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Seminários de Ensino de Matemática. Faculdade de Educação - USP 6 abril 2010. Geometria, Desenho Geométrico e Arte – que confusão é essa!. Prof. Luiz Márcio P. Imenes imenes@uol.com.br. Sumário. Breve histórico e cenário atual Sobre Geometria Sobre Desenho Geométrico Sobre Arte
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Seminários de Ensino de Matemática Faculdade de Educação - USP 6 abril 2010
Geometria, Desenho Geométrico e Arte – que confusão é essa! Prof. Luiz Márcio P. Imenes imenes@uol.com.br
Sumário • Breve histórico e cenário atual • Sobre Geometria • Sobre Desenho Geométrico • Sobre Arte • Tentando organizar as idéias (e a prática)
1. Breve histórico e cenário atual Até fins dos anos 60, desenho era disciplina escolar obrigatória. No antigo ginásio (6º ao 9º anos do atual ensino fundamental), as aulas de desenho incluíam construções geométricas.
No curso colegial (atual ensino médio), parte dos alunos estudava geometria descritiva e perspectiva. • A geometria era estudada nas aulas de matemática. • Nessa época, como regra, não havia uma disciplina de arte. • No início dos anos 70, desenho deixou de ser disciplina obrigatória. Simultaneamente, ocorreu progressivo abandono da geometria.
Desde os anos 90, busca-se trazer de volta a geometria. Em um bom número de escolas de ensino fundamental, para garantir que ela chegue aos alunos, usa-se o artifício de especificar, no horário das aulas, uma ou duas delas para geometria. Um professor ensina matemática; outro, geometria. (Tal designação parece sugerir que geometria não é parte da matemática!) • Em alguns casos, essa geometria é designada como desenho geométrico (às vezes, ministrado por professor de arte).
Há escolas em que um professor de matemática ensina aritmética, álgebra, geometria etc. e elas oferecem, ainda, aulas de desenho geométrico. • Há casos em que a geometria é trabalhada pelo professor de matemática mas certos tópicos, como simetria, vistas e perspectiva ficam por conta do professor de arte. • Relato: o caso do aluno que sugeriu simplificar a construção da bissetriz. • Tal cenário, um tanto confuso, parece fruto de concepções equivocadas sobre geometria, desenho geométrico e arte. • Para justificar essa afirmação é preciso alguma caracterização, ainda que simplificadora, desses campos.
2. Sobre Geometria • Na escola básica, a aritmética costuma ser entendida como um campo da matemática dedicado aos números e às operações enquanto o campo da geometria ocupa-se do estudo das formas. • Os PCN, bem como outros documentos publicados a partir de fins do século passado (Standards – NCTM, 1989; Estrutura da avaliação – PISA, 2006), propõem a designação espaço e forma no lugar de geometria. Eles incluem o estudo de representações espaciais sobre o plano (vistas, corte, perspectiva), deslocamentos, itinerários; dão atenção à percepção do espaço, à localização espacial (leitura de mapas e plantas) etc.
Tal orientação parece contemplar idéia de H. Freudenthal. Referindo-se à geometria, afirma que ela permite à criança “compreender o espaço em que vive, respira e se move; o espaço que a criança deve aprender a conhecer, explorar e conquistar, de modo a poder aí viver, respirar e mover-se melhor”. (Citado por Eduardo Veloso, em Geometria – Temas actuais, Instituto de Inovação Educacional, Lisboa, 1998, p. 15)
Durante muitas décadas, ensinou-se geometria tendo como referência básica Os elementos, de Euclides. Já há algum tempo, no ensino fundamental, considera-se essa abordagem inadequada. • As orientações atuais para o trabalho com geometria recomendam forte conexão com outros campos da matemática, com situações cotidianas, com outras disciplinas (arte, biologia, geografia etc.) • São recomendadas abordagens experimentais acompanhadas, sempre que conveniente, de justificativas teóricas; também são sugeridas sequências dedutivas localizadas.
Abordagens experimentais levam a diferentes tipos de construções que usam recursos variados: dobraduras; construções com palitos, com canudos de tomar suco; construções em malhas geométricas (quadriculadas, triangulares); uso de embalagens; construções com barbante; com instrumentos de desenho (esquadro, transferidor, régua, compasso, pantógrafo, escala etc.); com programas de geometria dinâmica; com tesoura, cartolina e cola etc.
3. Sobre Desenho Geométrico • “A ciência grega tinha raízes numa curiosidade altamente intelectual que é frequentemente contrastada com o utilitarismo imediatista do pensamento pré-helênico. ... Conta-nos Plutarco que, enquanto Anaxágoras esteve preso ocupou-se com uma tentativa de quadrar o círculo. Aqui temos a primeira menção de um problema que iria fascinar os matemáticos por mais de 2 000 anos. Não há outros detalhes quanto à natureza do problema ou às regras que o condicionam. Mais tarde ficou entendido que o quadrado procurado de área exatamente igual à do círculo, deveria ser construído só com régua e compasso.” (C. B. Boyer, História da Matemática, Edusp/Edgard Blucher, 1974, p. 48)
Deve-se acrescentar que “a régua só poderia ser utilizada para traçar retas e nunca como instrumento de medição” (régua sem escala). (Roberto Ramalho, Construções geométricas com régua e compasso, UFPE/CECINE, 1984, p. 2) • Outros dois problemas famosos, o da duplicação do cubo e o da trissecção do ângulo, estavam condicionados às mesmas regras. • O desenho geométrico é um campo da matemática com raízes na Grécia Antiga que bem pode ser caracterizado como “jogo de natureza intelectual”.
No desenho geométrico original, “à grega”, a resolução de problemas tem duas etapas: • construir o que se pede; • justificar a construção, isto é, demonstrar que o objeto construído, de fato, atende às exigências do problema. • A construção deve respeitar “as regras do jogo”. • A justificativa se faz com base nos resultados (teoremas) da geometria plana.
Ora, se no desenho geométrico a justificativa da construção baseia-se nos resultados da geometria plana, entende-se que esta precede aquele. Ou seja, o desenho geométrico supõe conhecida a geometria plana. • Em nossas escolas, o que tem sido praticado com o nome de desenho geométrico, em geral, não respeita as regras do jogo. Além disso, as construções não costumam ser acompanhadas de justificativas. Apresentam-se receitas. • Portanto, o que se pratica não é o desenho geométrico em seu sentido original.
Para o aluno, tais receitas carecem de sentido. Ele percebe que há maneira mais sensata para se encontrar o ponto médio de um segmento de reta (usando a escala da régua); ou para traçar a bissetriz de um ângulo, ou para se dividir a circunferência em 5 partes iguais (usando transferidor).
4. Sobre Arte • O volume 6 dos Parâmetros Curriculares Nacionais relativos às séries iniciais do ensino fundamental é dedicado à disciplina de Arte. Na p. 15, lê-se: “A educação em arte propicia o desenvolvimento do pensamento artístico, que caracteriza um modo particular de dar sentido às experiências das pessoas: por meio dele, o aluno amplia a sensibilidade, a percepção, a reflexão e a imaginação. (...) A segunda parte (do documento) busca circunscrever as artes no ensino fundamental, destacando quatro linguagens: Artes Visuais, Dança, Música e Teatro.”
Arte é arte! Trata-se de disciplina com vida própria, que, é claro, deve ser abordada em conexão com todas as demais. • Suas conexões com geometria ou desenho geométrico não podem servir para confundi-la com esses campos. • Um professor de matemática não tem formação para ensinar arte, nem um professor de arte tem formação para ensinar geometria ou desenho geométrico.
5. Tentando organizar as idéias (e a prática) • A disciplina de arte, com vida própria, precisa ser valorizada pela escola e pela sociedade. • A geometria (pensada como espaço e forma) deve ser entendida como campo da matemática e tratada em conexão com outros campos da matemática e com outras disciplinas, entre as quais destaca-se arte. • O trabalho com geometria deve envolver diversos tipos de construções, em que são usados instrumentos, recursos e materiais variados, sem limitação.
Tal trabalho construtivo não pode ser confundido com o desenho geométrico “à grega”. • A beleza e o desafio do jogo intelectual que é o desenho geométrico reside em suas poucas e rígidas regras. O trabalho construtivo que se propõe dentro da geometria é o oposto disso: nele, não há regras limitadoras. • Eventualmente, podem-se propor problemas de construção onde só vale usar régua (sem escala) e compasso; ou só régua e esquadro.
Bem, e o desenho geométrico “à grega”, onde fica? • Uma sugestão: no curso de licenciatura em matemática. • Uma indagação: na escola básica, para todos os alunos, ele seria prioritário hoje?