderes periféricos – a Igreja • Em todo o caso, houve alguns domínios da jurisdição da Igreja que, durante todo o século XIX, se mantiveram intactos. • Um deles foi o da competência jurisdicional da Igreja em matéria de casamentos católicos, dominantes no País, que continuaram, mesmo depois do Código Civil, a ser regulados, no plano das relações pessoais, pelo direito canónico. • Outra reserva jurisdicional - agora ao nível do direito «vivido», que não do «direito oficial» - diz respeito ao papel das autoridades eclesiásticas (sobretudo os párocos, mas também as confrarias ou irmandades) como ordenadoras da vida colectiva e como mediadoras «informais» de conflitos nas comunidades rurais, sobretudo no Norte do País.