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JORGE, UM BRASILEIRO

JORGE, UM BRASILEIRO. Oswaldo França Júnior. Jorge um brasileiro Oswaldo França Júnior. Oswaldo França Júnior (1936-1989) nasceu em Serro, MG. Antes de se tornar escritor, foi coronel aviador. Oswaldo foi expulso da Aeronáutica por ter sido apontado como subversivo pela revolução de 64 .

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JORGE, UM BRASILEIRO

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  1. JORGE, UM BRASILEIRO Oswaldo França Júnior

  2. Jorge um brasileiroOswaldo França Júnior • Oswaldo França Júnior (1936-1989) nasceu em Serro, MG. • Antes de se tornar escritor, foi coronel aviador. • Oswaldo foi expulso da Aeronáutica por ter sido apontado como subversivo pela revolução de 64.

  3. Jorge um brasileiroOswaldo França Júnior • Então, movido pela necessidade de sobrevivência e de sustentar sua família, tornou-se escritor. • Vale lembrar que França, ainda na ativa militar, publicou artigos nos jornais da Arma. • Então, desempregado e preocupado com sua família, reuniu um volume de contos e foi tentar a sorte na Editora do Autor, do Rio de Janeiro, então comandada por Rubem Braga e Fernando Sabino.

  4. Jorge um brasileiroOswaldo França Júnior • Rubem Braga gostou de seus textos, mas alegou que “conto não vendia” e perguntou se ele não teria um romance na gaveta. • Não tinha, mas disse que sim e se apressou a voltar a BH, onde escreveu, em poucos meses, O viúvo, que foi publicado em 1965.

  5. Jorge um brasileiroOswaldo França Júnior • A alta qualidade dos originais de Jorge, um brasileiro, sua segunda obra, rendeu a Oswaldo França, juntamente com Jorge Amado e Guimarães Rosa, o maior prêmio literário do Brasil em 1967, o Walmap. • Oswaldo França Júnior publicou 13 romances – sendo que Jorge, um brasileiro foi roteirizado e filmado pelo cineasta Paulo Tiago, bem como serviu de inspiração para a série global “Carga pesada”.

  6. Jorge um brasileiroOswaldo França Júnior • Em entrevista ao repórter Geneton Moraes Neto, Oswaldo França contou o episódio dramático em que se envolveu em 1961. • O seu Esquadrão, sediado em Porto Alegre, não acatou as ordens superiores para eliminar, por meio de bombardeio, o então governador gaúcho Leonel Brizola, que defendia a legalidade da posse do vice-presidente João Goulart no posto do renunciado Jânio Quadros, em desafio aos desejos das Forças Armadas. • Isso, certamente, influiu na sua expulsão da Aeronáutica. O então 1° Tenente França, perto do final precoce de sua vida, foi anistiado e reformado como Coronel Aviador. • Mas, apesar de tudo, devemos a esse triste episódio muito da existência da obra que Oswaldo França Júnior nos legou.

  7. Jorge um brasileiroOswaldo França Júnior • Isso, certamente, influiu na sua expulsão da Aeronáutica. O então 1° Tenente França, perto do final precoce de sua vida, foi anistiado e reformado como Coronel Aviador. • Mas, apesar de tudo, devemos a esse triste episódio muito da existência da obra que Oswaldo França Júnior nos legou.

  8. Jorge um brasileiroOswaldo França Júnior • Os livros deste escritor mineiro tem inúmeras abordagens, uma delas, que encontramos nesta obra, diz respeito à viagem. • Sob essa perspectiva, podem ser consideradas: a viagem literária, a viagem pela memória, a viagem como deslocamento no tempo e no espaço, a viagem como busca da identidade, a viagem autobiográfica e aquela realizada além das fronteiras.

  9. Jorge um brasileiroOswaldo França Júnior • Todas essas variações são abrigadas pela viagem literária, que engloba as demais. • Em Jorge, um brasileiro (1967), há o deslocamento do protagonista para o interior do Brasil. • Na medida em que conta sua história e traz o carregamento para Belo Horizonte, fica dividido entre a imagem grotesca e quase caricatural da amante do patrão:

  10. Jorge um brasileiroOswaldo França Júnior “E fui fumando o cigarro da outra testemunha, e pensando no senhor Mário que àquela hora devia estar com a loura que se pintava com os riscos grossos nos olhos, e dormia de boca aberta” e aquela de compromisso: “Dei minha palavra. Dei minha palavra que esse milho chegaria antes da inauguração”.

  11. Jorge um brasileiroOswaldo França Júnior • A aventura tem início em Belo Horizonte, quando o protagonista recebe a missão de buscar oito carretas carregadas com trinta toneladas de milho. • As carretas estavam em Caratinga e não podiam seguir viagem porque a chuva havia danificado as estradas, e havia uma barreira na saída da cidade com policiais impedindo que os motoristas seguissem viagem. • O prazo para as carretas estarem em Belo Horizonte era de uma semana.

  12. Jorge um brasileiroOswaldo França Júnior • Jorge, nosso herói-protagonista, não tinha como recusar a missão. • Ainda que precisasse enfrentar seu antagonista: a chuva, e tudo o que ela provocava. • A fim de bem executar sua perigosa jornada, Jorge começa os preparativos. • Jorge retira o dinheiro necessário do cofre, sob protestos do contador.

  13. Jorge um brasileiroOswaldo França Júnior • O contador era um pequeno inimigo de Jorge e, por interesses próprios, este faz com que Jorge assine um recibo no qual aparece não só o valor retirado, mas também uma ressalva de que tal retirada fora feita sem notificação de seu fim. • Depois, Jorge organiza o serviço na garagem dos concreteiros, pois não queria problemas enquanto estivesse ausente.

  14. Jorge um brasileiroOswaldo França Júnior • Em seguida, antes de ir à rodoviária, vai ao encontro de Sandra, moça com quem vinha saindo, para romper o relacionamento. • Ao fazer isso, Jorge corta – ainda que metaforicamente –ligações com sua cidade natal, pois não quer que nada o impeça de cumprir sua missão. • No momento da partida, Jorge está determinado, afirmava para si mesmo que iria trazer os caminhões para Belo Horizonte no prazo certo, nem que tivesse que puxar um por um no ombro.

  15. Jorge um brasileiroOswaldo França Júnior • A primeira etapa da jornada Jorge fez de ônibus, contudo este sofre um acidente perto de Coronel Fabriciano. • Neste ponto, a narrativa é repleta de lembranças da Sandra, do senhor Mário, da amante do senhor Mário. • Jorge continua a viagem de trem, vai de Coronel Fabriciano até Governador Valadares. • Neste trecho, além das lembranças, Jorge faz várias reflexões.

  16. Jorge um brasileiroOswaldo França Júnior • É também nessa segunda etapa, na viagem de trem, que Jorge vivencia a primeira aventura: • Jorge comanda um comboio de cinco caminhões, que tem como objetivo levar material para um hotel o qual está sendo construído bem no meio da ilha do Bananal. • Para chegar a esse hotel, o comboio passa por uma estrada completamente deserta. • Ao chegarem ao destino, encontram Fefeu, um antigo companheiro que tinha sido preso por roubo.

  17. Jorge um brasileiroOswaldo França Júnior • Como uma coisa leva a outra, Fefeu dá início a mais uma camada narrativa anterior à do episódio do Bananal. • Conversa puxa conversa, e o narrador (Jorge) esclarece que, na época da construção de Brasília, Fefeu liderou um lock out (greve) de caminhoneiros para receberem pagamentos atrasados. • A narrativa retorna ao caso do Bananal e descobre-se que Fefeufoi preso por ter roubado uma correia de ventilador para o seu caminhão, que havia quebrado. • Fefeu alega ter sido obrigado a fazer isso.

  18. Jorge um brasileiroOswaldo França Júnior • O zelador não quis ceder uma correia para Fefeu, que, inconformado, tentou pegar a força. • O zelador se irritou e chamou um soldado que prendeu Fefeu. • Voltamos a narrativa principal e Jorge chega a Governador Valadares. • Lá, ele procura Altair, antigo companheiro da época em que havia trabalhado na Rio-Bahia.

  19. Jorge um brasileiroOswaldo França Júnior • Altair agora é dono de uma próspera oficina, e está casado e com dois filhos. • Altair recebe Jorge com bastante empolgação, convida-o para jantar e dentre conversa vai, conversa vem, relembram a aventura que vivenciaram juntos na época da Rio-Bahia, com destaque para as visitas que eles faziam à casa das prostitutas. • Para essas visitas, eles precisavam de dinheiro, o que faz Jorge lembrar-se dos lugares em que o pagamento sempre atrasava.

  20. Jorge um brasileiroOswaldo França Júnior • A narrativa dá outro salto: a conversa vai para um plano mais remoto, para o período em que ele havia trabalhado na Brasília-Acre. • Lá havia atraso de pagamento, mas a Companhia era boa, fornecia até óleo e gasolina para os caminhões. • Inclusive, mesmo depois de 46 dias, o senhor Mário apareceu lá com um caminhão que tinha ido para o conserto.

  21. Jorge um brasileiroOswaldo França Júnior • O narrador fala da satisfação que ele tinha em trabalhar para o senhor Mário, que trazia até presentes — cervejas e camisas — para os empregados. • Faz parte desse plano narrativo o acidente com o Jocimar, que estragou um caminhão. • Depois de transitar pela Brasília-Acre, a narrativa volta para a Rio-Bahia, com o caso do Altair com a dona Olga. • O Altair, segundo o narrador, era o maior namorador da Rio-Bahia, e cismou de ficar com a dona da casa de prostituição, a dona Olga.

  22. Jorge um brasileiroOswaldo França Júnior • Quando ele a conquistou, ele é que parecia o dono da casa: fazia as contas, recebia o dinheiro, organizava tudo. • Quando o romance com Dona Olga chegou ao fim, a narração retorna à aventura principal, que se encontra em Governador Valadares. • Altair consegue para Jorge uma carona num caminhão que ia para Caratinga, onde estavam as carretas carregadas de milho. • Durante a viagem no caminhão, vem novamente a lembrança dos tempos na Rio-Bahia.

  23. Jorge um brasileiroOswaldo França Júnior • O narrador conta como ele desmobilizou a equipe ao final da obra, e como teve duas rodas de um caminhão roubadas ali mesmo em Governador Valadares. • Afinal, o dono do posto onde os caminhões deviam estar sendo vigiados acabou providenciando novas rodas e pneus para que Jorge pudesse seguir viagem para Belo Horizonte com seus nove caminhões desmobilizados. • A narrativa regressa à viagem principal e chega a Caratinga.

  24. Jorge um brasileiroOswaldo França Júnior • Lá, iniciam-se os preparativos para a luta crucial, que deve começar. • Os caminhões são vistoriados, os defeitos são reparados. • Jorge volta a Governador Valadares para ver a possibilidade de embarcar a mercadoria pela estrada de ferro, ou seja, de trem. • Diante da negativa do chefe da estação, Jorge verificou a viabilidade de passar por uma estrada alternativa, e foi desaconselhado por uma pessoa que tinha feito o percurso havia pouco tempo.

  25. Jorge um brasileiroOswaldo França Júnior • Mas, teimoso, Jorge resolve ir assim mesmo. • Então, Jorge reúne seu pessoal para dar instruções e explicar como eles chegariam a Ipatinga. • O Oliveira manifesta seu medo nesse momento, o momento do perigo, prefere recuar quando prosseguir é difícil. • O perigo é real, mas o Oliveira é considerado um fraco, uma pessoa a quem não se deve dar ouvidos.

  26. Jorge um brasileiroOswaldo França Júnior • Na saída do comboio, o herói comete um erro na passagem de marcha, na presença de um outro motorista. • Aquilo estraga o dia de Jorge e funciona como um presságio. Outro presságio foi o quase atropelamento de uma criança. • O acontecimento enseja o abandono da aventura principal para o narrador contar o caso de um atropelamento em que ele havia matado um homem e fugido em Brasília.

  27. Jorge um brasileiroOswaldo França Júnior • Dois erros e uma transgressão na partida da luta maior. • O narrador reflete que uma jornada trabalhosa deve apresentar as dificuldades logo de início, para não deixar o empreendedor acomodado: Tem coisa difícil que você começa, que já no começo dá trabalho, e você então já começa com disposição para ir até o fim. E tem coisa difícil que começa sem trabalho, e aí seu corpo se acostuma, e você fica torcendo para a coisa não apertar, e quando aperta, você está mole e então reclama. e foi desse modo naquela estrada depois de Inhapim.

  28. Jorge um brasileiroOswaldo França Júnior • As dificuldades começaram então a se apresentar. • A estrada estreita e lamacenta fazia o motorista ter de descer a todo momento para ver se dava passagem, ou alguém tinha de ir à frente nas curvas para sinalizar se algum carro viesse em sentido contrário. • Num determinado local, um carro carregado de carvão atrapalhava a estrada, com problema no motor de arranque. • Teve de ser empurrado.

  29. Jorge um brasileiroOswaldo França Júnior • Quando havia água na estrada, eles tinham que descer e marcar o lugar da estrada depois de um exame do local com os pés. • Já noite, a carreta de Jorge prendeu num barranco, e tiveram que pernoitar ali. • O dia seguinte quase todo foi gasto com o corte do barranco para as carretas passarem. • O narrador começa a se preocupar com o cumprimento do prazo, e admite que a sua procura pode não dar resultado:

  30. Jorge um brasileiroOswaldo França Júnior Olhei para a estrada estreita e enlameada e, e pensei que a gente tinha levado um dia para passar uma curva, e que faltavam cinco dias para a tal inauguração, e eu não estava com certeza se chegaríamos a tempo. E digo que tem hora que dá vontade de você se convencer que, às vezes, por mais força que você faça, as coisas podem não acontecer como você quer. • Em seguida um mata-burro exigiu reforço, o caminhão de Jorge atolou na saída de Bugre, e uma ponte suspeita deteve o comboio. • Teve de ser feito um desvio por dentro do rio, que não estava muito cheio. • Quase dois dias de interrupção. Jorge começa a acreditar que a missão seria cumprida: Fiz a conta e faltavam três dias para a data que o senhor Mário havia marcado para entregar aquele milho. Pensei e achei que a gente ia chegar no dia certo. Que era até capaz da gente chegar antes, porque de Ipatinga a Belo Horizonte a estrada era asfaltada e nova. • Daí a pouco, furou um pneu traseiro da carreta do Toledo. • O Toledo era um tipo mais delicado, meio extravagante, que usava calças apertadas em cima e boca-de-sino em baixo, e camisa de manga comprida colorida e botinhas de salto alto. • Tinha um jeito esquisito de andar, como se estivesse apagando cigarros com o pé. • De todos, era o que tinha mãos mais finas, e fazia um esforço tremendo para trocar o pneu da carreta. • As mãos finas do Toledo remetem o narrador novamente à pedreira em Brasília, onde ele havia atropelado o homem. • Segundo o sócio do senhor Mário, candidato a trabalhador de pedreira não pode ter mãos finas, porque pau-de-arara de mãos finas era cantador ou ladrão. • Tornando à aventura principal, Jorge reflete que daqueles motoristas ali com as carretas, o de mão mais delicada era o melhor deles. E isso era engraçado. • Chegando a Ipatinga, Jorge tenta usar um estratagema para passar na barreira, que estava com a guarda abaixada e dois policiais tomando conta com ordem para não deixar ninguém passar sem autorização. • Jorge tenta convencer um dos guardas de que as oito carretas continham material para ser entregue no acampamento da Companhia que estava consertando as estrada. • Em vão. • Jorge tenta intimidar o guarda ameaçando passar a força, mas este reage puxando a arma. • Jorge volta a Ipatinga para tentar conseguir uma ordem com o delegado, que ele conhecia da outra vez que estivera lá, quando o ônibus batera num caminhão. • Não consegue nada, e resolvem tentar outro caminho. • Volta a assaltar Jorge a preocupação com o cumprimento de sua missão: E faltavam três dias para a data que o senhor Mário tinha falado como sendo o limite para entregar aquele milho, e fiquei com medo de não dar. E a distância era pouca, um quase nada. • Saindo de Timóteo, o carro do Fábio fica sem óleo de freio. • Eles têm que consertar e arranjar um pouco de óleo de cada uma das outras carretas para abastecer a que ficara sem. • Mais adiante, aparece uma ponte com desnível em relação à estrada, nova parada para reparos. • Mais paradas para consertar um radiador e um semieixo. E o herói começa a esmorecer diante dos perigos da jornada: Saí fazendo as contas na cabeça de quanto a gente ainda poderia demorar. E havia trechos em que não estávamos indo nem a dois, três quilômetros por hora. Era aquela vagareza, passando devagar nas curvas, devagar nas subidas, nas descidas. E parando. E vendo se as rodas iam atolar naquela lama que aparecia na frente. E medindo o tamanho do buraco que a água estava encobrindo. (...) E ficando com aquele medo nas horas em que sentíamos os pneus derrapando. • O inimigo é associado às trevas, ao inverno, à confusão, à desordem; o inimigo é a chuva, que deforma o mundo e barra os movimentos do herói. • Mas ele vai em frente, até chegar a Dionísio, onde uma ponte danificada segurou irremediavelmente o grupo, enquanto os homens da prefeitura tentavam consertá-la. • No momento em que a missão está definitivamente comprometida, ocorre o idílio, o divertimento do herói com a donzela que ele encontra no bar de beira de estrada, que se oferece a ele. • A sedução da moça faz o herói esquecer seu fracasso, prendendo-o ao local de obstáculo intransponível. • E o herói esqueceu que havia uma ponte que devia ser consertada para seu grupo passar. O prazo já estava vencido: No dia seguinte, quando olhei a ponte e vi que não ia dar para ficar pronta, e o “mestre” me perguntou qual era mesmo o peso que a gente levava, eu disse, e falei que ali nunca tinha passado carro com um peso daqueles. E não liguei de não dar para passar naquele dia. E aquilo era coisa que eu nem sabia como era. Já estávamos atrasados cinco dias, e o “mestre” falou que naquele dia não ia dar, e eu nem com raiva fiquei. • No dia seguinte, a ponte ficou pronta, e o herói se despediu da donzela, com muitas promessas de que ia voltar para vê-la. • E, após alguns atoleiros, o grupo chega a São Domingos do Prata. • O protagonista se conforma com a ideia de que não conseguiu cumprir a missão, que seu ato de heroísmo era impossível. E assume sua condição humana, o real está ali: E íamos devagar e já estávamos atrasados seis dias. E não havia outro meio de ir. E não senti mais raiva disso. E sabia que se fosse possível, iríamos chegar em Belo Horizonte com as oito carretas. E isso me pareceu que bastava. • A entrada triunfal da comitiva na avenida Antônio Carlos, em Belo Horizonte, mais de nove horas da noite, é uma espécie de exaltação do herói, que não cumpriu um desígnio superior e impossível, mas que, assumindo sua condição humana, consegue terminar vivo sua grande luta. • O não cumprimento da missão faz as coisas transformarem-se em seu retorno. • O chuveiro estava estragado. A cama onde ele sempre dormia tinha sido interditada verbalmente pelo senhor Mário. • Transgredindo a ordem, ele dorme nela assim mesmo. A chave da Kombi, o vigia a entrega a ele dizendo que não podia entregar, por ordem do senhor Mário. • Até o contador, criatura insignificante, havia-se magnificado para cobrar dele notas e acerto de contas. • Aí começa a se efetivar a libertação do herói, que já se havia delineado nas pequenas transgressões anteriores, da cama, do chuveiro e da Kombi. • Ele agride o contador, e o joga contra a porta da sala do senhor Mário, que estava vazia, e aquele pedaço de merda quebra a porta de entrada do espaço da dominação. • O pedaço de merda é o homem que toma conta do patrimônio do patrão. • O supremo gesto de libertação é a conquista da rainha. • Jorge se dirige à casa do senhor Mário, para esclarecer tudo definitivamente. • O patrão não se encontra lá; apenas sua mulher, dona Helena. • A confirmar a ruptura ocorre a sedução da consorte do dominador: O cabelo dela brilhava ali perto do meu rosto, naquela sombra da sala, e eu olhei e vi sua boca, e era uma boca que parecia que tinha bebido água. E tornei a apertá-la, e enfiei minha língua lá dentro de sua boca, e digo que nunca beijei uma mulher como aquela. • O ato final do herói foi sair dali, dirigir-se à garagem dos concreteiros, pegar suas coisas, colocar dentro de suas duas bolsas, e abandonar o local. • Definitivamente? • Uma das características da narrativa oral é a possibilidade de se fazer a pergunta: o que aconteceu depois? • Pode-se imaginar então que há um Jorge em um ponto qualquer a recontar sua história, ou a inventar alguma, ou a reproduzir outra que ouviu de alguém.

  31. Jorge um brasileiroOswaldo França Júnior • Quase dois dias de interrupção. Jorge começa a acreditar que a missão seria cumprida: Fiz a conta e faltavam três dias para a data que o senhor Mário havia marcado para entregar aquele milho. Pensei e achei que a gente ia chegar no dia certo. Que era até capaz da gente chegar antes, porque de Ipatinga a Belo Horizonte a estrada era asfaltada e nova. • Daí a pouco, furou um pneu traseiro da carreta do Toledo. • O Toledo era um tipo mais delicado, meio extravagante, que usava calças apertadas em cima e boca-de-sino em baixo, e camisa de manga comprida colorida e botinhas de salto alto. • Tinha um jeito esquisito de andar, como se estivesse apagando cigarros com o pé. • De todos, era o que tinha mãos mais finas, e fazia um esforço tremendo para trocar o pneu da carreta. • As mãos finas do Toledo remetem o narrador novamente à pedreira em Brasília, onde ele havia atropelado o homem. • Segundo o sócio do senhor Mário, candidato a trabalhador de pedreira não pode ter mãos finas, porque pau-de-arara de mãos finas era cantador ou ladrão. • Tornando à aventura principal, Jorge reflete que daqueles motoristas ali com as carretas, o de mão mais delicada era o melhor deles. E isso era engraçado. • Chegando a Ipatinga, Jorge tenta usar um estratagema para passar na barreira, que estava com a guarda abaixada e dois policiais tomando conta com ordem para não deixar ninguém passar sem autorização. • Jorge tenta convencer um dos guardas de que as oito carretas continham material para ser entregue no acampamento da Companhia que estava consertando as estrada. • Em vão. • Jorge tenta intimidar o guarda ameaçando passar a força, mas este reage puxando a arma. • Jorge volta a Ipatinga para tentar conseguir uma ordem com o delegado, que ele conhecia da outra vez que estivera lá, quando o ônibus batera num caminhão. • Não consegue nada, e resolvem tentar outro caminho. • Volta a assaltar Jorge a preocupação com o cumprimento de sua missão: E faltavam três dias para a data que o senhor Mário tinha falado como sendo o limite para entregar aquele milho, e fiquei com medo de não dar. E a distância era pouca, um quase nada. • Saindo de Timóteo, o carro do Fábio fica sem óleo de freio. • Eles têm que consertar e arranjar um pouco de óleo de cada uma das outras carretas para abastecer a que ficara sem. • Mais adiante, aparece uma ponte com desnível em relação à estrada, nova parada para reparos. • Mais paradas para consertar um radiador e um semieixo. E o herói começa a esmorecer diante dos perigos da jornada: Saí fazendo as contas na cabeça de quanto a gente ainda poderia demorar. E havia trechos em que não estávamos indo nem a dois, três quilômetros por hora. Era aquela vagareza, passando devagar nas curvas, devagar nas subidas, nas descidas. E parando. E vendo se as rodas iam atolar naquela lama que aparecia na frente. E medindo o tamanho do buraco que a água estava encobrindo. (...) E ficando com aquele medo nas horas em que sentíamos os pneus derrapando. • O inimigo é associado às trevas, ao inverno, à confusão, à desordem; o inimigo é a chuva, que deforma o mundo e barra os movimentos do herói. • Mas ele vai em frente, até chegar a Dionísio, onde uma ponte danificada segurou irremediavelmente o grupo, enquanto os homens da prefeitura tentavam consertá-la. • No momento em que a missão está definitivamente comprometida, ocorre o idílio, o divertimento do herói com a donzela que ele encontra no bar de beira de estrada, que se oferece a ele. • A sedução da moça faz o herói esquecer seu fracasso, prendendo-o ao local de obstáculo intransponível. • E o herói esqueceu que havia uma ponte que devia ser consertada para seu grupo passar. O prazo já estava vencido: No dia seguinte, quando olhei a ponte e vi que não ia dar para ficar pronta, e o “mestre” me perguntou qual era mesmo o peso que a gente levava, eu disse, e falei que ali nunca tinha passado carro com um peso daqueles. E não liguei de não dar para passar naquele dia. E aquilo era coisa que eu nem sabia como era. Já estávamos atrasados cinco dias, e o “mestre” falou que naquele dia não ia dar, e eu nem com raiva fiquei. • No dia seguinte, a ponte ficou pronta, e o herói se despediu da donzela, com muitas promessas de que ia voltar para vê-la. • E, após alguns atoleiros, o grupo chega a São Domingos do Prata. • O protagonista se conforma com a ideia de que não conseguiu cumprir a missão, que seu ato de heroísmo era impossível. E assume sua condição humana, o real está ali: E íamos devagar e já estávamos atrasados seis dias. E não havia outro meio de ir. E não senti mais raiva disso. E sabia que se fosse possível, iríamos chegar em Belo Horizonte com as oito carretas. E isso me pareceu que bastava. • A entrada triunfal da comitiva na avenida Antônio Carlos, em Belo Horizonte, mais de nove horas da noite, é uma espécie de exaltação do herói, que não cumpriu um desígnio superior e impossível, mas que, assumindo sua condição humana, consegue terminar vivo sua grande luta. • O não cumprimento da missão faz as coisas transformarem-se em seu retorno. • O chuveiro estava estragado. A cama onde ele sempre dormia tinha sido interditada verbalmente pelo senhor Mário. • Transgredindo a ordem, ele dorme nela assim mesmo. A chave da Kombi, o vigia a entrega a ele dizendo que não podia entregar, por ordem do senhor Mário. • Até o contador, criatura insignificante, havia-se magnificado para cobrar dele notas e acerto de contas. • Aí começa a se efetivar a libertação do herói, que já se havia delineado nas pequenas transgressões anteriores, da cama, do chuveiro e da Kombi. • Ele agride o contador, e o joga contra a porta da sala do senhor Mário, que estava vazia, e aquele pedaço de merda quebra a porta de entrada do espaço da dominação. • O pedaço de merda é o homem que toma conta do patrimônio do patrão. • O supremo gesto de libertação é a conquista da rainha. • Jorge se dirige à casa do senhor Mário, para esclarecer tudo definitivamente. • O patrão não se encontra lá; apenas sua mulher, dona Helena. • A confirmar a ruptura ocorre a sedução da consorte do dominador: O cabelo dela brilhava ali perto do meu rosto, naquela sombra da sala, e eu olhei e vi sua boca, e era uma boca que parecia que tinha bebido água. E tornei a apertá-la, e enfiei minha língua lá dentro de sua boca, e digo que nunca beijei uma mulher como aquela. • O ato final do herói foi sair dali, dirigir-se à garagem dos concreteiros, pegar suas coisas, colocar dentro de suas duas bolsas, e abandonar o local. • Definitivamente? • Uma das características da narrativa oral é a possibilidade de se fazer a pergunta: o que aconteceu depois? • Pode-se imaginar então que há um Jorge em um ponto qualquer a recontar sua história, ou a inventar alguma, ou a reproduzir outra que ouviu de alguém.

  32. Jorge um brasileiroOswaldo França Júnior • O Toledo era um tipo mais delicado, meio extravagante, que usava calças apertadas em cima e boca-de-sino em baixo, e camisa de manga comprida colorida e botinhas de salto alto. • Tinha um jeito esquisito de andar, como se estivesse apagando cigarros com o pé. • De todos, era o que tinha mãos mais finas, e fazia um esforço tremendo para trocar o pneu da carreta. • As mãos finas do Toledo remetem o narrador novamente à pedreira em Brasília, onde ele havia atropelado o homem. • Segundo o sócio do senhor Mário, candidato a trabalhador de pedreira não pode ter mãos finas, porque pau-de-arara de mãos finas era cantador ou ladrão. • Tornando à aventura principal, Jorge reflete que daqueles motoristas ali com as carretas, o de mão mais delicada era o melhor deles. E isso era engraçado. • Chegando a Ipatinga, Jorge tenta usar um estratagema para passar na barreira, que estava com a guarda abaixada e dois policiais tomando conta com ordem para não deixar ninguém passar sem autorização. • Jorge tenta convencer um dos guardas de que as oito carretas continham material para ser entregue no acampamento da Companhia que estava consertando as estrada. • Em vão. • Jorge tenta intimidar o guarda ameaçando passar a força, mas este reage puxando a arma. • Jorge volta a Ipatinga para tentar conseguir uma ordem com o delegado, que ele conhecia da outra vez que estivera lá, quando o ônibus batera num caminhão. • Não consegue nada, e resolvem tentar outro caminho. • Volta a assaltar Jorge a preocupação com o cumprimento de sua missão: E faltavam três dias para a data que o senhor Mário tinha falado como sendo o limite para entregar aquele milho, e fiquei com medo de não dar. E a distância era pouca, um quase nada. • Saindo de Timóteo, o carro do Fábio fica sem óleo de freio. • Eles têm que consertar e arranjar um pouco de óleo de cada uma das outras carretas para abastecer a que ficara sem. • Mais adiante, aparece uma ponte com desnível em relação à estrada, nova parada para reparos. • Mais paradas para consertar um radiador e um semieixo. E o herói começa a esmorecer diante dos perigos da jornada: Saí fazendo as contas na cabeça de quanto a gente ainda poderia demorar. E havia trechos em que não estávamos indo nem a dois, três quilômetros por hora. Era aquela vagareza, passando devagar nas curvas, devagar nas subidas, nas descidas. E parando. E vendo se as rodas iam atolar naquela lama que aparecia na frente. E medindo o tamanho do buraco que a água estava encobrindo. (...) E ficando com aquele medo nas horas em que sentíamos os pneus derrapando. • O inimigo é associado às trevas, ao inverno, à confusão, à desordem; o inimigo é a chuva, que deforma o mundo e barra os movimentos do herói. • Mas ele vai em frente, até chegar a Dionísio, onde uma ponte danificada segurou irremediavelmente o grupo, enquanto os homens da prefeitura tentavam consertá-la. • No momento em que a missão está definitivamente comprometida, ocorre o idílio, o divertimento do herói com a donzela que ele encontra no bar de beira de estrada, que se oferece a ele. • A sedução da moça faz o herói esquecer seu fracasso, prendendo-o ao local de obstáculo intransponível. • E o herói esqueceu que havia uma ponte que devia ser consertada para seu grupo passar. O prazo já estava vencido: No dia seguinte, quando olhei a ponte e vi que não ia dar para ficar pronta, e o “mestre” me perguntou qual era mesmo o peso que a gente levava, eu disse, e falei que ali nunca tinha passado carro com um peso daqueles. E não liguei de não dar para passar naquele dia. E aquilo era coisa que eu nem sabia como era. Já estávamos atrasados cinco dias, e o “mestre” falou que naquele dia não ia dar, e eu nem com raiva fiquei. • No dia seguinte, a ponte ficou pronta, e o herói se despediu da donzela, com muitas promessas de que ia voltar para vê-la. • E, após alguns atoleiros, o grupo chega a São Domingos do Prata. • O protagonista se conforma com a ideia de que não conseguiu cumprir a missão, que seu ato de heroísmo era impossível. E assume sua condição humana, o real está ali: E íamos devagar e já estávamos atrasados seis dias. E não havia outro meio de ir. E não senti mais raiva disso. E sabia que se fosse possível, iríamos chegar em Belo Horizonte com as oito carretas. E isso me pareceu que bastava. • A entrada triunfal da comitiva na avenida Antônio Carlos, em Belo Horizonte, mais de nove horas da noite, é uma espécie de exaltação do herói, que não cumpriu um desígnio superior e impossível, mas que, assumindo sua condição humana, consegue terminar vivo sua grande luta. • O não cumprimento da missão faz as coisas transformarem-se em seu retorno. • O chuveiro estava estragado. A cama onde ele sempre dormia tinha sido interditada verbalmente pelo senhor Mário. • Transgredindo a ordem, ele dorme nela assim mesmo. A chave da Kombi, o vigia a entrega a ele dizendo que não podia entregar, por ordem do senhor Mário. • Até o contador, criatura insignificante, havia-se magnificado para cobrar dele notas e acerto de contas. • Aí começa a se efetivar a libertação do herói, que já se havia delineado nas pequenas transgressões anteriores, da cama, do chuveiro e da Kombi. • Ele agride o contador, e o joga contra a porta da sala do senhor Mário, que estava vazia, e aquele pedaço de merda quebra a porta de entrada do espaço da dominação. • O pedaço de merda é o homem que toma conta do patrimônio do patrão. • O supremo gesto de libertação é a conquista da rainha. • Jorge se dirige à casa do senhor Mário, para esclarecer tudo definitivamente. • O patrão não se encontra lá; apenas sua mulher, dona Helena. • A confirmar a ruptura ocorre a sedução da consorte do dominador: O cabelo dela brilhava ali perto do meu rosto, naquela sombra da sala, e eu olhei e vi sua boca, e era uma boca que parecia que tinha bebido água. E tornei a apertá-la, e enfiei minha língua lá dentro de sua boca, e digo que nunca beijei uma mulher como aquela. • O ato final do herói foi sair dali, dirigir-se à garagem dos concreteiros, pegar suas coisas, colocar dentro de suas duas bolsas, e abandonar o local. • Definitivamente? • Uma das características da narrativa oral é a possibilidade de se fazer a pergunta: o que aconteceu depois? • Pode-se imaginar então que há um Jorge em um ponto qualquer a recontar sua história, ou a inventar alguma, ou a reproduzir outra que ouviu de alguém.

  33. Jorge um brasileiroOswaldo França Júnior • As mãos finas do Toledo remetem o narrador novamente à pedreira em Brasília, onde ele havia atropelado o homem. • Segundo o sócio do senhor Mário, candidato a trabalhador de pedreira não pode ter mãos finas, porque pau-de-arara de mãos finas era cantador ou ladrão. • Tornando à aventura principal, Jorge reflete que daqueles motoristas ali com as carretas, o de mão mais delicada era o melhor deles. E isso era engraçado. • Chegando a Ipatinga, Jorge tenta usar um estratagema para passar na barreira, que estava com a guarda abaixada e dois policiais tomando conta com ordem para não deixar ninguém passar sem autorização. • Jorge tenta convencer um dos guardas de que as oito carretas continham material para ser entregue no acampamento da Companhia que estava consertando as estrada. • Em vão. • Jorge tenta intimidar o guarda ameaçando passar a força, mas este reage puxando a arma. • Jorge volta a Ipatinga para tentar conseguir uma ordem com o delegado, que ele conhecia da outra vez que estivera lá, quando o ônibus batera num caminhão. • Não consegue nada, e resolvem tentar outro caminho. • Volta a assaltar Jorge a preocupação com o cumprimento de sua missão: E faltavam três dias para a data que o senhor Mário tinha falado como sendo o limite para entregar aquele milho, e fiquei com medo de não dar. E a distância era pouca, um quase nada. • Saindo de Timóteo, o carro do Fábio fica sem óleo de freio. • Eles têm que consertar e arranjar um pouco de óleo de cada uma das outras carretas para abastecer a que ficara sem. • Mais adiante, aparece uma ponte com desnível em relação à estrada, nova parada para reparos. • Mais paradas para consertar um radiador e um semieixo. E o herói começa a esmorecer diante dos perigos da jornada: Saí fazendo as contas na cabeça de quanto a gente ainda poderia demorar. E havia trechos em que não estávamos indo nem a dois, três quilômetros por hora. Era aquela vagareza, passando devagar nas curvas, devagar nas subidas, nas descidas. E parando. E vendo se as rodas iam atolar naquela lama que aparecia na frente. E medindo o tamanho do buraco que a água estava encobrindo. (...) E ficando com aquele medo nas horas em que sentíamos os pneus derrapando. • O inimigo é associado às trevas, ao inverno, à confusão, à desordem; o inimigo é a chuva, que deforma o mundo e barra os movimentos do herói. • Mas ele vai em frente, até chegar a Dionísio, onde uma ponte danificada segurou irremediavelmente o grupo, enquanto os homens da prefeitura tentavam consertá-la. • No momento em que a missão está definitivamente comprometida, ocorre o idílio, o divertimento do herói com a donzela que ele encontra no bar de beira de estrada, que se oferece a ele. • A sedução da moça faz o herói esquecer seu fracasso, prendendo-o ao local de obstáculo intransponível. • E o herói esqueceu que havia uma ponte que devia ser consertada para seu grupo passar. O prazo já estava vencido: No dia seguinte, quando olhei a ponte e vi que não ia dar para ficar pronta, e o “mestre” me perguntou qual era mesmo o peso que a gente levava, eu disse, e falei que ali nunca tinha passado carro com um peso daqueles. E não liguei de não dar para passar naquele dia. E aquilo era coisa que eu nem sabia como era. Já estávamos atrasados cinco dias, e o “mestre” falou que naquele dia não ia dar, e eu nem com raiva fiquei. • No dia seguinte, a ponte ficou pronta, e o herói se despediu da donzela, com muitas promessas de que ia voltar para vê-la. • E, após alguns atoleiros, o grupo chega a São Domingos do Prata. • O protagonista se conforma com a ideia de que não conseguiu cumprir a missão, que seu ato de heroísmo era impossível. E assume sua condição humana, o real está ali: E íamos devagar e já estávamos atrasados seis dias. E não havia outro meio de ir. E não senti mais raiva disso. E sabia que se fosse possível, iríamos chegar em Belo Horizonte com as oito carretas. E isso me pareceu que bastava. • A entrada triunfal da comitiva na avenida Antônio Carlos, em Belo Horizonte, mais de nove horas da noite, é uma espécie de exaltação do herói, que não cumpriu um desígnio superior e impossível, mas que, assumindo sua condição humana, consegue terminar vivo sua grande luta. • O não cumprimento da missão faz as coisas transformarem-se em seu retorno. • O chuveiro estava estragado. A cama onde ele sempre dormia tinha sido interditada verbalmente pelo senhor Mário. • Transgredindo a ordem, ele dorme nela assim mesmo. A chave da Kombi, o vigia a entrega a ele dizendo que não podia entregar, por ordem do senhor Mário. • Até o contador, criatura insignificante, havia-se magnificado para cobrar dele notas e acerto de contas. • Aí começa a se efetivar a libertação do herói, que já se havia delineado nas pequenas transgressões anteriores, da cama, do chuveiro e da Kombi. • Ele agride o contador, e o joga contra a porta da sala do senhor Mário, que estava vazia, e aquele pedaço de merda quebra a porta de entrada do espaço da dominação. • O pedaço de merda é o homem que toma conta do patrimônio do patrão. • O supremo gesto de libertação é a conquista da rainha. • Jorge se dirige à casa do senhor Mário, para esclarecer tudo definitivamente. • O patrão não se encontra lá; apenas sua mulher, dona Helena. • A confirmar a ruptura ocorre a sedução da consorte do dominador: O cabelo dela brilhava ali perto do meu rosto, naquela sombra da sala, e eu olhei e vi sua boca, e era uma boca que parecia que tinha bebido água. E tornei a apertá-la, e enfiei minha língua lá dentro de sua boca, e digo que nunca beijei uma mulher como aquela. • O ato final do herói foi sair dali, dirigir-se à garagem dos concreteiros, pegar suas coisas, colocar dentro de suas duas bolsas, e abandonar o local. • Definitivamente? • Uma das características da narrativa oral é a possibilidade de se fazer a pergunta: o que aconteceu depois? • Pode-se imaginar então que há um Jorge em um ponto qualquer a recontar sua história, ou a inventar alguma, ou a reproduzir outra que ouviu de alguém.

  34. Jorge um brasileiroOswaldo França Júnior • Chegando a Ipatinga, Jorge tenta usar um estratagema para passar na barreira, que estava com a guarda abaixada e dois policiais tomando conta com ordem para não deixar ninguém passar sem autorização. • Jorge tenta convencer um dos guardas de que as oito carretas continham material para ser entregue no acampamento da Companhia que estava consertando as estrada. • Em vão. • Jorge tenta intimidar o guarda ameaçando passar a força, mas este reage puxando a arma. • Jorge volta a Ipatinga para tentar conseguir uma ordem com o delegado, que ele conhecia da outra vez que estivera lá, quando o ônibus batera num caminhão. • Não consegue nada, e resolvem tentar outro caminho. • Volta a assaltar Jorge a preocupação com o cumprimento de sua missão: E faltavam três dias para a data que o senhor Mário tinha falado como sendo o limite para entregar aquele milho, e fiquei com medo de não dar. E a distância era pouca, um quase nada. • Saindo de Timóteo, o carro do Fábio fica sem óleo de freio. • Eles têm que consertar e arranjar um pouco de óleo de cada uma das outras carretas para abastecer a que ficara sem. • Mais adiante, aparece uma ponte com desnível em relação à estrada, nova parada para reparos. • Mais paradas para consertar um radiador e um semieixo. E o herói começa a esmorecer diante dos perigos da jornada: Saí fazendo as contas na cabeça de quanto a gente ainda poderia demorar. E havia trechos em que não estávamos indo nem a dois, três quilômetros por hora. Era aquela vagareza, passando devagar nas curvas, devagar nas subidas, nas descidas. E parando. E vendo se as rodas iam atolar naquela lama que aparecia na frente. E medindo o tamanho do buraco que a água estava encobrindo. (...) E ficando com aquele medo nas horas em que sentíamos os pneus derrapando. • O inimigo é associado às trevas, ao inverno, à confusão, à desordem; o inimigo é a chuva, que deforma o mundo e barra os movimentos do herói. • Mas ele vai em frente, até chegar a Dionísio, onde uma ponte danificada segurou irremediavelmente o grupo, enquanto os homens da prefeitura tentavam consertá-la. • No momento em que a missão está definitivamente comprometida, ocorre o idílio, o divertimento do herói com a donzela que ele encontra no bar de beira de estrada, que se oferece a ele. • A sedução da moça faz o herói esquecer seu fracasso, prendendo-o ao local de obstáculo intransponível. • E o herói esqueceu que havia uma ponte que devia ser consertada para seu grupo passar. O prazo já estava vencido: No dia seguinte, quando olhei a ponte e vi que não ia dar para ficar pronta, e o “mestre” me perguntou qual era mesmo o peso que a gente levava, eu disse, e falei que ali nunca tinha passado carro com um peso daqueles. E não liguei de não dar para passar naquele dia. E aquilo era coisa que eu nem sabia como era. Já estávamos atrasados cinco dias, e o “mestre” falou que naquele dia não ia dar, e eu nem com raiva fiquei. • No dia seguinte, a ponte ficou pronta, e o herói se despediu da donzela, com muitas promessas de que ia voltar para vê-la. • E, após alguns atoleiros, o grupo chega a São Domingos do Prata. • O protagonista se conforma com a ideia de que não conseguiu cumprir a missão, que seu ato de heroísmo era impossível. E assume sua condição humana, o real está ali: E íamos devagar e já estávamos atrasados seis dias. E não havia outro meio de ir. E não senti mais raiva disso. E sabia que se fosse possível, iríamos chegar em Belo Horizonte com as oito carretas. E isso me pareceu que bastava. • A entrada triunfal da comitiva na avenida Antônio Carlos, em Belo Horizonte, mais de nove horas da noite, é uma espécie de exaltação do herói, que não cumpriu um desígnio superior e impossível, mas que, assumindo sua condição humana, consegue terminar vivo sua grande luta. • O não cumprimento da missão faz as coisas transformarem-se em seu retorno. • O chuveiro estava estragado. A cama onde ele sempre dormia tinha sido interditada verbalmente pelo senhor Mário. • Transgredindo a ordem, ele dorme nela assim mesmo. A chave da Kombi, o vigia a entrega a ele dizendo que não podia entregar, por ordem do senhor Mário. • Até o contador, criatura insignificante, havia-se magnificado para cobrar dele notas e acerto de contas. • Aí começa a se efetivar a libertação do herói, que já se havia delineado nas pequenas transgressões anteriores, da cama, do chuveiro e da Kombi. • Ele agride o contador, e o joga contra a porta da sala do senhor Mário, que estava vazia, e aquele pedaço de merda quebra a porta de entrada do espaço da dominação. • O pedaço de merda é o homem que toma conta do patrimônio do patrão. • O supremo gesto de libertação é a conquista da rainha. • Jorge se dirige à casa do senhor Mário, para esclarecer tudo definitivamente. • O patrão não se encontra lá; apenas sua mulher, dona Helena. • A confirmar a ruptura ocorre a sedução da consorte do dominador: O cabelo dela brilhava ali perto do meu rosto, naquela sombra da sala, e eu olhei e vi sua boca, e era uma boca que parecia que tinha bebido água. E tornei a apertá-la, e enfiei minha língua lá dentro de sua boca, e digo que nunca beijei uma mulher como aquela. • O ato final do herói foi sair dali, dirigir-se à garagem dos concreteiros, pegar suas coisas, colocar dentro de suas duas bolsas, e abandonar o local. • Definitivamente? • Uma das características da narrativa oral é a possibilidade de se fazer a pergunta: o que aconteceu depois? • Pode-se imaginar então que há um Jorge em um ponto qualquer a recontar sua história, ou a inventar alguma, ou a reproduzir outra que ouviu de alguém.

  35. Jorge um brasileiroOswaldo França Júnior • Jorge tenta intimidar o guarda ameaçando passar a força, mas este reage puxando a arma. • Jorge volta a Ipatinga para tentar conseguir uma ordem com o delegado, que ele conhecia da outra vez que estivera lá, quando o ônibus batera num caminhão. • Não consegue nada, e resolvem tentar outro caminho. • Volta a assaltar Jorge a preocupação com o cumprimento de sua missão: E faltavam três dias para a data que o senhor Mário tinha falado como sendo o limite para entregar aquele milho, e fiquei com medo de não dar. E a distância era pouca, um quase nada. • Saindo de Timóteo, o carro do Fábio fica sem óleo de freio. • Eles têm que consertar e arranjar um pouco de óleo de cada uma das outras carretas para abastecer a que ficara sem. • Mais adiante, aparece uma ponte com desnível em relação à estrada, nova parada para reparos. • Mais paradas para consertar um radiador e um semieixo. E o herói começa a esmorecer diante dos perigos da jornada: Saí fazendo as contas na cabeça de quanto a gente ainda poderia demorar. E havia trechos em que não estávamos indo nem a dois, três quilômetros por hora. Era aquela vagareza, passando devagar nas curvas, devagar nas subidas, nas descidas. E parando. E vendo se as rodas iam atolar naquela lama que aparecia na frente. E medindo o tamanho do buraco que a água estava encobrindo. (...) E ficando com aquele medo nas horas em que sentíamos os pneus derrapando. • O inimigo é associado às trevas, ao inverno, à confusão, à desordem; o inimigo é a chuva, que deforma o mundo e barra os movimentos do herói. • Mas ele vai em frente, até chegar a Dionísio, onde uma ponte danificada segurou irremediavelmente o grupo, enquanto os homens da prefeitura tentavam consertá-la. • No momento em que a missão está definitivamente comprometida, ocorre o idílio, o divertimento do herói com a donzela que ele encontra no bar de beira de estrada, que se oferece a ele. • A sedução da moça faz o herói esquecer seu fracasso, prendendo-o ao local de obstáculo intransponível. • E o herói esqueceu que havia uma ponte que devia ser consertada para seu grupo passar. O prazo já estava vencido: No dia seguinte, quando olhei a ponte e vi que não ia dar para ficar pronta, e o “mestre” me perguntou qual era mesmo o peso que a gente levava, eu disse, e falei que ali nunca tinha passado carro com um peso daqueles. E não liguei de não dar para passar naquele dia. E aquilo era coisa que eu nem sabia como era. Já estávamos atrasados cinco dias, e o “mestre” falou que naquele dia não ia dar, e eu nem com raiva fiquei. • No dia seguinte, a ponte ficou pronta, e o herói se despediu da donzela, com muitas promessas de que ia voltar para vê-la. • E, após alguns atoleiros, o grupo chega a São Domingos do Prata. • O protagonista se conforma com a ideia de que não conseguiu cumprir a missão, que seu ato de heroísmo era impossível. E assume sua condição humana, o real está ali: E íamos devagar e já estávamos atrasados seis dias. E não havia outro meio de ir. E não senti mais raiva disso. E sabia que se fosse possível, iríamos chegar em Belo Horizonte com as oito carretas. E isso me pareceu que bastava. • A entrada triunfal da comitiva na avenida Antônio Carlos, em Belo Horizonte, mais de nove horas da noite, é uma espécie de exaltação do herói, que não cumpriu um desígnio superior e impossível, mas que, assumindo sua condição humana, consegue terminar vivo sua grande luta. • O não cumprimento da missão faz as coisas transformarem-se em seu retorno. • O chuveiro estava estragado. A cama onde ele sempre dormia tinha sido interditada verbalmente pelo senhor Mário. • Transgredindo a ordem, ele dorme nela assim mesmo. A chave da Kombi, o vigia a entrega a ele dizendo que não podia entregar, por ordem do senhor Mário. • Até o contador, criatura insignificante, havia-se magnificado para cobrar dele notas e acerto de contas. • Aí começa a se efetivar a libertação do herói, que já se havia delineado nas pequenas transgressões anteriores, da cama, do chuveiro e da Kombi. • Ele agride o contador, e o joga contra a porta da sala do senhor Mário, que estava vazia, e aquele pedaço de merda quebra a porta de entrada do espaço da dominação. • O pedaço de merda é o homem que toma conta do patrimônio do patrão. • O supremo gesto de libertação é a conquista da rainha. • Jorge se dirige à casa do senhor Mário, para esclarecer tudo definitivamente. • O patrão não se encontra lá; apenas sua mulher, dona Helena. • A confirmar a ruptura ocorre a sedução da consorte do dominador: O cabelo dela brilhava ali perto do meu rosto, naquela sombra da sala, e eu olhei e vi sua boca, e era uma boca que parecia que tinha bebido água. E tornei a apertá-la, e enfiei minha língua lá dentro de sua boca, e digo que nunca beijei uma mulher como aquela. • O ato final do herói foi sair dali, dirigir-se à garagem dos concreteiros, pegar suas coisas, colocar dentro de suas duas bolsas, e abandonar o local. • Definitivamente? • Uma das características da narrativa oral é a possibilidade de se fazer a pergunta: o que aconteceu depois? • Pode-se imaginar então que há um Jorge em um ponto qualquer a recontar sua história, ou a inventar alguma, ou a reproduzir outra que ouviu de alguém.

  36. Jorge um brasileiroOswaldo França Júnior E faltavam três dias para a data que o senhor Mário tinha falado como sendo o limite para entregar aquele milho, e fiquei com medo de não dar. E a distância era pouca, um quase nada. • Saindo de Timóteo, o carro do Fábio fica sem óleo de freio. • Eles têm que consertar e arranjar um pouco de óleo de cada uma das outras carretas para abastecer a que ficara sem. • Mais adiante, aparece uma ponte com desnível em relação à estrada, nova parada para reparos. • Mais paradas para consertar um radiador e um semieixo. E o herói começa a esmorecer diante dos perigos da jornada: Saí fazendo as contas na cabeça de quanto a gente ainda poderia demorar. E havia trechos em que não estávamos indo nem a dois, três quilômetros por hora. Era aquela vagareza, passando devagar nas curvas, devagar nas subidas, nas descidas. E parando. E vendo se as rodas iam atolar naquela lama que aparecia na frente. E medindo o tamanho do buraco que a água estava encobrindo. (...) E ficando com aquele medo nas horas em que sentíamos os pneus derrapando. • O inimigo é associado às trevas, ao inverno, à confusão, à desordem; o inimigo é a chuva, que deforma o mundo e barra os movimentos do herói. • Mas ele vai em frente, até chegar a Dionísio, onde uma ponte danificada segurou irremediavelmente o grupo, enquanto os homens da prefeitura tentavam consertá-la. • No momento em que a missão está definitivamente comprometida, ocorre o idílio, o divertimento do herói com a donzela que ele encontra no bar de beira de estrada, que se oferece a ele. • A sedução da moça faz o herói esquecer seu fracasso, prendendo-o ao local de obstáculo intransponível. • E o herói esqueceu que havia uma ponte que devia ser consertada para seu grupo passar. O prazo já estava vencido: No dia seguinte, quando olhei a ponte e vi que não ia dar para ficar pronta, e o “mestre” me perguntou qual era mesmo o peso que a gente levava, eu disse, e falei que ali nunca tinha passado carro com um peso daqueles. E não liguei de não dar para passar naquele dia. E aquilo era coisa que eu nem sabia como era. Já estávamos atrasados cinco dias, e o “mestre” falou que naquele dia não ia dar, e eu nem com raiva fiquei. • No dia seguinte, a ponte ficou pronta, e o herói se despediu da donzela, com muitas promessas de que ia voltar para vê-la. • E, após alguns atoleiros, o grupo chega a São Domingos do Prata. • O protagonista se conforma com a ideia de que não conseguiu cumprir a missão, que seu ato de heroísmo era impossível. E assume sua condição humana, o real está ali: E íamos devagar e já estávamos atrasados seis dias. E não havia outro meio de ir. E não senti mais raiva disso. E sabia que se fosse possível, iríamos chegar em Belo Horizonte com as oito carretas. E isso me pareceu que bastava. • A entrada triunfal da comitiva na avenida Antônio Carlos, em Belo Horizonte, mais de nove horas da noite, é uma espécie de exaltação do herói, que não cumpriu um desígnio superior e impossível, mas que, assumindo sua condição humana, consegue terminar vivo sua grande luta. • O não cumprimento da missão faz as coisas transformarem-se em seu retorno. • O chuveiro estava estragado. A cama onde ele sempre dormia tinha sido interditada verbalmente pelo senhor Mário. • Transgredindo a ordem, ele dorme nela assim mesmo. A chave da Kombi, o vigia a entrega a ele dizendo que não podia entregar, por ordem do senhor Mário. • Até o contador, criatura insignificante, havia-se magnificado para cobrar dele notas e acerto de contas. • Aí começa a se efetivar a libertação do herói, que já se havia delineado nas pequenas transgressões anteriores, da cama, do chuveiro e da Kombi. • Ele agride o contador, e o joga contra a porta da sala do senhor Mário, que estava vazia, e aquele pedaço de merda quebra a porta de entrada do espaço da dominação. • O pedaço de merda é o homem que toma conta do patrimônio do patrão. • O supremo gesto de libertação é a conquista da rainha. • Jorge se dirige à casa do senhor Mário, para esclarecer tudo definitivamente. • O patrão não se encontra lá; apenas sua mulher, dona Helena. • A confirmar a ruptura ocorre a sedução da consorte do dominador: O cabelo dela brilhava ali perto do meu rosto, naquela sombra da sala, e eu olhei e vi sua boca, e era uma boca que parecia que tinha bebido água. E tornei a apertá-la, e enfiei minha língua lá dentro de sua boca, e digo que nunca beijei uma mulher como aquela. • O ato final do herói foi sair dali, dirigir-se à garagem dos concreteiros, pegar suas coisas, colocar dentro de suas duas bolsas, e abandonar o local. • Definitivamente? • Uma das características da narrativa oral é a possibilidade de se fazer a pergunta: o que aconteceu depois? • Pode-se imaginar então que há um Jorge em um ponto qualquer a recontar sua história, ou a inventar alguma, ou a reproduzir outra que ouviu de alguém.

  37. Jorge um brasileiroOswaldo França Júnior • Mais paradas para consertar um radiador e um semieixo. E o herói começa a esmorecer diante dos perigos da jornada: Saí fazendo as contas na cabeça de quanto a gente ainda poderia demorar. E havia trechos em que não estávamos indo nem a dois, três quilômetros por hora. Era aquela vagareza, passando devagar nas curvas, devagar nas subidas, nas descidas. E parando. E vendo se as rodas iam atolar naquela lama que aparecia na frente. E medindo o tamanho do buraco que a água estava encobrindo. (...) E ficando com aquele medo nas horas em que sentíamos os pneus derrapando. • O inimigo é associado às trevas, ao inverno, à confusão, à desordem; o inimigo é a chuva, que deforma o mundo e barra os movimentos do herói. • Mas ele vai em frente, até chegar a Dionísio, onde uma ponte danificada segurou irremediavelmente o grupo, enquanto os homens da prefeitura tentavam consertá-la. • No momento em que a missão está definitivamente comprometida, ocorre o idílio, o divertimento do herói com a donzela que ele encontra no bar de beira de estrada, que se oferece a ele. • A sedução da moça faz o herói esquecer seu fracasso, prendendo-o ao local de obstáculo intransponível. • E o herói esqueceu que havia uma ponte que devia ser consertada para seu grupo passar. O prazo já estava vencido: No dia seguinte, quando olhei a ponte e vi que não ia dar para ficar pronta, e o “mestre” me perguntou qual era mesmo o peso que a gente levava, eu disse, e falei que ali nunca tinha passado carro com um peso daqueles. E não liguei de não dar para passar naquele dia. E aquilo era coisa que eu nem sabia como era. Já estávamos atrasados cinco dias, e o “mestre” falou que naquele dia não ia dar, e eu nem com raiva fiquei. • No dia seguinte, a ponte ficou pronta, e o herói se despediu da donzela, com muitas promessas de que ia voltar para vê-la. • E, após alguns atoleiros, o grupo chega a São Domingos do Prata. • O protagonista se conforma com a ideia de que não conseguiu cumprir a missão, que seu ato de heroísmo era impossível. E assume sua condição humana, o real está ali: E íamos devagar e já estávamos atrasados seis dias. E não havia outro meio de ir. E não senti mais raiva disso. E sabia que se fosse possível, iríamos chegar em Belo Horizonte com as oito carretas. E isso me pareceu que bastava. • A entrada triunfal da comitiva na avenida Antônio Carlos, em Belo Horizonte, mais de nove horas da noite, é uma espécie de exaltação do herói, que não cumpriu um desígnio superior e impossível, mas que, assumindo sua condição humana, consegue terminar vivo sua grande luta. • O não cumprimento da missão faz as coisas transformarem-se em seu retorno. • O chuveiro estava estragado. A cama onde ele sempre dormia tinha sido interditada verbalmente pelo senhor Mário. • Transgredindo a ordem, ele dorme nela assim mesmo. A chave da Kombi, o vigia a entrega a ele dizendo que não podia entregar, por ordem do senhor Mário. • Até o contador, criatura insignificante, havia-se magnificado para cobrar dele notas e acerto de contas. • Aí começa a se efetivar a libertação do herói, que já se havia delineado nas pequenas transgressões anteriores, da cama, do chuveiro e da Kombi. • Ele agride o contador, e o joga contra a porta da sala do senhor Mário, que estava vazia, e aquele pedaço de merda quebra a porta de entrada do espaço da dominação. • O pedaço de merda é o homem que toma conta do patrimônio do patrão. • O supremo gesto de libertação é a conquista da rainha. • Jorge se dirige à casa do senhor Mário, para esclarecer tudo definitivamente. • O patrão não se encontra lá; apenas sua mulher, dona Helena. • A confirmar a ruptura ocorre a sedução da consorte do dominador: O cabelo dela brilhava ali perto do meu rosto, naquela sombra da sala, e eu olhei e vi sua boca, e era uma boca que parecia que tinha bebido água. E tornei a apertá-la, e enfiei minha língua lá dentro de sua boca, e digo que nunca beijei uma mulher como aquela. • O ato final do herói foi sair dali, dirigir-se à garagem dos concreteiros, pegar suas coisas, colocar dentro de suas duas bolsas, e abandonar o local. • Definitivamente? • Uma das características da narrativa oral é a possibilidade de se fazer a pergunta: o que aconteceu depois? • Pode-se imaginar então que há um Jorge em um ponto qualquer a recontar sua história, ou a inventar alguma, ou a reproduzir outra que ouviu de alguém.

  38. Jorge um brasileiroOswaldo França Júnior • O inimigo é associado às trevas, ao inverno, à confusão, à desordem; o inimigo é a chuva, que deforma o mundo e barra os movimentos do herói. • Mas ele vai em frente, até chegar a Dionísio, onde uma ponte danificada segurou irremediavelmente o grupo, enquanto os homens da prefeitura tentavam consertá-la. • No momento em que a missão está definitivamente comprometida, ocorre o idílio, o divertimento do herói com a donzela que ele encontra no bar de beira de estrada, que se oferece a ele. • A sedução da moça faz o herói esquecer seu fracasso, prendendo-o ao local de obstáculo intransponível. • E o herói esqueceu que havia uma ponte que devia ser consertada para seu grupo passar. O prazo já estava vencido: No dia seguinte, quando olhei a ponte e vi que não ia dar para ficar pronta, e o “mestre” me perguntou qual era mesmo o peso que a gente levava, eu disse, e falei que ali nunca tinha passado carro com um peso daqueles. E não liguei de não dar para passar naquele dia. E aquilo era coisa que eu nem sabia como era. Já estávamos atrasados cinco dias, e o “mestre” falou que naquele dia não ia dar, e eu nem com raiva fiquei. • No dia seguinte, a ponte ficou pronta, e o herói se despediu da donzela, com muitas promessas de que ia voltar para vê-la. • E, após alguns atoleiros, o grupo chega a São Domingos do Prata. • O protagonista se conforma com a ideia de que não conseguiu cumprir a missão, que seu ato de heroísmo era impossível. E assume sua condição humana, o real está ali: E íamos devagar e já estávamos atrasados seis dias. E não havia outro meio de ir. E não senti mais raiva disso. E sabia que se fosse possível, iríamos chegar em Belo Horizonte com as oito carretas. E isso me pareceu que bastava. • A entrada triunfal da comitiva na avenida Antônio Carlos, em Belo Horizonte, mais de nove horas da noite, é uma espécie de exaltação do herói, que não cumpriu um desígnio superior e impossível, mas que, assumindo sua condição humana, consegue terminar vivo sua grande luta. • O não cumprimento da missão faz as coisas transformarem-se em seu retorno. • O chuveiro estava estragado. A cama onde ele sempre dormia tinha sido interditada verbalmente pelo senhor Mário. • Transgredindo a ordem, ele dorme nela assim mesmo. A chave da Kombi, o vigia a entrega a ele dizendo que não podia entregar, por ordem do senhor Mário. • Até o contador, criatura insignificante, havia-se magnificado para cobrar dele notas e acerto de contas. • Aí começa a se efetivar a libertação do herói, que já se havia delineado nas pequenas transgressões anteriores, da cama, do chuveiro e da Kombi. • Ele agride o contador, e o joga contra a porta da sala do senhor Mário, que estava vazia, e aquele pedaço de merda quebra a porta de entrada do espaço da dominação. • O pedaço de merda é o homem que toma conta do patrimônio do patrão. • O supremo gesto de libertação é a conquista da rainha. • Jorge se dirige à casa do senhor Mário, para esclarecer tudo definitivamente. • O patrão não se encontra lá; apenas sua mulher, dona Helena. • A confirmar a ruptura ocorre a sedução da consorte do dominador: O cabelo dela brilhava ali perto do meu rosto, naquela sombra da sala, e eu olhei e vi sua boca, e era uma boca que parecia que tinha bebido água. E tornei a apertá-la, e enfiei minha língua lá dentro de sua boca, e digo que nunca beijei uma mulher como aquela. • O ato final do herói foi sair dali, dirigir-se à garagem dos concreteiros, pegar suas coisas, colocar dentro de suas duas bolsas, e abandonar o local. • Definitivamente? • Uma das características da narrativa oral é a possibilidade de se fazer a pergunta: o que aconteceu depois? • Pode-se imaginar então que há um Jorge em um ponto qualquer a recontar sua história, ou a inventar alguma, ou a reproduzir outra que ouviu de alguém.

  39. Jorge um brasileiroOswaldo França Júnior • A sedução da moça faz o herói esquecer seu fracasso, prendendo-o ao local de obstáculo intransponível. • E o herói esqueceu que havia uma ponte que devia ser consertada para seu grupo passar. O prazo já estava vencido: No dia seguinte, quando olhei a ponte e vi que não ia dar para ficar pronta, e o “mestre” me perguntou qual era mesmo o peso que a gente levava, eu disse, e falei que ali nunca tinha passado carro com um peso daqueles. E não liguei de não dar para passar naquele dia. E aquilo era coisa que eu nem sabia como era. Já estávamos atrasados cinco dias, e o “mestre” falou que naquele dia não ia dar, e eu nem com raiva fiquei. • No dia seguinte, a ponte ficou pronta, e o herói se despediu da donzela, com muitas promessas de que ia voltar para vê-la. • E, após alguns atoleiros, o grupo chega a São Domingos do Prata. • O protagonista se conforma com a ideia de que não conseguiu cumprir a missão, que seu ato de heroísmo era impossível. E assume sua condição humana, o real está ali: E íamos devagar e já estávamos atrasados seis dias. E não havia outro meio de ir. E não senti mais raiva disso. E sabia que se fosse possível, iríamos chegar em Belo Horizonte com as oito carretas. E isso me pareceu que bastava. • A entrada triunfal da comitiva na avenida Antônio Carlos, em Belo Horizonte, mais de nove horas da noite, é uma espécie de exaltação do herói, que não cumpriu um desígnio superior e impossível, mas que, assumindo sua condição humana, consegue terminar vivo sua grande luta. • O não cumprimento da missão faz as coisas transformarem-se em seu retorno. • O chuveiro estava estragado. A cama onde ele sempre dormia tinha sido interditada verbalmente pelo senhor Mário. • Transgredindo a ordem, ele dorme nela assim mesmo. A chave da Kombi, o vigia a entrega a ele dizendo que não podia entregar, por ordem do senhor Mário. • Até o contador, criatura insignificante, havia-se magnificado para cobrar dele notas e acerto de contas. • Aí começa a se efetivar a libertação do herói, que já se havia delineado nas pequenas transgressões anteriores, da cama, do chuveiro e da Kombi. • Ele agride o contador, e o joga contra a porta da sala do senhor Mário, que estava vazia, e aquele pedaço de merda quebra a porta de entrada do espaço da dominação. • O pedaço de merda é o homem que toma conta do patrimônio do patrão. • O supremo gesto de libertação é a conquista da rainha. • Jorge se dirige à casa do senhor Mário, para esclarecer tudo definitivamente. • O patrão não se encontra lá; apenas sua mulher, dona Helena. • A confirmar a ruptura ocorre a sedução da consorte do dominador: O cabelo dela brilhava ali perto do meu rosto, naquela sombra da sala, e eu olhei e vi sua boca, e era uma boca que parecia que tinha bebido água. E tornei a apertá-la, e enfiei minha língua lá dentro de sua boca, e digo que nunca beijei uma mulher como aquela. • O ato final do herói foi sair dali, dirigir-se à garagem dos concreteiros, pegar suas coisas, colocar dentro de suas duas bolsas, e abandonar o local. • Definitivamente? • Uma das características da narrativa oral é a possibilidade de se fazer a pergunta: o que aconteceu depois? • Pode-se imaginar então que há um Jorge em um ponto qualquer a recontar sua história, ou a inventar alguma, ou a reproduzir outra que ouviu de alguém.

  40. Jorge um brasileiroOswaldo França Júnior No dia seguinte, quando olhei a ponte e vi que não ia dar para ficar pronta, e o “mestre” me perguntou qual era mesmo o peso que a gente levava, eu disse, e falei que ali nunca tinha passado carro com um peso daqueles. E não liguei de não dar para passar naquele dia. E aquilo era coisa que eu nem sabia como era. Já estávamos atrasados cinco dias, e o “mestre” falou que naquele dia não ia dar, e eu nem com raiva fiquei. • No dia seguinte, a ponte ficou pronta, e o herói se despediu da donzela, com muitas promessas de que ia voltar para vê-la. • E, após alguns atoleiros, o grupo chega a São Domingos do Prata. • O protagonista se conforma com a ideia de que não conseguiu cumprir a missão, que seu ato de heroísmo era impossível. E assume sua condição humana, o real está ali: E íamos devagar e já estávamos atrasados seis dias. E não havia outro meio de ir. E não senti mais raiva disso. E sabia que se fosse possível, iríamos chegar em Belo Horizonte com as oito carretas. E isso me pareceu que bastava. • A entrada triunfal da comitiva na avenida Antônio Carlos, em Belo Horizonte, mais de nove horas da noite, é uma espécie de exaltação do herói, que não cumpriu um desígnio superior e impossível, mas que, assumindo sua condição humana, consegue terminar vivo sua grande luta. • O não cumprimento da missão faz as coisas transformarem-se em seu retorno. • O chuveiro estava estragado. A cama onde ele sempre dormia tinha sido interditada verbalmente pelo senhor Mário. • Transgredindo a ordem, ele dorme nela assim mesmo. A chave da Kombi, o vigia a entrega a ele dizendo que não podia entregar, por ordem do senhor Mário. • Até o contador, criatura insignificante, havia-se magnificado para cobrar dele notas e acerto de contas. • Aí começa a se efetivar a libertação do herói, que já se havia delineado nas pequenas transgressões anteriores, da cama, do chuveiro e da Kombi. • Ele agride o contador, e o joga contra a porta da sala do senhor Mário, que estava vazia, e aquele pedaço de merda quebra a porta de entrada do espaço da dominação. • O pedaço de merda é o homem que toma conta do patrimônio do patrão. • O supremo gesto de libertação é a conquista da rainha. • Jorge se dirige à casa do senhor Mário, para esclarecer tudo definitivamente. • O patrão não se encontra lá; apenas sua mulher, dona Helena. • A confirmar a ruptura ocorre a sedução da consorte do dominador: O cabelo dela brilhava ali perto do meu rosto, naquela sombra da sala, e eu olhei e vi sua boca, e era uma boca que parecia que tinha bebido água. E tornei a apertá-la, e enfiei minha língua lá dentro de sua boca, e digo que nunca beijei uma mulher como aquela. • O ato final do herói foi sair dali, dirigir-se à garagem dos concreteiros, pegar suas coisas, colocar dentro de suas duas bolsas, e abandonar o local. • Definitivamente? • Uma das características da narrativa oral é a possibilidade de se fazer a pergunta: o que aconteceu depois? • Pode-se imaginar então que há um Jorge em um ponto qualquer a recontar sua história, ou a inventar alguma, ou a reproduzir outra que ouviu de alguém.

  41. Jorge um brasileiroOswaldo França Júnior • E, após alguns atoleiros, o grupo chega a São Domingos do Prata. • O protagonista se conforma com a ideia de que não conseguiu cumprir a missão, que seu ato de heroísmo era impossível. E assume sua condição humana, o real está ali: E íamos devagar e já estávamos atrasados seis dias. E não havia outro meio de ir. E não senti mais raiva disso. E sabia que se fosse possível, iríamos chegar em Belo Horizonte com as oito carretas. E isso me pareceu que bastava. • A entrada triunfal da comitiva na avenida Antônio Carlos, em Belo Horizonte, mais de nove horas da noite, é uma espécie de exaltação do herói, que não cumpriu um desígnio superior e impossível, mas que, assumindo sua condição humana, consegue terminar vivo sua grande luta. • O não cumprimento da missão faz as coisas transformarem-se em seu retorno. • O chuveiro estava estragado. A cama onde ele sempre dormia tinha sido interditada verbalmente pelo senhor Mário. • Transgredindo a ordem, ele dorme nela assim mesmo. A chave da Kombi, o vigia a entrega a ele dizendo que não podia entregar, por ordem do senhor Mário. • Até o contador, criatura insignificante, havia-se magnificado para cobrar dele notas e acerto de contas. • Aí começa a se efetivar a libertação do herói, que já se havia delineado nas pequenas transgressões anteriores, da cama, do chuveiro e da Kombi. • Ele agride o contador, e o joga contra a porta da sala do senhor Mário, que estava vazia, e aquele pedaço de merda quebra a porta de entrada do espaço da dominação. • O pedaço de merda é o homem que toma conta do patrimônio do patrão. • O supremo gesto de libertação é a conquista da rainha. • Jorge se dirige à casa do senhor Mário, para esclarecer tudo definitivamente. • O patrão não se encontra lá; apenas sua mulher, dona Helena. • A confirmar a ruptura ocorre a sedução da consorte do dominador: O cabelo dela brilhava ali perto do meu rosto, naquela sombra da sala, e eu olhei e vi sua boca, e era uma boca que parecia que tinha bebido água. E tornei a apertá-la, e enfiei minha língua lá dentro de sua boca, e digo que nunca beijei uma mulher como aquela. • O ato final do herói foi sair dali, dirigir-se à garagem dos concreteiros, pegar suas coisas, colocar dentro de suas duas bolsas, e abandonar o local. • Definitivamente? • Uma das características da narrativa oral é a possibilidade de se fazer a pergunta: o que aconteceu depois? • Pode-se imaginar então que há um Jorge em um ponto qualquer a recontar sua história, ou a inventar alguma, ou a reproduzir outra que ouviu de alguém.

  42. Jorge um brasileiroOswaldo França Júnior • A entrada triunfal da comitiva na avenida Antônio Carlos, em Belo Horizonte, mais de nove horas da noite, é uma espécie de exaltação do herói, que não cumpriu um desígnio superior e impossível, mas que, assumindo sua condição humana, consegue terminar vivo sua grande luta. • O não cumprimento da missão faz as coisas transformarem-se em seu retorno. • O chuveiro estava estragado. A cama onde ele sempre dormia tinha sido interditada verbalmente pelo senhor Mário. • Transgredindo a ordem, ele dorme nela assim mesmo. A chave da Kombi, o vigia a entrega a ele dizendo que não podia entregar, por ordem do senhor Mário. • Até o contador, criatura insignificante, havia-se magnificado para cobrar dele notas e acerto de contas. • Aí começa a se efetivar a libertação do herói, que já se havia delineado nas pequenas transgressões anteriores, da cama, do chuveiro e da Kombi. • Ele agride o contador, e o joga contra a porta da sala do senhor Mário, que estava vazia, e aquele pedaço de merda quebra a porta de entrada do espaço da dominação. • O pedaço de merda é o homem que toma conta do patrimônio do patrão. • O supremo gesto de libertação é a conquista da rainha. • Jorge se dirige à casa do senhor Mário, para esclarecer tudo definitivamente. • O patrão não se encontra lá; apenas sua mulher, dona Helena. • A confirmar a ruptura ocorre a sedução da consorte do dominador: O cabelo dela brilhava ali perto do meu rosto, naquela sombra da sala, e eu olhei e vi sua boca, e era uma boca que parecia que tinha bebido água. E tornei a apertá-la, e enfiei minha língua lá dentro de sua boca, e digo que nunca beijei uma mulher como aquela. • O ato final do herói foi sair dali, dirigir-se à garagem dos concreteiros, pegar suas coisas, colocar dentro de suas duas bolsas, e abandonar o local. • Definitivamente? • Uma das características da narrativa oral é a possibilidade de se fazer a pergunta: o que aconteceu depois? • Pode-se imaginar então que há um Jorge em um ponto qualquer a recontar sua história, ou a inventar alguma, ou a reproduzir outra que ouviu de alguém.

  43. Jorge um brasileiroOswaldo França Júnior • O chuveiro estava estragado. A cama onde ele sempre dormia tinha sido interditada verbalmente pelo senhor Mário. • Transgredindo a ordem, ele dorme nela assim mesmo. A chave da Kombi, o vigia a entrega a ele dizendo que não podia entregar, por ordem do senhor Mário. • Até o contador, criatura insignificante, havia-se magnificado para cobrar dele notas e acerto de contas. • Aí começa a se efetivar a libertação do herói, que já se havia delineado nas pequenas transgressões anteriores, da cama, do chuveiro e da Kombi. • Ele agride o contador, e o joga contra a porta da sala do senhor Mário, que estava vazia, e aquele pedaço de merda quebra a porta de entrada do espaço da dominação. • O pedaço de merda é o homem que toma conta do patrimônio do patrão. • O supremo gesto de libertação é a conquista da rainha. • Jorge se dirige à casa do senhor Mário, para esclarecer tudo definitivamente. • O patrão não se encontra lá; apenas sua mulher, dona Helena. • A confirmar a ruptura ocorre a sedução da consorte do dominador: O cabelo dela brilhava ali perto do meu rosto, naquela sombra da sala, e eu olhei e vi sua boca, e era uma boca que parecia que tinha bebido água. E tornei a apertá-la, e enfiei minha língua lá dentro de sua boca, e digo que nunca beijei uma mulher como aquela. • O ato final do herói foi sair dali, dirigir-se à garagem dos concreteiros, pegar suas coisas, colocar dentro de suas duas bolsas, e abandonar o local. • Definitivamente? • Uma das características da narrativa oral é a possibilidade de se fazer a pergunta: o que aconteceu depois? • Pode-se imaginar então que há um Jorge em um ponto qualquer a recontar sua história, ou a inventar alguma, ou a reproduzir outra que ouviu de alguém.

  44. Jorge um brasileiroOswaldo França Júnior • Aí começa a se efetivar a libertação do herói, que já se havia delineado nas pequenas transgressões anteriores, da cama, do chuveiro e da Kombi. • Ele agride o contador, e o joga contra a porta da sala do senhor Mário, que estava vazia, e aquele pedaço de merda quebra a porta de entrada do espaço da dominação. • O pedaço de merda é o homem que toma conta do patrimônio do patrão. • O supremo gesto de libertação é a conquista da rainha. • Jorge se dirige à casa do senhor Mário, para esclarecer tudo definitivamente. • O patrão não se encontra lá; apenas sua mulher, dona Helena. • A confirmar a ruptura ocorre a sedução da consorte do dominador: O cabelo dela brilhava ali perto do meu rosto, naquela sombra da sala, e eu olhei e vi sua boca, e era uma boca que parecia que tinha bebido água. E tornei a apertá-la, e enfiei minha língua lá dentro de sua boca, e digo que nunca beijei uma mulher como aquela. • O ato final do herói foi sair dali, dirigir-se à garagem dos concreteiros, pegar suas coisas, colocar dentro de suas duas bolsas, e abandonar o local. • Definitivamente? • Uma das características da narrativa oral é a possibilidade de se fazer a pergunta: o que aconteceu depois? • Pode-se imaginar então que há um Jorge em um ponto qualquer a recontar sua história, ou a inventar alguma, ou a reproduzir outra que ouviu de alguém.

  45. Jorge um brasileiroOswaldo França Júnior • Jorge se dirige à casa do senhor Mário, para esclarecer tudo definitivamente. • O patrão não se encontra lá; apenas sua mulher, dona Helena. • A confirmar a ruptura ocorre a sedução da consorte do dominador: O cabelo dela brilhava ali perto do meu rosto, naquela sombra da sala, e eu olhei e vi sua boca, e era uma boca que parecia que tinha bebido água. E tornei a apertá-la, e enfiei minha língua lá dentro de sua boca, e digo que nunca beijei uma mulher como aquela. • O ato final do herói foi sair dali, dirigir-se à garagem dos concreteiros, pegar suas coisas, colocar dentro de suas duas bolsas, e abandonar o local. • Definitivamente? • Uma das características da narrativa oral é a possibilidade de se fazer a pergunta: o que aconteceu depois? • Pode-se imaginar então que há um Jorge em um ponto qualquer a recontar sua história, ou a inventar alguma, ou a reproduzir outra que ouviu de alguém.

  46. Jorge um brasileiroOswaldo França Júnior O cabelo dela brilhava ali perto do meu rosto, naquela sombra da sala, e eu olhei e vi sua boca, e era uma boca que parecia que tinha bebido água. E tornei a apertá-la, e enfiei minha língua lá dentro de sua boca, e digo que nunca beijei uma mulher como aquela. • O ato final do herói foi sair dali, dirigir-se à garagem dos concreteiros, pegar suas coisas, colocar dentro de suas duas bolsas, e abandonar o local. • Definitivamente?

  47. Jorge um brasileiroOswaldo França Júnior • Uma das características da narrativa oral é a possibilidade de se fazer a pergunta: o que aconteceu depois? • Pode-se imaginar então que há um Jorge em um ponto qualquer a recontar sua história, ou a inventar alguma, ou a reproduzir outra que ouviu de alguém.

  48. Jorge um brasileiroOswaldo França Júnior • Foco narrativo • Narrado em 1ª pessoa. • O narrador se dirige ao leitor, como ouvinte.

  49. Jorge um brasileiroOswaldo França Júnior • Espaço • Principal: Belo Horizonte, pois a personagem sai de BH com destino a Caratinga e retorna a BH. • Secundária: Todos os lugares por onde Jorge conta já ter passado. Lugares presentes nas histórias secundárias.

  50. Jorge um brasileiroOswaldo França Júnior • Tempo • A narrativa se desenvolve no período de aproximadamente 15 dias. • O tempo, contudo, que o autor enfatiza, retrata a década de 1960, período de inauguração de Brasília; bem como o Golpe Militar, de 1964, e o AI-5, de 1968. • O tempo retratado pelo autor aparece na obra através de algumas metáforas, de algumas situações que Jorge vivencia.

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