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Autonomia econômica da mulher - desafio para sua cidadania Ana Rocha Praia Grande – SP : 10 a 12 junho de 2011.
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Autonomia econômica da mulher - desafio para sua cidadania Ana Rocha • Praia Grande – SP : 10 a 12 junho de 2011
Se concordarmos com a idéia, e eu concordo, de que o trabalho é fundamental para a formação do ser social, isso também vale para as mulheres. A esfera do trabalho privado é invisível, o trabalho no espaço público é visível e valorizado socialmente. Já dizia a filósofa Hanna Arendt: “O homem privado não se dá a conhecer, e, portanto, é como se não existisse. O que quer que ele faça permanece sem importância ou conseqüência para os outros”.
A volta da mulher ao espaço público, ao mercado de trabalho formal, significou um grande avanço. Mas essa volta é marcada pela desigualdade, pela sobrecarga doméstica e o cuidado com as pessoas. Por isso com muita razão afirma Helena Hirata: “Enquanto a divisão do trabalho doméstico for assimétrica, a igualdade será uma utopia”. • E eu diria que além de políticas públicas, são necessárias medidas educativas transformadoras e mudanças nos padrões existentes quanto aos papéis exigidos para homens e mulheres. • Como superar positivamente o estereótipo do provedor homem e da cuidadora mulher, num mundo real em que homens e mulheres são provedores e cuidadores. Sendo que a mulher passou a ser provedora, mas os cuidados continuam de sua maior responsabilidade.
A subjetividade da mulher atual está povoada de culpa, de múltiplas exigências, do conflito diante de escolhas impossíveis, da possibilidade de auto-afirmação à custa de sacrifícios pessoais. A síndrome de pânico simboliza hoje a estafa da mulher moderna que luta por seu reconhecimento público, mas que não quer abrir mão de sua felicidade pessoal, do direito a relações afetivas prazeirosas, do direito à maternidade. • A tentativa desse equilíbrio tem acarretado um custo pessoal muito alto para as mulheres. Como preservar o direito à autonomia econômica e ao mesmo tempo preservar o prazer da relação amorosa e filial, o espaço em família, baseado na afetividade? As mulheres persistem na busca de novos caminhos para uma vida feliz. A auto-afirmação e a afetividade são hoje as duas faces da moeda da felicidade.
Mas novos horizontes se abrem quando vamos avançando no entendimento de que a solução dessa equação não pode ficar na mão das mulheres, mas que esta é também uma responsabilidade do estado e da sociedade. • Atravessamos o furacão neoliberal com a redução do papel do estado na economia e nas políticas públicas, e vivemos o turbilhão atual da crise do capitalismo, sobretudo nos países mais ricos, com o aumento do desemprego, das guerras. Como afirmou Helena Hirata, “A crise bancária, a crise econômica propriamente dita e a crise social, redundaram em movimentos de precarização e de desemprego que afetaram desigualmente a mão de obra masculina e feminina. As mulheres são majoritárias nas situações de desemprego. E à precarização do trabalho das mulheres se soma a precarização familiar.
As conseqüências da privatização, da diminuição da proteção social, da redução dos serviços públicos, significaram não apenas a diminuição do trabalho decente para mulheres e homens, mas também a exploração crescente do trabalho gratuito das mulheres na esfera doméstica e familiar”. Para a economista Maria da Conceição Tavares, a crise de 2008 trouxe conseqüência basicamente para os homens, porque foi uma crise industrial e da construção civil, onde o emprego é majoritariamente masculino. • Mas agora, com essa estagnação geral, particularmente na Europa, as mulheres vão ser atingidas, porque serviços e comércio, atividades que ocupam um enorme contingente feminino, serão provavelmente atingidas. E também o salário. Os salários na Europa estão praticamente congelados. Como já havia diferenças salariais entre homens e mulheres, obviamente a pancada é sempre maior nos mais fracos. • Um caso que ilustra essa situação é a ação coletiva, a maior da história, que pode beneficiar 1,6 milhão de trabalhadoras. Trata-se de ação de trabalhadoras da Walmart, dos Estados Unidos, a maior rede varejista do mundo. O advogado Brad Seligman, que concebeu e apresentou a ação, diz que a média salarial de uma mulher no Walmart é de US$ 13 mil – cerca de US$ 1.100 abaixo da masculina. Além disso, o processo indica que as mulheres estão subrepresentadas na rede, com 14% das gerências e 80% dos cargos inferiores ( O Globo de 28-3-2011).
Autonomia econômica – uma prioridade • A resistência a tudo isso está presente em países da América Latina, onde dominam governos populares. Ainda segundo a economista Conceição Tavares, o mundo está desequilibrado, não há convergências nem no crescimento, nem no emprego e nem nos programas sociais. Como a América Latina se saiu relativamente bem nessa crise, dependendo dos governos nacionais e da política de união e de apoio recíproco da América do Sul continuar, temos chances de uma integração maior em infraestrutura, por exemplo.
No Brasil, A vitória de Dilma, foi a vitória de um projeto que aponta para o avanço democrático, da soberania nacional, do desenvolvimento e da geração de emprego e renda. Nesse sentido ganha relevância o discurso da Presidenta eleita de erradicação da pobreza. Numa lógica de que o conjunto de políticas adotadas para alcançar os objetivos de desenvolvimento influencia de maneira preponderante o destino das pessoas que vivem em situação de pobreza e, dessa forma, das mulheres. • Homens e mulheres vivenciam a pobreza de forma diferenciada. As desigualdades de classe, gênero e raça são eixos estruturantes da matriz da desigualdade social no Brasil. As políticas de crescimento econômico devem considerar essas diferenças. Se o trabalho é via de superação da pobreza, a questão da igualdade é fundamental ao trabalho decente. É nesse sentido que o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento Econômico) não pode perder o olhar de gênero em suas ações.
E é nesse veio o compromisso de Iriny Lopes, Secretária Especial de Políticas para as mulheres (SPM) do governo eleito, que além de defender ações transversais com os ministérios e governos estaduais e municipais para garantir a concretização das ações do governo, destaca a necessidade de priorizar “desenvolver e implementar ações que garantam de forma permanente a autonomia econômica da mulher, que amplie e qualifique sua participação nos espaços de poder, no mundo do trabalho e dê visibilidade às suas expressões culturais e identidade.” • Essa prioridade ganha relevância num país como o Brasil onde a miséria e a pobreza atingem milhões, inclusive as mulheres que sofrem com a ausência de qualidade de vida (moradia, transporte, serviços básicos essenciais de qualidade). E como diria Dedeca, são as mulheres com menor remuneração que enfrentam em maior grau a dupla jornada de trabalho.
É fato que no Brasil houve um aumento significativo da participação feminina no mercado de trabalho nos últimos 20 anos. Se em 1995, 54,3% das mulheres de 16 anos ou mais se encontravam ativas, ou seja, empregadas ou à procura de empregos. Esse índice chegou a 58,5% em 2008. Mas se o nível de atividade das mulheres aumentou ainda é bastante inferior ao verificado para os homens (81,7%, em 2008). • Por outro lado, a taxa de desemprego masculino foi de 5,2% em 2008, a feminina atingiu 9,6%, o que representa um contingente de 1,2 milhão de mulheres desempregadas em comparação aos homens. Além disso, dados do PNAD informam a cada ano que as diferenças salariais permanecem, em média a remuneração feminina corresponde a 70% da masculina. Bem como o acesso a profissões qualificadas ainda é dificultado para as mulheres. • Por outro lado, o trabalho informal ainda é maior entre as mulheres. Ou seja, 52% das trabalhadoras estão na informalidade. Significa dizer que mais da metade das trabalhadoras não tem direito à proteção social. O fator das responsabilidades familiares recaírem mais sobre as mulheres reforçam a segregação ocupacional feminina, para atividades precarizadas que são mais flexíveis, de tempo parcial, ou realizadas a domicílio. O investimento público é fundamental para enfrentar essa situação, não pode ser responsabilidade da mulher ou de sua escolha pessoal. O serviço público tem de enfrentar a questão das creches e escolas de tempo integral.
O que fazer? - o papel da UBM e dos movimentos sociais • Nesse contexto, o controle social das ações do governo é fundamental ao avanço. A UBM em articulação com os demais movimentos sociais, sobretudo os sindicatos devem se mobilizar no sentido de garantir que o PAC se constitua realmente numa ferramenta estratégica de articulação de medidas de desenvolvimento econômico com ações pautadas na igualdade de gênero (incluindo a perspectiva étnico-racial), que favoreçam as trabalhadoras e assegurem-lhes o alcance da autonomia com melhor qualidade de vida. • Ações coletivas como a das trabalhadoras da Walmart contra a desigualdade salarial é um exemplo de luta para as trabalhadoras, uma pressão coletiva contra as empresas.
A luta pela ampliação do acesso das mulheres ao mercado de trabalho permanece. Acompanhada da exigência de espaços de qualificação. • Os editais de concurso de profissões tradicionalmente masculinas precisam indicar a participação das mulheres. • A exigência de acesso a crédito para o empreendedorismo feminino. • A luta pela criação de equipamentos sociais que contribuam para ampliar o tempo disponível das mulheres. • Lutar por políticas de previdência social inclusiva para as mulheres. • Lutar pelo acesso das mulheres à documentação civil. • Lutar contra qualquer relação de trabalho discriminatória em razão de sexo, raça-etnia, orientação sexual, geração ou deficiência com equidade salarial e no acesso a cargos de direção
Enfim, a UBM com sua visão emancipacionista, de que a total superação das desigualdades só será possível em outro sistema social, o socialismo, entende o papel da mobilização das mulheres junto com os demais movimentos sociais no sentido de fazer avançar as conquistas democráticas e o desenvolvimento econômico da nação no atual contexto político do Brasil. Só nesse rumo do avanço político, econômico e social haverá ambiente favorável à caminhada das mulheres rumo à liberdade, ao pleno emprego, ao fim da sobrecarga doméstica, a um mundo de igualdade. • Ana Rocha é da Coordenação Nacional do Fórum Nacional sobre a Questão da Mulher do PCdoB. É Presidente Estadual do PCdoB-RJ
BIBLIOGRAFIA • - Lavinas, Lena, Mercado de Trabalho e Segregação de Gênero: como vencer a inércia. Jornal dos Economistas, março de 2010, Rio de Janeiro. • - OIT –Escritório do Brasil - Igualdade de Gênero e Raça no Trabalho: Avanços e Desafios, 2010. • - Rocha, Ana - Tese de Mestrado: “Impacto das Condições de Trabalho e das Responsabilidades Domésticas nas condições de vida das Trabalhadoras da FAET”, Rio, UERJ, 2009. • - Secretaria de Políticas para as Mulheres; Mulheres Brasileiras, Políticas e Dados, julho de 2010; Observatório de Gênero: Tema: Autonomia Econômica, Empoderamento e Inserção das Mulheres no Mercado de Trabalho, julho de 2010, Tema: Trabalho e Gênero, dezembro de 2010.
Alguns dados para refletir • - O PNAD 2008 : as mulheres totalizam 45,6% da populacao economicamente ativa • - 34% das mulheres que compoem a PEA tem emprego vulneraveis:domesticas, não remuneradas ou de consumo familiar enquanto so 9% dos homens nessa situacao • -
mesmo com maior escolaridade as mulheres tem rendimento medio inferior ao dos homens - em 2009 – as mulheres recebiam 70% do rendimento medio do homem, e as negras metade das brancas. - dos que cursaram faculdade, 30% dos homens e apenas 10% das mulheres tinham rendimentos superiores a 10 salarios minimos, em 2007 - IPEA 2009 : elevada contribuicao dos rendimentos femininos na renda das familias brasileiras- de 30,1% em 1992, para 40,6% em 2007 - Dedeca: apesar de ganharem menos que os homens, a contribuicao feminina é fundamental para a diminuicao dos índices de pobreza, = Essa contribuicao reduz gastos com saude e o cuidado das criancas e de seus membros de terceira idade - para os empresarios: homem provedor, mulher cuidadoras as mulheres são forca de trabalho secundaria
- Em 2010: As mulheres ocupadas despendiam em media 20,9 horas semanais e os homens 9,2 com este trabalho. • = repartem tarefas com outras mulheres • - O circulo vicioso da desigualdade gerada pela obrigatoriedade social do trabalho domestico, especialmente o de cuidado, feito pelas mulheres, explica em grande medida a sua ausencia na politica e nos espacos de decisao em geral. • - As mulheres continuam a ser super-representadas entre os pobres e sub-representadas na politica • - articular a vida profissional com a privada para homens e mulheres com creches e escolas integrais • - Contar com ingressos proprios é indispensavel e indica nível de autonomia das pessoas, As desigualdades geram a falta de autonomia das mulheres. A redistribuicao do trabalho total (produtivo, reprodutivo, remunerado e não remunerado) ainda é um horizonte, a ser alcancado.