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Acadêmico Pedro Henrique Souza Reis. 8º período em graduação em medicina. Funorte liga acadêmica de clínica médica Caso clínico. Relato.
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Acadêmico Pedro Henrique Souza Reis. 8º período em graduação em medicina. Funorteliga acadêmica de clínica médicaCaso clínico
Relato • Mulher, negra, 44 anos, dá entrada na sala de emergência acompanhada da filha, que relata sudorese intensa e ansiedade há 12h sem melhora com repouso. A paciente refere que está apresentando esses sintomas há 2 meses, associados a outros, e que apresentou piora significativa há 1 semana, quando iniciou quadro de tosse, dispneia e febre. Nega ter tido cefaleia.
Exame físico inicial: paciente agitada, pele fria, sudorese profusa, orientada taquidispneia com tremor de repouso. • Ectoscopia: hipocorada, desidratada, anictérica, cianótica e febril (38,5º C), edema de MMII. • SCV: PA: 150 x 100 mmHg, ritmo irregular, bulhas hiperfonéticas, FC de 100 bpm, sem sopros.
SR: FR: 35 irpm, sat. de oxigênio de 88% e estertores crepitantes e roncos em terço inferior do hemitórax direito. • Exame neurológico: hiper-reflexia generalizada. • Administrado oxigênio por cateter nasal com 1L/min de fluxo e pedido exames.
HDs • Hipóteses, exames a pedir.
Exames • ECG: FA com resposta ventricular de 98 bpm. • Iniciada hidratação EV com SF 0,9% com melhora do mal-estar após 0,5 l de solução. • Rx: discreta cardiomegalia com condensação em base direita sem derrame pleural e sinais de congestão pulmonar leve.
Iniciada ATB e colhidas culturas de sangue, urina e escarro. • Após estabilização inicial, filha é chamada e refere que tudo se iniciou há 2 meses com diarreia e taquicardia; e na ocasião, procurou outro serviço onde foi realizada hidratação EV, com alta após melhora parcial dos sintomas. • Após 1 semana, apresentou tremores exacerbados em membros superiores e intolerância ao calor, mas como mora em região tropical, não deu importância.
A partir de então, refere não conseguir dormir e ter emagrecido 20 Kg, comendo a mesma quantidade habitual.
Outros exames • Leucócitos: 15.000 (12% de bastões e 71% de segmentados); • Aumento discreto de FA, TGO e TGP. • Glicemia: 112; • Potássio: 3. • Cálcio ionizado: 1,45 VR: 1,12 a 1,35 mmol/l. • TSH < 0,05 (VR: 0,34 A 5,60 MICRO UI/ML). T4 livre: 2 (VR: 0,87 a 1,56ng/100 ml); • VHS: 120. PCR: 7,3.
Filha refere que o marido notou um aumento cervical progressivo e discreto há algum tempo. Nega uso de medicações, tabagismo, etilismo ou drogas ilícitas. Trabalha como camelô, vendendo café da manhã.
Tireoide • Cintilografia: áreas de hipercaptação multifocal na glândula com supressão do restante do parênquima, sugestivo de tecido autonômo. • USG: glândula com aumento de volume, heterogênea, hipoecogênica, com múltiplas formações nodulares, medindo aproximadamente 3,5 cm no maior diâmetro, com fluxo intenso periférico e central. Ausência de linfonodomegalias cervicais.
Diag final: • Crise tireotóxica por bócio multinodular tóxico.
Conduta • Propiluracil: ataque de 600 a 1000 mg, seguido de 200 a 300 mg a cada 6 ou 4h. • Sobrecarga de iodo: iodeto de potássio (5 gotas a cada 6/6h (via oral ou retal); • Propranolol EV 1mg. • Hidrocortisona: dose de ataque de 300 mg seguida de 100 mg de 6/6h. • Causa de base.
CRISE TIREOTÓXICA • A crise tireotóxica (CT) é uma entidade clínica rara, responsável por 1% a 2% das admissões hospitalares por tireotoxicose. • Representa exacerbação grave de um estado hipertireoideano prévio. • As taxas atuais de mortalidade variam entre 7% a 28%.
ETIOLOGIA • A principal etiologia é a doença de Graves. • Podendo ocorrer no bócio uninodular ou multinodular tóxico. • Ainda pode ser vista em indivíduos cujo hipertireoidismo não fora diagnosticado.
PATOGENIA FATORES PRECIPITANTES Condições associadas com o rápido aumento nos níveis dos hormônios tireoideanos: • Cirurgia de tireóide • Suspensão do tratamento com drogas antitireoideanas • Iodoterapia radioativa • Palpação vigorosa da tireóide • Traumatismo na região cervical • Uso de contrastes iodados • Uso de doses excessivas de L- tiroxina
CONDIÇÕES ASSOCIADAS COM DOENÇA NÃO- TIREOIDEANA AGUDA OU SUBAGUDA • Infecção • Procedimentos cirúrgicos diversos • Acidente vascular cerebral • Tromboembolismo pulmonar • Parto • Cetoacidose diabética • Estresse emocional • Hipoglicemia • Trauma • Insuficiência cardíaca congestiva • Intoxicação por salicilatos
MECANISMOS • Ainda não são bem conhecidos. • Aumento súbito dos níveis de hormônios livres circulantes poderia ser responsável pelo desencadeamento da CT (diminuição da ligação do T4 com a globulina ligadora da tiroxina). • O número de sítios ligantes para as catecolaminas está aumentado. • Também pode ser explicada pela liberação de citocinas e distúrbios imunológicos agudos causados pelas condições precipitantes.
DIAGNÓSTICO • O diagnóstico é basicamente clínico. • Quadro clínico: HIPERTERMIA TAQUICARDIA ARRITMIA TREMORES SUDORESE AGITAÇÃO NÁUSEAS VÔMITOS DIARRÉIA INSUFICIÊNCIA CARDÍACA DELÍRIOS-PSICOSE
FORMAS CLÍNICAS ATÍPICAS • Coma • Estado epiléptico • Apatia • Estupor • Infarto cerebral não-embólico • Confusão mental • Insuficiência adrenal ou hepática aguda • Abdomen agudo
DIAGNÓSTICO • O índice de Burch e Wartfosky pode se constituir em um guia útil, facilitando o pronto reconhecimento de um quadro grave de tireotoxicose.
CRISE TIREOTÓXICA Escores: • > 44: altamente sugestivo de tempestade tireoideana; • 25-44: sugestivo de tempestade iminente; • <25: dificilmente será tempestade tireoideana.
ACHADOS LABORATORIAIS • Os valores de T3 e T4 totais não diferem daqueles encontrados nos pacientes com hipertireoidismo não-grave, porém, as frações livres desses hormônios estão geralmente aumentadas. • Os níveis de TSH estão suprimidos, exceto nos raros casos de CT por secreção inadequada de TSH. • Não existe um valor dos hormônios tireoideanos acima do qual a CT invariavelmente ocorra.
ACHADOS LABORATORIAIS • Hemograma: discreta leucocitose com pequeno desvio para esquerda. • Os eletrólitos (sódio, potássio, cálcio, fósforo) apresentam-se, em geral, dentro dos valores normais. • Pode ocorrer discreta hipercalcemia. • As provas de função hepática estão geralmente alteradas.
TRATAMENTO • O paciente deve ser monitorizado, preferencialmente, na unidade de terapia intensiva. • O início do tratamento é sempre baseado no quadro clínico, não se deve esperar a confirmação laboratorial, pois a demora no início do tratamento pode ser fatal.
MEDIDAS GERAIS DE SUPORTE Redução da febre • A temperatura deve ser mantida <39 C • Podem ser utilizadas compressas e toalhas úmidas • Paracetamol, dipirona e se necessário meperidina. • NÃO USAR ASPIRINA! Esta droga compete com o T3 e o T4 na sua ligação com as globulinas transportadoras (TBG) , o que elevaria os níveis livres desses hormônios na circulação.
CORREÇÃO DOS DISTÚRBIOS HIDROELETROLÍTICOS • A reposição cuidadosa de fluidos (colóides ou cristalóides) deve ser feita nos casos de hipotensão. • A solução glicosada pode ser utilizada com os seguintes objetivos: suporte nutricional, redução do catabolismo protéico e reposição dos estoques de glicogênio hepático.
MEDIDAS GERAIS • Oxigênio (sob cateter nasal) • Diuréticos e Digitálicos podem ser necessários nos casos de falência cardíaca. • Tratamento dos fatores desencadeantes. Deve-se rastrear focos infecciosos através de culturas de sangue, urina, escarro e raio X de tórax. O uso de antibioticoterapia empírica é controverso. • Se for necessário sedação, o fenobarbital é a droga de escolha, pois acelera o metabolismo periférico e inativa o T3 e T4.
CONTROLE DO HIPERTIREOIDISMO - Bloquear a síntese hormonal intratireoideana • Propiltiouracil (PTU): 200 mg 4/4h ou 6/6h (VO ou SNG) ou Metimazol: 20 - 30 mg 6/6h ou 8/8h • O PTU é preferível ao metimazol porque possui ação adicional de inibir a conversão periférica de T4 em T3.
LENTIFICAR A LIBERAÇÃO DE T3 E T4 • 2 horas após: • Iodeto: solução de lugol, 10 gotas 8/8h. • Solução saturada de iodeto de potássio 5 gotas 6/6h ou 8/8h. • (A inibição da proteólise do colóide e consequente não liberação de T3 e T4 para a corrente sanguínea pode ser obtida com o uso do iodo inorgânico (efeito de Wolff-Chaikoff), porém, esse efeito paradoxal é transitório, sendo seu uso restrito à fase aguda grave).
LENTIFICAR A LIBERAÇÃO DE T3 E T4 • É essencial que o tratamento com iodo não seja iniciado até que um bloqueio efetivo da síntese hormonal tenha sido estabelecido com o uso dos antitireoideanos (geralmente após 1 a 2 horas após a sua administração). • Pacientes com história de alergia ao iodo podem ser tratados de forma alternativa com carbonato de lítio: 300 mg 6/6h VO (manter litemia em 0.1 mEq/L).
BLOQUEAR OS EFEITOS ADRENÉRGICOS • Propranolol VO: 40-80 mg de 4/4 ou 6/6h, EV: inicial 0.5 a 1 mg (em 10 min) – seguido de 1- 3mg a cada 3h, sob monitorização cardíaca contínua. OBS: Devem ser evitados nos casos graves de insuficiência cardíaca. • Os β- bloqueadores inibem a ação periférica das catecolaminas e também podem bloquear a conversão periférica do T4 em T3.
BLOQUEAR OS EFEITOS ADRENÉRGICOS • O Esmolol, agente β-1 agonista seletivo de curta ação, tem sido usado com sucesso na CT, principalmente para aqueles pacientes em que os agonistasβ-2 podem ser deletérios (ex. Asma), na dose de 250-500μg/Kg/min e sucessivamente com infusão contínua de 50-100μg/Kg/min. • Outra opção quando o propranolol for contra-indicado, são os bloqueadores dos canais de cálcio como o Diltiazem.
INIBIR A CONVERSÃO PERIFÉRICA DE T4 EM T3 • Glicocorticóides: - Hidrocortisona 300 mg em dose de ataque, seguido de 100 mg 6/6h ou - Dexametasona, 2mg EV 6/6h. • A meia-vida dos glicocorticóides é marcadamente reduzida na tireotoxicose severa, então o suporte da adrenal pode ser insuficiente. • Após melhora do quadro (geralmente após 1 semana), os glicocorticóides devem ser retirados gradualmente.
Reduzir a quantidade de hormônios circulantes • Plasmaférese, exsanguineotransfusão, diálise peritoneal. • A colestiramina ou colestipol (20-30g/d) podem ser utilizados, pois se ligam ao T4 no intestino durante a circulação entero-hepática, e aumentam a sua excreção.
Referências: • MEDEIROS-NETO, Geraldo. Bócio multinodular.ArqBrasEndocrinolMetab [online]. 1998, vol.42, n.4, pp. 286-291. • TAMBASCIA, Marcos A.. Bócio multinodular tóxico: aspectos clínicos e conduta.ArqBrasEndocrinolMetab [online]. 1998, vol.42, n.4, pp. 283-285. • ACCETTA, Pietro et al.Tireoidectomia total nas doenças benignas da tireóide. Rev. Col. Bras. Cir. [online]. 2011, vol.38, n.4, pp. 223-226. • GRAF, Hans. Doença nodular de tireóide.ArqBrasEndocrinolMetab [online]. 2004, vol.48, n.1, pp. 93-104. • GOLBERT, Lenaraet al. Aumento da expressão do proto-oncogeneras no bócio multinodular: possível envolvimento na patogênese.ArqBrasEndocrinolMetab [online]. 2003, vol.47, n.6, pp. 721-727. • FRIGUGLIETTI, Celso U.M.; LIN, Chinand KULCSAR, Marco A.V..Tireoidectomia total para bócio multinodular.ArqBrasEndocrinolMetab [online]. 2003, vol.47, n.5, pp. 558-565.